O Presidente da República promulgou esta segunda-feira as alterações à Lei da Defesa Nacional e à Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas (LOBOFA), justificando as promulgações com várias razões, a começar pelo facto de os diplomas terem merecido "parecer unânime" do Conselho Superior de Defesa Nacional.
Marcelo Rebelo de Sousa atendeu também "à versão final dos diplomas - atenuando uma ou outra faceta mais controversa -, e, sobretudo, às muito expressivas maiorias parlamentares, aliás consonantes com as mesmas que tinham votado as Leis n.º 5 e 6/2014 -- que abriram caminho ao estatuto de superior hierárquico" do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e "também ao espaço existente na futura apreciação das leis orgânicas do CEMGFA e dos três ramos das Forças Armadas".
Na nota, refere-se ainda que o Presidente da República ouviu "no termo do processo legislativo, os quatro Chefes Militares que, aliás, compreenderam a lógica da posição presidencial".
Os decretos, aprovados no parlamento por PS, PSD e CDS-PP, têm por base propostas de lei do Governo, que lançou esta reforma para, entre outras alterações, reforçar os poderes do chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas (CEMGFA) em relação aos três ramos militares. As propostas surgem na sequência de tentativas similares por parte de outros Governos, em 2009 e 2014.
A figura do CEMGFA passa agora a ter mais poderes e competências, designadamente em termos de comando operacional conjunto dos três ramos das Forças Armadas (Marinha, Exército e Força Aérea), ficando os chefes militares na sua dependência hierárquica.
Para além disto, o Conselho de Chefe do Estado-Maior, principal órgão militar coordenador e de consulta do Chefe do Estado-Maior-General, perde agora a sua competência deliberativa (ou seja, de decisão) e passa apenas a elaborar pareceres sobre várias matérias militares.
A concentração de poderes na figura do CEMGFA foi defendida pelo executivo como uma forma de permitir que este chefe militar "tenha à sua disposição a qualquer momento as forças de que precisa para executar as suas missões" e favorecer uma "visão de conjunto" sobre as necessidades e processos de investimento das FA.
No entanto, essa não foi a visão de ex-chefes militares ou ex-Presidentes da República, como Ramalho Eanes ou Cavaco Silva, que criticaram publicamente a reforma do executivo.
O documento chegou mesmo ser contestado pelo "Grupo dos 28" ex-chefes de Estado Maior dos três ramos, incluindo Ramalho Eanes, também ex-chefe do Exército, que assinaram uma carta a criticar o processo e a pedir um debate alargado à sociedade civil.
No mesmo dia em que a carta foi entregue, a 14 de abril, Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente e Comandante Supremo das Forças Armadas, relativizou este ambiente de conflito, enquadrando a contestação à reforma como parte de "um amplo debate, como é próprio em democracia e salutar em democracia".
A polémica durou meses e gerou trocas de acusações entre o ministro da Defesa Nacional, João Gomes Cravinho, e representantes de associações socioprofissionais como a Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA) e do GREI - (Grupo de Reflexão Estratégica Independente), associação que reúne antigos chefes militares.
As alterações chegaram inclusive a merecer reservas dos atuais chefes militares dos três ramos, ouvidos no parlamento, contrastando com o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, almirante António Silva Ribeiro, que defendeu a reforma perante a comissão parlamentar de Defesa Nacional como uma adaptação do que foi feito desde 1982 e que ajudará à "mudança de mentalidade".
Ouvidos os chefes militares, o texto final aprovado no parlamento contou apenas com ligeiras alterações, face à proposta original do Governo, que tentaram ir ao encontro, ainda que não na totalidade, de algumas das preocupações expressadas, como a clarificação da autonomia administrativa dos ramos.
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