O cessar-fogo em Gaza e a libertação dos reféns deverá entrar em vigor no domingo, um dia depois de ter sido aprovado por Israel e de 15 meses de uma guerra devastadora que provocou dezenas de milhares de mortos.
Entretanto, soaram sirenes de alerta em Jerusalém, onde foram ouvidas explosões, e no centro de Israel, depois de um projétil ter sido disparado, segundo o Exército israelita, a partir do Iémen, onde os rebeldes Houthi dizem estar a lançar ataques contra o território israelita "em solidariedade" com os palestinianos.
O cessar-fogo na Faixa de Gaza terá início no domingo às 08:30 hora locais (6h30 em Lisboa), anunciou o Qatar, um dos mediadores internacionais, juntamente com o Egito e os Estados Unidos, que conseguiu obter este acordo após mais de um ano de laboriosas negociações.
Como vai decorrer o acordo?
A primeira fase, repartida por seis semanas, prevê a cessação das hostilidades e a libertação de 33 reféns detidos em Gaza em troca de 737 prisioneiros palestinianos detidos por Israel.
Anunciado na quarta-feira pelos mediadores, o acordo visa, segundo o primeiro-ministro do Qatar, Mohammed ben Abdelrahmane Al-Thani, conduzir a prazo a "um fim definitivo da guerra", desencadeada por um ataque sem precedentes do Hamas palestiniano contra Israel em 7 de outubro de 2023, durante o qual os reféns foram raptados.
Mas enquanto se aguarda o início da trégua, na véspera da tomada de posse, na segunda-feira, do Presidente eleito americano, Donald Trump, o Exército israelita prosseguiu os ataques na Faixa de Gaza, que mataram mais de 100 pessoas desde quarta-feira, segundo os serviços de emergência.
O Governo israelita aprovou o acordo hoje antes do amanhecer, depois de o Hamas, considerado uma organização terrorista por Israel, pelos Estados Unidos e pela União Europeia, ter feito o mesmo.
Os reféns serão libertados no domingo, anunciou o Governo israelita, sem especificar o seu número. Três pontos de receção foram instalados na fronteira sul de Israel com Gaza, de onde os prisioneiros, assistidos por médicos, serão levados para hospitais, informou um responsável militar.
Quem vai ser libertado?
Segundo duas fontes próximas do Hamas, o primeiro grupo de reféns a ser libertado deverá incluir três mulheres israelitas.
As autoridades israelitas designaram no domingo 95 detidos palestinianos para serem libertados, na maioria mulheres e menores, a maior parte dos quais foram detidos depois de 7 de outubro. O Ministério da Justiça especificou que os detidos não serão libertados antes das 14 horas TMG de domingo.
Entre os presos que deverão ser libertados encontra-se Zakaria al-Zoubeidi, responsável por atentados anti-israelitas e antigo dirigente local das Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa, o braço armado do partido Fatah do Presidente Mahmoud Abbas.
Dois franco-israelitas, Ofer Kalderon, 54 anos, e Ohad Yahalomi, 50 anos, estão entre os 33 reféns a serem libertados durante a primeira fase, de acordo com Paris. Foram raptados do Kibbutz Nir Oz com vários dos seus filhos, que foram libertados durante uma trégua inicial de uma semana em novembro de 2023.
"Este é o momento pelo qual temos estado à espera. Espero realmente que vejamos o meu avô regressar a casa, vivo e de boa saúde", disse Daniel Lifshitz, neto de Oded Lifshitz, de 84 anos, que foi raptado de Nir Oz.
E reféns com ligações a Portugal?
Ao todo, 33 pessoas serão libertadas nesta primeira fase. Segundo uma lista divulgada, na primeira fase deverão ser libertados Or Levy, Ofer Calderon e Tsahi Idan, israelitas com ligações ao nosso país.
Offer Calderon, de 52 anos, tinha requerido a nacionalidade portuguesa em 2021, ao abrigo da lei dos sefarditas. Após o seu rapto, a 7 de outubro, foi pedido ao Governo urgência na atribuição de nacionalidade portuguesa ao israelita, para que pudesse beneficiar da dupla nacionalidade para que fosse libertado. A certidão de nascimento do agora luso-israelita, de 52 anos, foi emitida pela Conservatória dos Registos Centrais (CRC), em 2023.
Segundo a publicação The Times of Israel, a numeração da lista não indica a ordem pela qual os reféns serão libertados, salientando-se o facto de que não se saber em que condições de saúde estão (ainda que Israel acredite que a maior parte estará com vida).
Na Faixa de Gaza, devastada pelos bombardeamentos aéreos e pela ofensiva terrestre israelitas em retaliação ao ataque de 7 de outubro, os deslocados - a grande maioria dos cerca de 2,4 milhões de palestinianos - preparam-se para regressar a casa.
De acordo com a ONU, a guerra causou um nível de destruição no território palestiniano sitiado por Israel desde outubro de 2023 que "não tem precedentes na história recente".
A guerra causou a morte de 1.210 pessoas do lado israelita, a maioria civis, de acordo com uma contagem da AFP baseada em dados oficiais. Das 251 pessoas raptadas em 07 de outubro de 2023, 94 continuam reféns em Gaza, 34 das quais mortas, segundo o Exército.
Pelo menos 46.876 pessoas, na maioria civis, foram mortas na ofensiva israelita em Gaza, já debilitada por um bloqueio israelita imposto desde 2007, pela pobreza e pelo desemprego, segundo dados do ministério da Saúde do Hamas considerados fiáveis pela ONU.
Além da libertação dos reféns, a primeira fase do acordo inclui, segundo o Presidente norte-americano, Joe Biden, "um cessar-fogo total", uma retirada israelita das zonas densamente povoadas de Gaza e um aumento da ajuda humanitária.
Durante a primeira fase, serão negociados os termos da segunda fase, que deverá conduzir à libertação dos últimos reféns, antes da terceira e última fase dedicada à reconstrução de Gaza e ao regresso dos corpos dos reféns que morreram em cativeiro.
O cessar-fogo deixa em aberto o futuro político de Gaza, onde o Hamas assumiu o poder em 2007.
A Autoridade Palestiniana, rival do movimento islamita, está pronta a "assumir plenamente as suas responsabilidades" em Gaza, disse o seu presidente Mahmoud Abbas.
Consideravelmente enfraquecido, o Hamas está ainda longe de ser eliminado, contrariamente ao objetivo fixado pelo Primeiro-Ministro Benjamin Netanyahu, segundo especialistas citados pela AFP.
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