Aos pés da estátua do reformador protestante Martinho Lutero, acumulam-se velas e ramos de flores, sobre uma faixa com uma pomba branca.
Algumas velas foram ali colocadas pelo movimento "Comemorar Dresden", que anualmente promove uma "marcha memorial" para "preservar e proteger a honrosa memória dos mortos".
"Os jovens alemães estão comprometidos em combater o abuso das vítimas do atentado de Dresden por interesses políticos", lê-se no manifesto deste movimento, que considera que "o crime de guerra dos Aliados em Dresden é banalizado e todas as suas vítimas são ridicularizadas e negadas".
Oitenta anos depois, o ataque continua a ser motivo de discórdia na capital da Saxónia (leste da Alemanha).
Entre 13 e 15 de fevereiro de 1945, os bombardeamentos dos Aliados destruíram a cidade e fizeram entre 18 e 25 mil mortos, concluíram historiadores em 2010, após anos de investigação. Os extremistas reclamam números muito superiores, na ordem das centenas de milhares de vítimas.
O prefeito de Dresden, Dirk Hilbert (do partido liberal FDP), declarou, a propósito desta comemoração: "13 de fevereiro é um dia importante no calendário da nossa cidade. Todos os anos paramos e recordamos o que aconteceu e como aconteceu. Isso é importante porque assistimos repetidamente que memórias são distorcidas, lembranças são apropriadas e factos são negados".
O autarca lançou um apelo aos jovens "Fiquem alerta. Questionem criticamente. Envolvam-se. Assumam a responsabilidade. Mas acima de tudo, mantenham viva a memória daqueles que viveram este momento".
Dresden tem uma histórica relação com o extremismo: foi nesta cidade que nasceu o movimento de extrema-direita Pegida, que se opõe à imigração de muçulmanos na Alemanha, extinto recentemente, e é considerada um bastião da extrema-direita.
O aumento dos ataques extremistas levou o município a declarar, em 2019, "emergência nazi", alegando que "as atitudes e ações de extrema-direita são cada vez mais frequentes", enquanto pedia ajuda para as vítimas da violência de extrema-direita, proteção das minorias e reforço da democracia.
Várias organizações trabalham na cidade para combater a extrema-direita, como a Dresden Wiedersetzen, cujo lema é "Dresden livre de nazis", que pretende combater a "glorificação nazi e o revisionismo histórico".
"Opomo-nos ao mito do sacrifício e mostramos claramente que os fascistas não podem tomar as ruas nem os parlamentos", declara a organização.
As comemorações dos 80 anos dos bombardeamentos ocorreram em plena campanha eleitoral para as legislativas do próximo domingo, marcadas pelo debate sobre o endurecimento das leis de imigração e pela subida da extrema-direita - o partido Alternativa para a Alemanha (AfD) está em segundo lugar nas sondagens, com cerca de 20% das intenções de voto.
Na Saxónia, a AfD obteve, nas eleições regionais de setembro passado, 30,6% dos votos, mesmo atrás dos vencedores, os conservadores da CDU (31,9%). O Gabinete de Proteção da Constituição classifica a AfD deste estado como "extremista de direita".
A RAA Saxónia, outra organização de apoio a vítimas de violência motivada pela direita, racista e antissemita, alerta que a retórica anti-imigração que dominou esta campanha "cria um clima de violência contra todos aqueles que são vistos como migrantes", relatando um aumento de ataques racistas em Dresden nas últimas semanas.
A Alemanha realiza no domingo eleições legislativas antecipadas - estavam previstas para 28 de setembro -, na sequência da queda da coligação governamental liderada por Olaf Scholz e composta pelo SPD (social-democrata), pelos liberais do FDP e pelos Verdes.
Leia Também: Alemanha. Estudo revela favorecimento da extrema-direita no TikTok e X