"Nem através do Governo, nem através de ninguém no Parlamento, nem através das chefias militares, nem através de quaisquer entidades de investigação criminal, civil ou militar, nem através de elementos da minha equipa, da Casa Civil ou da Casa Militar, nem através de terceiros, não tive", declarou Marcelo Rebelo de Sousa às televisões, à margem da Assembleia-geral das Nações Unidas, em Nova Iorque.
O chefe de Estado, que é comandante supremo das Forças Armadas, disse que soube que "a defesa de um dos implicados fez questão de afirmar expressamente que não envolvia o Presidente da República".
"Espero que seja a última vez que falo sobre a matéria, até porque se aguarda a todo o momento a acusação, no caso de ela existir, e o que haja a investigar contra quem quer que seja, sem qualquer limitação, seja investigado", afirmou.
O Presidente sublinhou que se trata dos "mesmos factos, os mesmos elementos", de "há três ou quatro meses, que são reapresentados".
"Mas para que não restem dúvidas, por uma questão, não só de honra pessoal, mas porque estou aqui a defender a posição de Portugal, é bom que não esteja a defender a posição de Portugal na Assembleia-geral das Nações Unidas ao mesmo tempo que surge uma vaga dúvida sobre se o Presidente é criminoso, é bom que fique claro que o Presidente não é criminoso", frisou.
A TVI noticiou esta terça-feira que o major da PJ-Militar Vasco Brazão se referiu, numa escuta telefónica, ao Presidente da República, como o "papagaio-mor do reino", que, segundo ele, sabia de tudo.
O furto de armas de guerra nos paióis de Tancos foi divulgado em 29 de junho de 2017.
Um dos arguidos do processo é o ex-ministro da Defesa Nacional José Azeredo Lopes, que está proibido de contactar com os outros arguidos, com o seu ex-chefe de gabinete e com o antigo chefe de Estado Maior do Exército, general Rovisco Duarte.
Quase três meses após a divulgação do furto das armas, a Polícia Judiciária Militar (PJM) revelou o aparecimento do material, na região da Chamusca, a 20 quilómetros de Tancos, em colaboração com elementos do núcleo de investigação criminal da GNR de Loulé.
O processo de recuperação do material militar levou a uma investigação judicial, por suspeitas de associação criminosa, tráfico de armas e terrorismo no furto do armamento e durante a qual foram detidos o agora ex-diretor da PJM Luís Vieira e o antigo porta-voz da PJM Vasco Brazão e três militares da GNR, num total de oito militares.
Entre o material furtado estavam granadas, incluindo antitanque, explosivos de plástico e uma grande quantidade de munições.
"Ninguém é uma ilha, ninguém consegue sozinho enfrentar problemas que são globais"
Perante a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, o Presidente português avisou esta terça-feira que se deve aprender com o fracasso da Liga das Nações, que não evitou a II Guerra Mundial, e que "ninguém é uma ilha", pedindo apoio à ONU.
"Sabemos onde foi parar o mundo, porque há precisamente 80 anos começava a II Guerra Mundial. O que era a promessa de há cem anos convertia-se numa hecatombe, 20 anos após. Vale a pena parar um minuto para retirar as lições desse passado ainda próximo, agora que estamos a entrar nos 75 anos de vida das Nações Unidas", afirmou.
Marcelo Rebelo de Sousa, que falou em português, reforçou esta mensagem no final da sua intervenção neste debate geral da 74.ª Assembleia Geral da ONU, em inglês: "Só aqueles que não conhecem a História e, por isso, não se importam de repetir os erros do passado, minimizam ou relativizam o papel das Nações Unidas".
"Nesta sala, felizmente, somos todos patriotas. Porque amamos as nossas terras, e desejamos. E o melhor não é ignorar o mundo em que vivemos, e em que dependemos. Nós, patriotas, nós sabemos que precisamos de mais, e não de menos, Nações Unidas", acrescentou.
"Ser-se patriota é ter-se orgulho no passado, é ter-se orgulho nas raízes, é ter-se orgulho na História própria, mas é também ter-se a exata noção de que o mundo é como é, e de que os outros têm direito a ter orgulho nas suas próprias pátrias. E que o mundo, onde não há ilhas, é fruto do diálogo do encontro, da permanente conjugação entre o espírito patriótico de todos e cada um de nós", defendeu.
O Presidente da República argumentou que "vale a pena lutar por uma visão multilateral de todos, a começar nos que se consideram mais poderosos, porque ninguém é uma ilha, ninguém consegue sozinho ou com alguns aliados enfrentar problemas que são globais".
As histórias de Marcelo e a brincadeira de Alec Baldwin
Numa iniciativa sobre sustentabilidade dos oceanos, Alec Baldwin chamou ao palco Marcelo Rebelo de Sousa apresentando-o como um chefe de Estado que "nada todos os dias, mesmo em viagens ao estrangeiro, e com tanta frequência que o seu corpo de segurança tem de fazer treino de natação para conseguir acompanhá-lo".
Entre as suas "experiências únicas" como nadador, Marcelo Rebelo de Sousa contou um episódio no Sul da Rússia: "Fui nadar, com dois portugueses e dois russos atrás de mim. Os russos, bem, ao fim de algumas centenas de metros desistiram, só os portugueses continuaram a tentar seguir o meu ritmo".
"Temos de cuidar dos oceanos. Não podem imaginar o que eu vejo, felizmente, não em Portugal, mas noutros lugares, de poluição nos oceanos", acrescentou, convidando todos a comparecerem na conferência que se irá realizar em Lisboa em junho do próximo ano.
Quando o Presidente português terminou a sua intervenção, feita em inglês, Alec Baldwin virou-se para a assistência e perguntou: "Não ouvi o discurso do Trump de hoje, como é que ele se saiu? Tornou a América grande outra vez?".
Marcelo Rebelo de Sousa, que ia precisamente para uma receção oferecida pelo Presidente dos Estados Unidos da América aos chefes de Estado que participam nesta 74.ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, apressou-se a sair de cena, mas primeiro retomou o microfone.
"Eu tenho de ir embora, caso contrário o Presidente Trump irá considerar a minha ausência um gesto político", justificou, colocando-se de repente ao lado do ator, para logo desaparecer.
Alec Balwin, que está habituado a personificar Donald Trump, virou-se então para Marcelo Rebelo de Sousa, com a expressão e o modo de falar do Presidente dos Estados Unidos da América, e pediu-lhe que voltasse para trás: "Volte, por um segundo, volte".
O Presidente português, no entanto, já se tinha ido embora e não voltou.