O epidemiologista Manuel Carmo Gomes afirmou esta quinta-feira, na reunião no Infarmed sobre a evolução epidemiológica da Covid-19 em Portugal, que é expectável que o pico de óbitos por Covid-19 no país se alcance na segunda semana de dezembro, com 95 a 100 mortes por dia. Quanto ao pico de novos casos, o especialista prevê que aconteça na transição entre novembro e dezembro, podendo os contágios diários situar-se na ordem dos 7 mil.
"A onda quando se eleva e depois se começa a deslocar adquire inércia (...) começa a deslocar-se de uma maneira que nós percebemos que há um certo número de casos que já não vamos conseguir evitar", disse o especialista, explicando a razão de existir uma certa "previsibilidade" na transmissão da doença.
"Nós medimos essa inércia (...) que faz coisas boas e coisas más. Uma das coisas más é que é difícil de parar a onda. Isto é, mesmo que haja uma intervenção abrupta de um dia para o outro, a onda continua durante bastante tempo. É como desligar o motor ao petroleiro quando se está a aproximar do porto, muito tempo antes de chegar", comparou, indicando que é "esta inércia que estes processos de transmissão [do novo coronavírus] também têm", indicou.
Manuel Carmo Gomes apresentou de alguns exemplos de outros países para "percebermos o perigo em que estamos, mesmo que atinjamos o pico" da transmissão da doença no país.
O especialista referiu-se ao caso da Irlanda que, quando estava a verificar valores superiores aos da primeira onda, tomou "medidas muito enérgicas entre 19 de outubro e 9 de novembro. "Conseguiram em 15 dias reduzir o R para 0,9. É notável, é um caso de sucesso", considerou, assinalando que o país passou de 1.150 casos a 14 de outubro para 350 a 12 de novembro". A Irlanda conseguiu, assim, manter a taxa de transmissibilidade abaixo de 1 durante algum tempo, mas, começou-se a aliviar as medidas, e o valor já está a aumentar. "Mesmo os irlandeses, com o sucesso que tiveram, se não voltam a adotar medidas não estão livres de voltar a ter um aumento", previu.
No caso da Bélgica, país que teve uma primeira vaga "muito agressiva" e uma segunda vaga "ainda mais agressiva", tomaram-se medidas e em 17 dias reduziram o número de casos de 18 mil por dia para 4 mil. Mas, também neste caso, o valor do R já começa a aumentar. "A Bélgica, tal como a Irlanda, não está livre de que voltem a ter uma subida de casos". O mesmo se sucede com Israel. Quanto a Itália, país que está agora no pico, o especialista vaticinou: Os "italianos, se aliviarem demasiado, não saem daquele patamar de 30 mil casos".
Outro exemplo dado foi o caso da Índia, que conseguiu, durante muito tempo, manter o RT na zona do 1. No entanto, manteve-se ligeiramente acima do 1 durante meses, o que originou uma "onda monstruosa de casos".
"A mensagem é esta: nós, em termos globais, estamos a abrandar a epidemia, temos algumas previsões de onde estará o pico, mas não podemos baixar a guarda de maneira nenhuma. Na primeira oportunidade, o R volta a subir. Pensando num futuro próximo, é preciso chegar ao pico, manter as medidas, fazer descer o R significativamente [durante semanas] para um nível que seja gerível em termos de entradas hospitalares", defendeu.
A ideia de que há um abrandamento no crescimento da pandemia no país foi também deixada por Óscar Felgueiras. "Temos neste momento uma situação em que em geral está a haver abrandamento de crescimento" no Norte do país, a zona onde há mais casos de infeção, disse. Segundo o especialista, mesmo onde a pandemia está a crescer, em geral, há abrandamento e, eventualmente, onde está a descer a tendência é de descida em muitas regiões.
No entanto, sublinhou, "estamos neste momento com uma incidência que é quase sete vezes superior à registada em abril no momento mais alto da pandemia e recentemente a tendência foi de haver um certo abrandamento".