A iniciativa da Alternativa para a Alemanha (AfD) no centro de Erfurt, capital da Turíngia, estava marcada para as 16h00 locais (15h00 em Lisboa), mas mais de uma hora antes milhares de manifestantes concentravam-se junto à estação central da cidade, rodeados por um forte dispositivo policial, que procurava evitar confrontos com os apoiantes da extrema-direita.
"Estamos aqui porque queremos mostrar às pessoas em Erfurt e à AfD que somos fortemente contra a extrema-direita e o fascismo e que não deixamos as ruas para eles", disse à Lusa uma porta-voz do movimento que convocou o protesto, Auf Die Plätze Bündnis (Aliança na Praça).
Na véspera das eleições federais antecipadas, os manifestantes querem "apelar às pessoas para que votem em partidos democráticos e solidários".
"Queremos que as pessoas se apercebam de quem não quer trabalhar com a AfD, quem é verdadeiramente o 'cordão sanitário' [contra a extrema-direita]", referiu a jovem.
Os conservadores da CDU, liderados por Friedrich Merz, são os favoritos nas sondagens (cerca de 30% das intenções de voto), mas os manifestantes receiam que este partido faça uma aliança com a AfD, apesar de o candidato a chanceler ter garantido várias vezes que não o fará.
"Perdemos a confiança na CDU", disse, recordando que no início do mês Merz levou ao Bundestag (parlamento alemão) propostas não vinculativas para endurecer a migração, propondo o encerramento das fronteiras e a recusa da entrada de requerentes de asilo, que foram aprovadas pela AfD. O passo foi criticado pelos adversários como uma quebra do 'Brandmauer' ('cordão sanitário').
"Estamos preocupados com a subida da extrema-direita e vamos continuar a lutar por um país democrático, sem fascismo e sem ódio, um país onde todos possamos viver em paz", sublinhou a porta-voz.
Muitos jovens, mas também idosos e famílias com crianças gritavam slogans como "alerta, alerta antifascista", "todos juntos contra o fascismo", "nazis, fora" ou "digam alto, digam claramente, os refugiados são bem-vindos aqui", numa referência às propostas anti-imigração, principal bandeira da AfD.
Os manifestantes percorreram algumas ruas do centro de Erfurt, uma cidade com cerca de 220 mil habitantes, até à Domplatz, onde decorria o comício do líder da AfD na Turíngia.
A polícia montou barreiras metálicas em todo o recinto, separando os dois eventos com uma distância de 65 metros.
"Os dois grupos estão isolados e está a correr tudo bem", disse à Lusa o porta-voz da polícia.
As autoridades estimam que a manifestação tenha reunido cerca de 4.000 pessoas, enquanto os organizadores referiram 5.500. Quanto ao comício da AfD, a polícia contabilizou cerca de 1.100 pessoas.
No recinto do comício, os manifestantes exibiam bandeiras da Alemanha, algumas com a mensagem "Nós somos o povo", e aproveitavam umas bancas de comida para comer as tradicionais salsichas alemãs.
Em Erfurt, Björn Hocke 'joga em casa' -- o líder da AfD da Turíngia conseguiu, em setembro passado, a primeira vitória de um partido de extrema-direita numas eleições regionais no pós-Segunda Guerra Mundial, ao alcançar 32,8%.
A AfD não lidera, no entanto, o governo regional, que foi assumido por uma coligação tripartida entre conservadores (CDU), sociais-democratas (SPD) e a Aliança Sahra Wagenknecht (BSW, populistas de esquerda), impondo um 'cordão sanitário' à extrema-direita.
Quando o líder da AfD subiu ao palco, os manifestantes intensificaram os assobios e vaias, gritando "Björn Höcke é um fascista" - uma decisão judicial de 2019 estipulou que é legal chamar fascista ao chefe da ala mais radical do partido de extrema-direita.
No seu discurso, Höcke dirigiu as críticas contra "os partidos extremistas do cartel", nomeadamente o SPD do chanceler Olaf Scholz (centro-esquerda) e os Verdes, atualmente numa coligação minoritária no poder, que acusou de corrupção e de "destruírem a Segurança Social".
"Os outros políticos só pensam em si, mas os políticos da AfD pensam no povo", afirmou o líder da AfD na Turíngia.
Höcke falou também da imigração, criticando a antiga chanceler Angela Merkel (CDU), que em 2015 permitiu a entrada de mais de um milhão de refugiados sírios.
"Hoje, há mais mortos por causa dos refugiados", declarou, numa alusão a ataques realizados por requerentes de asilo no país, o mais recente ocorreu na semana passada, quando um cidadão afegão dirigiu uma viatura contra uma multidão em Munique (sul), matando duas pessoas e ferindo cerca de 40.
Höcke criticou também a recusa dos restantes partidos de trabalharem com a AfD: "Eles escondem-se atrás do 'cordão sanitário', mas ele não tem qualquer propósito na democracia."
A AfD é considerada próxima do Kremlin e o líder regional do partido não esqueceu a Rússia, condenando as sanções impostas desde a invasão da Ucrânia, há três anos.
A Alemanha realiza no domingo eleições federais, que foram antecipadas em cerca de sete meses, após o colapso do Governo liderado por Scholz, na sequência de falta de acordo sobre o orçamento entre os partidos que formavam a chamada 'coligação-semáforo' -- SPD, Verdes e liberais do FDP.
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