No Infarmed, em Lisboa estão presentes a maioria dos epidemiologistas e a ministra da Saúde, Marta Temido. Os restantes participantes, Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa e Ferro Rodrigues, os membros do Conselho de Estado e parceiros sociais, acompanham a reunião por videoconferência.
Peralta Santos, da DGS, iniciou a reunião, retratando a situação epidemiológica do país. Referindo-se à incidêndia a 14 dias por 100 mil habitantes, o responsável indicou "que iniciámos uma trajetória descendente da epidemia em Portugal", que "na sua taxa de notificação teve um pico a 29 de janeiro, com aproximadamente 1.669 cumulativos a 14 dias por 100 mil habitantes" e com "uma variação semanal de menos 24 % deste indicador".
O especialista comparou de seguida o gráfico da última reunião (9 de janeiro), quando a incidência era de 862, com um crescimento acelerado, com o gráfico de 16 de janeiro, quando a incidência era de aproximadamente de 1.200, com o de 23 de janeiro (com incidência de 1.500 - já muito próximo do pico) com o gráfico de 30 de janeiro, que mostra que o país se encontra agora com uma incidência à volta dos 1.200. Aliás, ao dia de hoje, "já será menor", uma vez que "tivémos uma consolidação desta tendência decrescente".
Relativamente à incidência por regiões, Peralta Santos indicou que Lisboa e Vale do Tejo continua com incidências, na maioria dos municípios, superiores a 960, que alguns municípios da Área Metropolitana de Lisboa e na região de Península de Setúbal registam incidências superiores a 1.920 e "alguma dispersão em municípios com menor densidade populacional".
Depois de um "agravamento" disperso por todo o país, a situação é hoje "mais favorável", sublinhou. Analisando a variação da incidência, vemos que no início de janeiro "a pandemia estava em franco crescimento, e, à medida que nos aproximamos do final do mês começa a alargar as áreas a verde (um decréscimo da incidência)", confirmando-se agora uma "generalização por todo o país das áreas de decréscimo, à exceção da região autónoma da Madeira".
O responsável demonstrou de seguida que "todas as idades têm uma tendência decrescente" nas infeções, acompanhando a situação genérica das regiões.
As faixas etárias que "geram mais preocupação em termos de hospitalização e de mortalidade" situam-se acima dos 60 anos. "O panorama é de um grande aumento da faixa etária mais vulnerável (acima dos 80 anos), que atingiu incidências muito elevadas e uma manutenção do comportamento das faixas 60-70 e 70-80", afirmou.
As infeções na faixa etária 80 +, com alturas no mês de dezembro onde foi a faixa etária com maior incidência, "ajuda a explicar também a pressão sobre os sistemas de saúde que observámos", sublinhou.
Quanto às hospitalizações, o especialista apresentou um gráfico que dá conta que os internamentos em UCI estão "talvez ainda a formar o pico", mas ainda sem tendência "claramente definida".
No que diz respeito à mortalidade a 14 dias, "vemos um aumento bastante expressivo durante o mês de janeiro (um aumento de quase três vezes em relação ao pico de dezembro), mas já com a formação clara de um pico na primeira semana de fevereiro", disse.
Concretamente sobre as duas regiões mais populosas do país, a região Norte registou um "crescimento muito semelhante" ao que aconteceu em novembro e dezembro, em termos de incidência máxima. LVT foi "a região mais afectada nesta fase de crescimento de janeiro, com um crescimento bastante rápido, com a multiplicação por quatro da incidência cumulativa a 14 dias num período relativamente curto de um mês. Na última semana, a região registou também um decréscimo generalizado, mantendo-se a AML e a Península de Setúbal superiores a 1.920. LVT registou "máximos históricos" em termos de hospitalizações e de mortalidade, atualmente com "a inversão da tendência".
Sobre a nova variante do vírus, o especialista demonstrou que "há uma progressão da proporção de casos confirmados com a nova variante, com maior foco na região LVT, com um foco no Alentejo Litoral, na região de Coimbra, e a Norte menos prevalente".
Apesar de melhoria, "continuamos com uma incidência extremamente elevada"
Resumindo a sua intervenção, Peralta Santos reforçou que estamos efectivamente numa fase decrescente da epidemia, que é generalizada em todas as regiões de Portugal continental e grupos etários", mas, alertou: "Continuamos com uma incidência extremamente elevada".
O responsável defendeu ainda que "este nível de confinamento parece suficiente para inverter a tendência, mesmo nas áreas onde há maior prevalência da variante inglesa".
RT abaixo de 1 em todo o país (à exceção da Madeira)
Baltazar Nunes, do INSA, revelou que índice de transmissibilidade (RT) para os últimos cinco dias analisados (30 de janeiro a 3 de fevereiro) se situa nos 0.82.
"Este é um valor baixo, que indica uma redução da incidência de forma clara", disse, salientando que este indicador se encontra abaixo de 1 em todas as regiões do continente e na região autónoma dos Açores. Já na Madeira, o R encontra-se em 1.13, que indica uma fase de crescimento".
De acordo com o especialista, a redução do R "é clara" e "iniciou-se perto do momento em que as medidas iniciaram a sua implementação (15 de janeiro e 22 de janeiro)", sendo atualmente a média de incidência é de 6.417 no total.
"Verificamos que a incidência toma os seus valores mais elevados nos adultos jovens, pessoas entre os 25 e os 30 anos. Verificamos também que quando olhamos para os cidadãos mais seniores, pessoas com 80 ou mais anos, a incidência toma número mais elevados. É o grupo que tem maior intensidade da epidemia. Vemos também que há grupos que estão protegidos: pessoas próximas dos 75 anos e as crianças. Vemos que na semana três e quatro [de 2021] a incidência espalha-se pelo resto da população e acaba por ser elevada entre todos os indivíduos entre os 25 e os 50 anos. Há uma dispersão da incidência por outros grupos etários", indicou.
Baltazar Nunes fez também um retrato da situação com base nas medidas restritivas de combate à pandemia, comparando o caso de Portugal com os restantes países da UE. "Portugal, nesta fase, está entre os países com medidas mais restritivas, juntamente com o Reino Unido, a Alemanha e a Irlanda", sublinhou referindo-se concretamente ao uso obrigatório de máscara, fecho das escolas e recolhimento obrigatório.
Sobre a mobilidade, indicador que reflecte a entrada em vigor das medidas restritivas, o especialista fez um retrato da evolução: "No dia 1 de janeiro, Portugal estava entre os países com maior mobilidade. A 15 de janeiro reduz um bocado, mas ainda está nos países com maior mobilidade. Neste momento os países com mobilidade mais reduzida são Áustria, Reino Unido, Holanda e Irlanda. Mais recentemente, a partir de 19 de janeiro – quando as medidas são introduzidas – começámos a ver que Portugal passa para os países com redução de mobilidade e, actualmente, Portugal é o país com uma redução de mobilidade mais acentuada na União Europeia, com uma diminuição na ordem dos 66%".
Resumindo a sua intervenção, Baltazar Nunes defendeu que "precisamos de manter estas medidas de confinamento por um período de dois meses para trazer o número de camas ocupadas em cuidados intensivos abaixo das 200 e a incidência acumuladas a 14 dias abaixo dos 60 casos por 100 mil habitantes".
Testagem não pode abrandar com redução da incidência, alerta Manuel Carmo Gomes
Manuel Carmo Gomes sustentou, na sua intervenção, que "é preciso ganhar tempo para conseguirmos vacinar o maior numero possível de pessoas, o mais depressa possível". "Nesta primeira fase de vacinação temos 1.4 milhões de pessoas para vacinar, que são as pessoas de alto risco. Precisamos desesperadamente de tempo para vacinar estas pessoas", reforçou.
Antes, o especialista afirmou que as medidas restritivas "foram decisivas" para a redução da incidência das infeções no país, mas alertou para o facto de a testagem acompanhar o número de casos quando estão a descer. "Isto, na minha opinião, não é desejável", defendeu, explicando que a percentagem de casos positivos entre os testes foi muito alta e recordando que as organizações internacionais recomendam 5% e Portugal chegou a atingir 20%. "Estamos agora a descer. No entanto, se a incidência, ao baixar, trouxer também para baixo o número de testes, a positividade pode não descer tanto como gostaríamos".
Caracterizando o mês de janeiro como "muito mau em termos de saúde pública em Portugal", o epidemiologista quis fazer uma "reflexão sobre a estratégia que temos adotado, como é que chegámos a este ponto e como é que podemos fazer melhor".
O especialista comentou que, desde maio, a forma do país lidar com a pandemia consiste em ler os indicadores epidemiológicos, que normalmente chegam com sete dias de atraso (como é o caso do R), adotar medidas que parecem ser as adequadas, depois levamos uma semana ou quinze dias para ver o resultado das medidas, normalmente as medidas não são suficientes e voltamos a tomar mais medidas, e continuamos nisto". "É a chamada resposta gradualista à medida que os indicadores, que chegam com atraso, nos vão dizendo como está a epidemia", resumiu, defendendo que "não conseguimos controlar um vírus que cresce exponencialmente desta maneira" e que "a partir de certa altura, a sociedade começa-se a dividir entre aqueles que acham que o Governo tomou medidas demasiado fortes" e outros que acham que não. "É o resultado de andarmos constantemente atrás da epidemia", observou.
As três linhas vermelhas que não podem ser ultrapassadas
O epidemiologista propõe que o país adote uma postura "completamente diferente" em termos estratégicos. "Pela nossa experiência, a resposta gradual é insuficiente", disse, defendendo uma "resposta agressiva, que seja guiada por critérios objetivos, linhas vermelhas, se quiserem, e se estas forem ultrapassadas, temos de agir de forma muito agressiva relativamente à epidemia". Esta é a posição defendida por um grupo de 871 cientistas de toda a Europa. Há também a preocupação, entre os cientistas, relativamente às novas variantes que "só vão agravar a situação" e tornar ainda "mais premente uma mudança de estratégia".
Manuel Carmo Gomes deu o exemplo da Dinamarca para detalhar o que é que representa uma "resposta forte e agressiva" em relação à subida de casos. A estratégia baseia-se num "aumento brutal" do número de testagem. Ao contrário do que se passou neste país, a resposta em Portugal não teve "suficiente agressividade". "A testagem é a arma principal que devemos usar", disse, sugerindo três linhas vermelhas: termos um R que não ultrapasse 1,1; percentagem de testes positivos que não permita a positividade chegar aos 10% e uma incidência que não ultrapasse o nível que o Ministério da Saúde considere adequado à nossa capacidade de gerir doentes covid e não covid (2.900 casos por dia, o que corresponde a cerca de 1.500 pessoas hospitalizadas e 200 em UCI).
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Em direto: Situação Epidemiológica da Covid-19 em Portugal https://t.co/VRAA5LtIUB
— República Portuguesa (@govpt) February 9, 2021
Portugal continental entrou num novo confinamento geral no dia 15 de janeiro, com os portugueses sujeitos ao dever de recolhimento domiciliário, em que apenas se prevê deslocações autorizadas num quadro muito limitado, para comprar bens e serviços essenciais ou desempenho de atividades profissionais.
Inicialmente, o Governo manteve as escolas com o ensino presencial, mas corrigiu essa decisão na semana seguinte e suspendeu as aulas de todos os graus de ensino face ao continuado agravamento da situação epidemiológica do país.
O Governo determinou a obrigatoriedade do teletrabalho, sempre que as funções em causa o permitam, sem necessidade de acordo das partes, prevendo que o seu incumprimento seja considerado uma contraordenação muito grave.
Ao fim de três semanas de vigência de normas apertadas de confinamento, o país tem registado nos últimos dias sucessivas reduções do número de infetados com o novo coronavírus, embora os hospitais permaneçam sob grande pressão e continuem a aumentar ligeiramente o número de internamentos e de doentes em cuidados intensivos.
No Governo, é praticamente certo que nenhuma medida de alívio das restrições à atividade será levantada a curto prazo. Entre os epidemiologistas, prevalece a tese de que o país não poderá começar a desconfinar enquanto não baixar de forma sustentada para os dois mil casos novos de infeção por dia.
Portugal registou mais 196 mortes relacionadas com a Covid-19 e 2.505 casos de infeção com o novo coronavírus, segundo o boletim mais recente da Direção-Geral da Saúde (DGS), divulgado na segunda-feira.
O boletim da DGS revelou também que estão internadas 6.344 pessoas, mais 96 do que no domingo, das quais 877 em unidades de cuidados intensivos, ou seja, mais 12.