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Num ano "intenso" de Covid, Graça Freitas confessa que pensou em desistir

Um dos principais rostos da liderança no combate à pandemia de Covid-19, Graça Freitas confessa que chegou a pensar desistir. Considerando que "não há uma receita" para o desconfinamento, no que às escolas concerne, a diretora-geral da saúde é apologista de uma "abertura faseada".

Num ano "intenso" de Covid, Graça Freitas confessa que pensou em desistir
Notícias ao Minuto

23:55 - 03/03/21 por Notícias ao Minuto

País Covid-19

Um ano depois de ter sido diagnosticado o primeiro caso de Covid-19 em Portugal, Graça Freitas fez um balanço destes 365 dias em que as autoridades portuguesas se viram 'a braços' com uma pandemia sem precedentes. A diretora-geral da saúde confessou, na 'Grande Entrevista da RTP' desta quarta-feira, que este foi um ano "intenso" e que chegou a pensar em desistir durante "momentos".

Ao descrever este ano, a responsável não tem dúvidas na escolha das palavras que o caracterizam: "Intenso, é a primeira palavra que me ocorre. Insone, dormi muito pouco. Foi um ano de grandes emoções, de muito trabalho, de muita preocupação".

Questionada se equacionou abandonar o cargo, Graça Freitas revelou que teve "momentos em que sim", em que pensou em "desistir", porque estava "muito cansada e este foi um ano muito intenso". Pensava que "outras pessoas poderiam fazer melhor", mas esse pensamento "não durava muito tempo" e rapidamente se dissipava.

Ao percorrer as memórias deste ano, a diretora-geral da saúde recordou o pior dia, que situa "em janeiro [de 2020], quando li um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre as cadeias de transmissão". No documento, a OMS antecipava que havia cadeias de transmissão secundárias e "percebi que, mais tarde ou mais cedo, íamos ter uma pandemia. Esse dia marcou uma viragem. Percebi que teríamos um problema grave".

O 'arco-íris' chegaria mais tarde, "quando a primeira vacina foi aprovada por agências do medicamento". Nessa altura, defende, "abriu-se o mundo da esperança".

Em Portugal, os dados das autoridades sanitárias mostram que o coronavírus 'roubou' mais de 16 mil vidas e infetou mais de 800 mil portugueses. Estes números são, "que são açambarcadores", são números que, aos olhos de Graça Freitas, "nos esmagam". "Esta dimensão é a dimensão do ano trágico que vivemos. É muito difícil porque estes números são pessoas. São números muito dolorosos".

A responsável confessou ainda que, dias antes de ter sido infetada com o SARS-CoV-2, perdeu um "grande amigo", vítima da Covid-19. "Esta é a história de milhares de pessoas".

Graça Freitas acredita que as autoridades de saúde foram tomando as decisões que, ao longo desta "epidemia que não é regular", eram as mais indicadas. "Em cada momento, como cidadãos e sociedade, foram sendo tomadas as medidas que, naquela data, se consideraram melhores". Porém, Graça Freitas reconheceu que, "se olharmos para trás, muitas coisas poderiam ter sido feitas de maneira diferente".

Em janeiro, Portugal 'abriu' as portas à terceira - e pior vaga - da Covid-19. Este mês foi uma "tragédia do ponto de vista da saúde pública e das repercussões que teve no sistema de saúde e nas vidas de todos nós".

Questionada se era possível antecipar estes números trágicos, a diretora-geral da saúde defendeu que "qualquer medida para fazer efeito precisa de semanas e nessa altura [dezembro] eu creio que não havia a noção de que o crescimento fosse desta dimensão. Já tínhamos tido duas ondas" e esta terceira vaga "atingiu o pico, mas não ficou em planalto, continuou a crescer e decaiu depressa. O rasto que deixou é devastador".

Quanto à deteção da variante do Reino Unido em Portugal, a responsável negou "descuido". "Fizemos procura ativa da variante. Havia atenção especial nos inquéritos epidemiológicos. Mas o certo é que não a encontramos precocemente".

Apesar dos esforços das autoridades, "nem sempre é fácil antecipar o comportamento das várias variáveis. Não sabíamos a dimensão que estava por baixo deste iceberg".

Desconfinamento? "Não há uma receita"

O Governo revelou que o plano de desconfinamento que está a ser elaborado será anunciado na próxima semana. Quando este é tema em 'cima da mesa', a diretora-geral considera que "não há uma receita". Em Portugal, em relação ao desconfinamento, os cientistas estão a considerar quatro indicadores - "a incidência acumulada a 14 dias, a positividade, a ocupação em camas de cuidados intensivos e o Rt (indicador de transmissibilidade)".

Estima-se que o desconfinamento se inicie pelas escolas mas, acredita Graça Freitas, ainda não é a altura de o fazer. "Temos de aguardar, temos de consolidar todos estes valores e ainda temos de esperar que pelo menos alguns deles melhorem, nomeadamente o esforço que ainda existe no Serviço Nacional de Saúde, designadamente em cuidados intensivos. Mesmo a incidência gostaríamos que estivesse um pouco mais baixa".

Considerando que há países que avançam na reabertura das escolas e depois acabam por regredir, Graça Freitas defende que "é preciso ter alguma cautela". Para lá disso, a responsável sublinhou que, "à medida que o desconfinamento se vai fazendo, tem de haver dias ou semanas para perceber o efeito nos indicadores".

A especialista em Saúde Pública defende, então, que "aconselharia a abertura faseada [das escolas]", começando pelo "grau de ensino com alunos mais novos (que infetam e transmitem menos)".

Uma medida importante para travar a progressão da pandemia nas escolas diz respeito à testagem. "À medida que forem abertos graus de ensino", deverá ser "feita uma testagem em varrimento da comunidade educativa adulta. E quando chegar a altura do ensino secundário, essa testagem será feita não só aos adultos, mas aos alunos".

"O primeiro trimestre vai ficar aquém das expectativas"

O plano de vacinação contra a Covid-19 tem sido alvo de alguns atrasos, em função da entrega do fármaco por parte das farmacêuticas. Graça Freitas reconheceu que "o primeiro trimestre vai ficar aquém das expectativas", mas "depois vamos ter um aumento enorme de fornecimentos, conforme está previsto", o que permitirá levar a cabo uma "segunda fase de vacinação massificada. Se tudo correr bem, no final de agosto, teremos 70% da população vacinada", pressagia.

Quanto à utilização das máscaras, "à data, as nossas recomendações de utilização mantêm-se", acrescentou ainda.

Leia Também: DGS lança orientação: Cada enfermeiro vacinará 10 pessoas por hora

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