O parlamento espanhol decidiu em 10 de março de 2022 criar uma comissão presidida pelo provedor de Justiça, Ángel Gabilondo, para investigar, pela primeira vez de forma oficial, os abusos a menores no seio da Igreja Católica.
Ángel Gabilongo apresentou hoje, presencialmente, aos deputados e senadores o relatório do trabalho dessa comissão, um documento que já tinha entregado em outubro e já era conhecido.
No entanto, o provedor atualizou hoje os números de testemunhos de vítimas e alegadas vítimas recolhidos pela comissão, que mantém abertos os canais de comunicação para quem quiser relatar e denunciar casos.
Assim, até agora, a Provedoria recolheu 674 testemunhos de alegadas vítimas ou de pessoas próximas de alegadas vítimas de abusos sexuais cometidos "no âmbito da Igreja Católica" em Espanha.
A comissão considerou válidos pelo menos 516 desses testemunhos.
As alegadas vítimas são 563 homens e 110 mulheres.
O relatório da Provedoria de Justiça inclui também o resultado de uma sondagem que estima que 1,3% da população adulta de Espanha foi vítima deste tipo de crimes, o que equivale a cerca de 445 mil pessoas.
Segundo a mesma estimativa, 0,6% dos abusos (envolvendo perto de 236.500 vítimas) foram cometidos por sacerdotes ou outros membros da Igreja Católica.
"Agora é a hora do Parlamento, como consequência da encomenda [à Provedoria] e deste relatório. É o momento do [poder] legislativo e do executivo. As vítimas esperam que se adotem, o mais depressa possível e da melhor forma, as recomendações e sugestões aqui formuladas", disse hoje Ángel Gabilongo, aos deputados e senadores, a quem pediu "medidas concretas".
Entre as 24 recomendações e sugestões do relatório do Provedor de Justiça está a criação de mecanismos para ressarcir as vítimas dos abusos sexuais na Igreja Católica, a organização de um evento público de reconhecimento dos abusos e mudanças legislativas para prevenir este tipo de crimes.
Na sequência deste relatório, o Governo espanhol aprovou em abril deste ano um plano para ressarcir as vítimas de abusos sexuais na Igreja Católica e disse ter iniciado negociações com os bispos para ser a instituição a assumir os custos das indemnizações.
O objetivo do Governo espanhol é atender a casos de abusos sexuais que não tiveram resposta judicial, por serem antigos e já terem prescrito ou por dificuldade de obtenção de provas, explicou na altura o ministro da Presidência, Félix Bolaños.
"Parece-me que a Igreja Católica tem vontade de trabalhar", assegurou o ministro.
A Igreja rejeitou e criticou os números do relatório do Provedor de Justiça, que considerou meras extrapolações, e tem dito que recusa contribuir para um fundo de indemnizações exclusivamente destinado a alegadas vítimas de abusos no seio das instituições católicas.
"A Igreja não pode aceitar um plano de discriminação da maioria das vítimas de violências sexuais", reafirmou a Conferência Episcopal, num comunicado.
A Conferência Episcopal Espanhola reconheceu até agora 1.057 casos e abusos sexuais, embora só considere como provados ou credíveis 358.
A Igreja Católica assegurou estar a trabalhar num programa de "reparação integral" das vítimas, sem dar pormenores.
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