Justiça em "plena revolta". O que se passa entre PGR e magistrados?

Magistrados mostram-se indignados perante uma decisão da procuradora-geral que visa reforçar os poderes dos superiores hierárquicos do Ministério Público.

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Filipa Matias Pereira
07/02/2020 09:19 ‧ 07/02/2020 por Filipa Matias Pereira

País

Justiça

Magistrados e a Procuradoria-Geral da República têm marcado a atualidade nacional nos últimos dias. O aparente clima de tensão entre estes 'protagonistas' tem, na sua base, um parecer do conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR) que a procuradora-geral, Lucília Gago, determinou que fosse seguido e aplicado pelo Ministério Público. Juízes não gostaram e, agora, contestam a medida.

Passemos a explicar. Foi recentemente divulgado um parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República que determina que a hierarquia do Ministério Público (MP) pode intervir nos processos-crime, "modificando ou revogando decisões anteriores". Ficam, assim, reforçados os poderes dos superiores hierárquicos face às decisões dos magistrados. 

Lucília Gago optou então por determinar que esta doutrina fosse "seguida e sustentada pelo MP", referindo que as normas relativas à intervenção hierárquica em processos crime "conferem à hierarquia competência para a prática de atos processuais penais, modificando ou revogando decisões anteriores".

Neste parecer que tinha, aliás, sido pedido pela própria procuradora-geral, o Conselho Consultivo defende ainda que a subordinação hierárquica dos magistrados do MP "permite a execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania e o controlo dos atos processuais" e "melhora a administração da justiça, evitando a fragmentação de procedimentos e resultados".

O que pensam os magistrados sobre a medida?

O parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República que Lucília Gago decidiu que deve ser aplicado não foi visto com 'bons olhos' pelos juízes. Aliás, o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) vai mesmo exigir, por abaixo-assinado e mobilização da classe, que a procuradora-geral da República revogue a diretiva que reforça os poderes dos superiores hierárquicos.

O presidente do Sindicato, António Ventinhas prometeu uma "grande mobilização" dos magistrados se Lucília Gago "não arrepiar caminho" e continuar na senda desta diretiva que promove, no seu entendimento, um "poder absoluto, sem controlo, secreto e oculto". O magistrado foi ainda mais além e falou mesmo num "divórcio completo" entre a PGR e os magistrados do MP a "curto prazo".

O presidente do SMMP considerou que a PGR "irá depender dela própria" para ter condições para "continuar ou não" a dirigir o MP, pois se continuar "com o caminho como até aqui, com este tipo de diretivas, existirá um divórcio completo e será "muito difícil gerir uma organização em plena revolta".

Este parecer que gerou 'reboliço' na justiça surgiu nas vésperas de um estudo realizado pelo especialista em Direito Administrativo Luís Fábrica ser também divulgado. Este aponta para o "reforço da autonomia dos procuradores face à hierarquia do MP", à luz do novo Estatuto do MP, que entrou no início do ano em vigor.

PGR esclarece o que muda 

Em comunicado enviado às redações nesta sexta-feira, a PGR esclarece que o Procurador-Geral da República não fica com poderes acrescidos de intervenção direta em processos, "mantendo os poderes hierárquicos que sempre lhe foram conferidos intocáveis".

A PGR vinca também que o magistrado do Ministério Público pode "justificar a posição que assume, eventualmente diversa ou contraditória com as que antes assumiu, com uma referência sumária ao dever de obediência hierárquica". Isto é, "pode referir que está a cumprir uma ordem, mencionando mesmo, se tal se justificar, a existência de um suporte escrito extraprocessual de tais comandos hierárquicos".

[Notícia atualizada às 10h31]

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