"Em boa hora as Forças Armadas, logo que tiveram conhecimento da denúncia, que foi no final de 2019, procederam à investigação imediatamente, envolvendo a Polícia Judiciária Militar, depois alargou-se à Polícia Judiciária, naturalmente, pelas implicações mais vastas do que o domínio nomeadamente das Forças Armadas", explicou Marcelo Rebelo de Sousa, questionado pela Lusa à margem de uma visita à Cidade Velha, Em Cabo Verde.
"E esse trabalho está em curso para se apurar o que é que aconteceu e para se tomar as medidas exemplares que devam ser tomadas. Quer dizer que foram as Forças Armadas as primeiras a perceberem que era preciso assumir essas responsabilidades. E isso só as prestigia, só aumenta o prestígio internacional que têm e que é reconhecido por toda a gente", acrescentou.
Segundo o Presidente da República, esse reconhecimento existe para com as forças nacionais destacadas na República Centro-Africana (RCA), mas também "nas que estão destacadas um pouco por todo o mundo".
"Tendo-se a noção exata de que, como em todas as sociedades, há casos isolados que devem ser punidas se for caso disso, mas a generalidade é um exemplo daquilo que é a qualidade, mais do que qualidade a excelência das nossas Forças Armadas", disse ainda o chefe de Estado.
Alguns militares portugueses em missões na República Centro-Africana podem ter sido utilizados como "correios no tráfego de diamantes, ouro e estupefacientes", revelou hoje o Estado-Maior-General das Forças Armadas, adiantando que o caso foi reportado em 2019.
Em comunicado, o Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA) revelou que "o que está em causa de momento é a possibilidade de alguns militares que participaram nas FND [Força Nacional Destacada], na RCA, terem sido utilizados como correios no tráfego de diamantes, ouro e estupefacientes" e que "estes produtos foram alegadamente transportados nas aeronaves de regresso das FND a território nacional".
Vários órgãos de comunicação social noticiaram hoje que a Polícia Judiciária estava a fazer buscas no Regimento de Comandos, e noutros cerca de 100 locais, por suspeitas de tráfico de diamantes e ouro em missões militares noutros países, como na República Centro-Africana (RCA).
De acordo com a nota do EMGFA, "em dezembro de 2019 foi reportado ao Comandante da 6ª Força Nacional Destacada (FND), na República Centro Africana (MINUSCA), o eventual envolvimento de militares portugueses no tráfico de diamantes".
"O comandante da FND relatou prontamente ao EMGFA a situação, tendo esta sido de imediato denunciada à Polícia Judiciária Militar (PJM) para investigação. A PJM fez a respetiva denúncia ao Ministério Público que nomeou como entidade responsável pela investigação a Polícia Judiciária", explicou.
Além da denúncia imediata, lê-se ainda na nota, o EMGFA "mandou reforçar os procedimentos de controlo e verificação à chegada dos militares das FND e respetivas cargas".
De acordo com o EMGFA, "os inquéritos militares e respetivas consequências estão pendentes das investigações em curso, com o cuidado de não interferir neste processo, ainda em segredo de justiça".
"Uma vez esclarecidas as responsabilidades, as Forças Armadas tomarão as devidas medidas sendo absolutamente intransigentes com desvios aos valores e ética militar. As Forças Armadas repudiam totalmente estes comportamentos contrários aos valores da Instituição Militar", sublinham.
Fonte ligada ao processo confirmou à Lusa que a operação está a decorrer em vários locais do país, entre os quais o regimento dos Comandos na Carregueira, Sintra, e que conta com cerca de 100 mandados de busca e detenção. Em causa estão suspeitas de tráfico de droga, ouro, diamantes e branqueamento de capitais.
Segundo a TVI, que avançou com a notícia da operação, os visados são militares, comandos e ex-comandos, militares da GNR e agentes da PSP que terão usado missões portuguesas da ONU, nomeadamente na República Centro Africana (RDA) para cometerem os crimes.
Atualmente, de acordo com dados disponibilizados pelo Estado-Maior-General das Forças Armadas na sua página oficial, estão empenhados na RCA 180 militares portugueses no âmbito da MINUSCA e 45 meios. Também na RCA, mas no âmbito da missão de treino da União Europeia (EUTM-RCA), estão atualmente empenhados 25 militares.
A MINUSCA tem como objetivos "apoiar a comunidade internacional na reforma do setor de segurança do Estado, contribuindo para a segurança e estabilização" da República Centro-Africana, informa ainda o EMGFA.
A RCA caiu no caos e na violência em 2013, depois do derrube do ex-Presidente François Bozizé por grupos armados juntos na Séléka, o que suscitou a oposição de outras milícias, agrupadas sob a designação anti-Balaka.
Desde então, o território centro-africano tem sido palco de confrontos comunitários entre estes grupos, que obrigaram quase um quarto dos 4,7 milhões de habitantes da RCA a abandonarem as suas casas.
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