"No meio de tanta qualidade com que nós nos deparamos com os outros projetos, é, de facto, um feito termos conseguido trazer este prémio para Portugal", disse à agência Lusa Gonçalo Folgado, da associação Locals, que promove o Food From The Block, um projeto que recupera a relação das pessoas com a comida.
O responsável sublinha ainda que esta vitória "é um sinal de que em Portugal há massa crítica para ombrear com todos os outros no globo. Esta é uma mensagem importante de passar, para valorizar a autoestima que os portugueses muitas vezes não têm sobre aquilo que é sua performance e as suas capacidades".
"Do ponto de vista da literacia alimentar, dá também um sinal claro de que há grupos e associações em Portugal -- nos finalistas estavam três projetos portugueses - bastante atentos, que têm iniciativa e querem fazerem parte da mudança", afirmou Gonçalo Folgado, considerando ainda que, com este projeto, se está a "aprofundar o exercício democrático".
"Não podemos reduzir a democracia participativa ao voto que expressamos nas urnas", acrescentou.
Gonçalo Folgado manifestou esperança em que o projeto seja "muito acarinhado pelo público", alegando que, "além de partir de uma vertente comunitária, é muito ancorado no seio da família".
"A reinterpretação dos próprios papéis dentro de casa, em que a cozinha pode passar a ser um 'playground' (pátio de recreio) onde a família está e convive e, no fundo, é um espaço de partilha, um momento de congregação entre todos. Acho que essa é também uma das partes mais bonitas deste projeto", considerou.
O Food From The Block, que vai receber um prémio que ronda os 87 mil euros, vai desenvolver-se em Lisboa, em três bairros 'bip-zip' (Zonas de Intervenção Prioritária), que são 67 territórios que concentram 25% da população da capital.
A intenção é trabalhar com a comunidade para que as pessoas encontrem um menu que reflita a história do lugar e, à volta desse menu, abrir o bairro para que outros se sentem à mesa e "provem o bairro".
Os promotores do projeto pretendem agora partir para o terreno, falar com as pessoas, "sem qualquer tipo de pretensão, para perceber em que lugar estão no que toca às questões alimentares e nutritivas", explicou Gonçalo Folgado, sublinhando a importância de ir para o terreno "sem ideias feitas".
"A base da nossa metodologia é partir do pressuposto de que são as pessoas que nos vão dizer o que precisam. Obviamente que temos um plano, com atividades e diversas iniciativas, mas o mais importante é o trabalho de campo de levantamento e auscultação, para perceber os desafios quotidianos destas pessoas e os podermos ajudar a fazer escolhas nutricionalmente mais interessantes", disse também Alice Artur, da organização Joy, um dos parceiros da Locals.
O Food from the Block incide sobre o bairro Dois de Maio (zona ocidental de Lisboa), um dos 'bip-zip' da freguesia de S. Vicente e em Marvila, onde a organização Locals já tem trabalho desenvolvido com diversos parceiros. Tudo será filmado, num projeto de 16 meses que dará origem a um documentário.
"Mais uma vez, aqui temos dois objetivos: o primeiro é que efetivamente as pessoas saibam o que está a acontecer, mas, mais do que isso, é podermos inspirar outras pessoas a fazerem coisas similares", disse Alice Artur, para quem as bases deste projeto "podem ser facilmente replicadas" noutros locais.
O registo do trabalho "é importante não só para dar a conhecer o que fizemos, para que se possa replicar, e para que as pessoas conheçam", acrescentou a responsável, sublinhando: "Muitas vezes há projetos incríveis que as pessoas nem sabem que estão a acontecer e que, com registo e comunicação, ganham outra dimensão e mais pessoas podem envolver-se e participar".