De acordo com dados divulgados hoje, a Linha Internet Segura recebeu 587 chamadas telefónicas por parte de vítimas de cibercrime entre janeiro e dezembro de 2020, enquanto entre janeiro e dezembro de 2019 foram recebidos 102 contactos, um aumento de 575,49% que para a APAV reflete "este tempo de pandemia".
"Na nossa opinião deve-se ao facto não só de as pessoas passarem mais tempo online, porque assim muitas vezes as circunstâncias o impõem, seja através da telescola ou do teletrabalho, como pessoas que antes não estavam online e não estavam tão sensibilizadas para questões relativas a cibersegurança passarem a estar, o que fez com fossem alvo de algum tipo de incidente a nível de segurança informática", explicou o responsável pela Linha Internet Segura, Ricardo Estrela.
Entre os 1.164 contactos -- somando pedidos de ajuda e denúncias de conteúdos ilegais -- recebidos pela Linha Internet nos doze meses de 2020, registou-se um pico de chamadas em março, quando a linha recebeu 154 telefonemas, contra as 83 recebidas em janeiro e 119 em fevereiro.
Entre dos crimes, ou outras formas de violência, mais denunciados destaca-se a ameaça, com 172 casos, o que representa 29,3% das 587 chamadas, havendo também situações de difamação ou injuria (45), bullying (10), devassa da vida privada (18), gravação e fotos ilícitas (31) ou 'sextortion' (34), um termo que junta as palavras 'sex' (sexo) e 'extortion' (extorsão) e que acontece quando alguém ameaça divulgar conteúdo pessoal e exige favores sexuais ou o pagamento de dinheiro para não o fazer.
"Nas ameaças estamos a falar sobretudo de ameaças via redes sociais e a ameaça mais comum é a divulgação de imagens ou vídeos íntimos, o que acaba por não cair na categoria de 'sextortion' porque não tem subjacente uma contrapartida monetária", esclareceu Ricardo Estrela.
De acordo com o responsável, são situações que normalmente acontecem no contexto de relações íntimas, seja relações de namoro que já têm alguma duração no tempo, seja relações esporádicas, através de plataformas online "em que as pessoas foram aliciadas a partilhar algum tipo de imagem e depois são chantageadas ou ameaçadas que caso não enviem ou não façam qualquer coisa sofrem uma represália".
Ricardo Estrela adiantou que ao longo do último ano foi possível detetar algumas alterações na forma de atuação relativamente a certo tipo de criminalidade, nomeadamente no caso das ameaças, 'sextortion', devassa da vida privada ou gravações ou fotografias ilícitas.
"Aquilo que nós reparámos ao longo do ano de 2020 é que passou a ser um fenómeno com um aumento crescente no número de casos sobretudo, mas não só, de mulheres portuguesas que começaram a ser expostas em grupos privados, seja em plataformas de 'chat', seja mesmo em plataformas de partilha de ficheiros", apontou, acrescentando que isso em 2019 "não ocorria".
Revelou também que tem igualmente havido "muitas ameaças via rede social ou via plataformas de mensagens instantâneas (sms, whatsapp), onde também há muitas ameaças de ofensas à integridade física e mesmo ameaças de morte", um fenómeno "associado ao aumento de denúncias de discurso de ódio".
No que diz respeito aos contactos feitos para denunciar conteúdos ilegais disponíveis na Internet, nomeadamente pornografia infantil ou que façam a apologia da violência ou do racismo, a linha recebeu 720 contactos telefónicos, entre 544 especificamente por causa de conteúdos com abusos sexuais de menores e outros 216 relativos a discursos de ódio.
Nesta matéria, foi possível categorizar 1.773 imagens e, em cinco casos, denunciar conteúdos de abuso sexual de menores alojados em Portugal.
Ricardo Estrela admitiu que o "cibercrime é um mundo muito vasto", mas deixou dois conselhos, nomeadamente "ter cuidado com todo o tipo de informação" que se partilha na internet, sublinhando que a pegada digital é "muito forte" e que dificilmente se consegue apagar algo depois de partilhado, e garantir que todos os equipamentos estão seguros, desde logo na criação e salvaguarda de palavras-passe.