Ministro demitiu-se. Eis os casos polémicos de Eduardo Cabrita

Eduardo Cabrita demitiu-se hoje do cargo de ministro da Administração Interna, seis meses depois do acidente mortal provocado pelo carro em que seguia, terminando um mandato marcado por várias polémicas que desgastaram a sua imagem.

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© Reuters

Lusa
03/12/2021 20:09 ‧ 03/12/2021 por Lusa

País

Eduardo Cabrita

O motorista de Eduardo Cabrita foi hoje acusado de um crime de homicídio por negligência no acidente de 18 de junho de 2021 em que foi atropelado na autoestrada A6 um trabalhador que fazia a manutenção da via na zona de Évora. A acusação pelo Ministério Público (MP) precipitou a demissão de Eduardo Cabrita, que já era pedida regularmente por várias forças políticas.

Após mais de cinco meses de silêncio quase total sobre o caso, Eduardo Cabrita deixou passar apenas algumas horas sobre a acusação do MP até à decisão de apresentar a demissão do cargo, hoje anunciada ao final da tarde numa declaração aos jornalistas sem lugar a perguntas.

A primeira polémica remonta ao verão de 2019 e ao caso das golas antifumo, um processo que ainda não está em concluído por parte do Ministério Pública e que investiga os negócios efetuados no âmbito do programa Aldeia Segura/Pessoas Seguras.

Este caso levou às demissões do adjunto do secretário de Estado da Proteção Civil, Francisco José Ferreira, e, mais tarde, do secretário de Estado da pasta, José Artur Neves, que foram constituído arguido no caso, como também o ex-presidente da Autoridade Nacional de emergência e Proteção Civil, Mourato Nunes.

Além deste processo que investigava suspeitas no âmbito de financiamentos da União Europeia para os Programas Aldeia Segura/Pessoas Seguras, descobriu-se também que as golas antifumo, distribuídas à população para se protegeram do fogo, eram afinal fabricadas com material inflamável.

A morte do cidadão ucraniano Ihor Homeniuk nas instalações do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) no aeroporto de Lisboa, em março de 2020, foi dos casos em que o nome do ministro da Administração Interna mais apareceu e mais danos provocou na sua imagem, apesar de Eduardo Cabrita ter garantido que agiu sempre dentro das suas competências.

Na altura Eduardo Cabrita afirmou estar de consciência tranquila em relação ao seu mandato e, perante os vários pedidos de demissão, sublinhou que a decisão de se afastar do Governo caberia ao primeiro-ministro.

Em 30 de março de 2020, o ministro da Administração Interna determinou à Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) a abertura de um inquérito à Direção de Fronteiras do SEF no aeroporto de Lisboa, designadamente ao funcionamento do Espaço Equiparado a Centro de Instalação Temporária (EECIT) daquele aeroporto, bem como a abertura de processos disciplinares ao diretor e subdiretor de Fronteiras de Lisboa, ao Coordenador do Espaço Equiparado a Centro de Instalação Temporária (EECIT) do aeroporto, bem como aos três inspetores.

No início de abril de 2020, Eduardo Cabrita disse no parlamento que houve "negligência grosseira e encobrimento gravíssimo" do SEF.

No final de setembro, a IGAI conclui o inquérito e instaurou mais oito processos disciplinares a elementos do SEF, além dos seis que já tinham sido instaurados pelo ministro.

O âmbito deste inquérito foi, entretanto, alargado devido a denúncias de alegada violência e maus-tratos nas instalações do SEF no aeroporto de Lisboa, não existindo ainda uma conclusão.

No programa de Governo estavam alterações no SEF, que passavam pela separação entre as funções policiais e as funções de autorização de documentação de imigrantes, mas foi depois da morte de Ihor Homeniuk que Eduardo Cabrita anunciou a reestruturação deste serviço.

Em dezembro, o Estado português anunciou o pagamento de uma indemnização de mais de 800 mil euros à família de Homeniuk.

Este caso levou à demissão da diretora nacional do SEF, Cristina Gatões, e os três inspetores envolvidos foram condenados a nove e sete anos de prisão, pelo crime de ofensa à integridade física grave qualificada, agravada pela morte.

Depois da proposta do Governo ter chegado ao parlamento, a extinção do SEF foi aprovada na Assembleia da República graças ao PS e BE e em decreto-lei de 12 de novembro ficou determinado que as atuais atribuições em matéria administrativa do SEF relativamente a cidadãos estrangeiros passariam a ser exercidas pela Agência Portuguesa para as Migrações e Asilo e pelo Instituto dos Registos e do Notariado, além de terem que ser transferidas as competências policiais para a PSP, GNR e Polícia Judiciária.

A extinção do SEF foi, entretanto, adiada por seis meses, para maio de 2022, com a aprovação Assembleia da República de um projeto de lei apresentado pelo PS que justificava o adiamento com a pandemia de covid-19.

No início de maio desde ano, um surto de covid-19 entre trabalhadores agrícolas migrantes no concelho de Odemira e as cercas sanitárias das freguesias de São Teotónio e Longueira-Almograve trouxeram para a ordem do dia as condições sub-humanas em que viviam esses trabalhadores e a existência até de tráfico de pessoas. A requisição civil decretada pelo Governo para realojar estes imigrantes no empreendimento turístico ZMar colocou novamente o nome de Eduardo Cabrita na ribalta e novos pedidos de demissão regressaram à praça pública.

CDS-PP, PSD, Chega e Iniciativa Liberal pediram a demissão de Cabrita, acusando-o de não saber gerir a situação dos imigrantes em Odemira.

A forma como decorreu o processo de transferência dos imigrantes para o ZMar, feito pela GNR de madrugada e com forte dispositivo policial, gerou também uma onda de críticas.

Outra polémica que envolveu Eduardo Cabrita e que levou a novas críticas à sua atuação foi gerada pelos festejos dos adeptos do Sporting pela conquista do título de campeão nacional, que não acontecia há 19 anos, em que milhares de pessoas estiveram nas ruas a comemorar e não foram cumpridas as regras de saúde pública devido à pandemia de covid-19.

Durante os festejos ocorreram confrontos entre os adeptos e a PSP e o Governo a anunciou a abertura de um inquérito à atuação da Polícia de Segurança Pública.

Apresentado 60 dias depois, um relatório da IGAI concluiu que "globalmente" a PSP "cumpriu a sua missão" durante os festejos do Sporting, mas também deu conta que o ministro validou os festejos do título de campeão, sem o parecer positivo da PSP e da Direção-Geral da Saúde.

Os resultados do inquérito motivaram mais críticas a Eduardo Cabrita, que ocultou este pormenor quando apresentou publicamente o relatório juntamente com a inspetora-geral Anabela Cabral Ferreira.

A forma como foi organizada a final da Liga dos Campeões de futebol, que decorreu no Porto, envolveu novamente o nome de Eduardo Cabrita em polémica, com o PSD, CDS e Chega a pediram novamente a demissão do ministro da Administração Interna, mais uma vez acusado de ter falhado no planeamento e organização.

Milhares de ingleses estiveram no Porto para assistir à final da Liga dos Campeões, num jogo com a presença de adeptos no estádio, e durante os últimos dias estiveram aglomerados no centro da cidade, a maioria sem cumprir as regras sanitárias ditadas pela pandemia de covid-19, como o uso de máscara, consumo de bebidas alcoólicas nas ruas e o distanciamento físico.

E nova polémica depois de a Altice ter ameaçado desligar o sistema de comunicações de emergência SIRESP por não ter recebido indicações do Governo sobre o que se iria passar depois de 30 de junho, data em que o Estado terminava o contrato com os operadores privados. Vários partidos criticaram a gestão feita por Eduardo Cabrita por não ter acautelado o futuro da rede de comunicações de emergência do Estado.

A Parceria Público Privada do SIRESP terminou a 30 de junho e em 01 de julho entraram em vigor novos contratos com três operadores privados para garantir o funcionamento do modelo transitório de gestão deste sistema de comunicações de emergência por um período de 18 meses.

Confrontado no parlamento com os episódios de "incompetência" de Eduardo Cabrita, o primeiro-ministro respondeu: "Quem me dera que o meu problema fosse o MAI. Tenho um excelente MAI".

António Costa disse hoje ter aceitado o pedido de demissão de Eduardo Cabrita do cargo de ministro da Administração Interna e que "nos próximos dias" indicará o nome do sucessor.

Leia Também: Cabrita alega no inquérito que não deu indicação sobre velocidade na A6

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