No seu discurso na cerimónia de posse do XXIIII Governo Constitucional, no Palácio Nacional da Ajuda, em Lisboa, Marcelo Rebelo de Sousa começou por falar da invasão russa da Ucrânia, iniciada em 24 de fevereiro, e alertou para o consequente aumento da "imprevisibilidade económica e financeira".
Referindo-se depois ao "novo ciclo" político interno, questionou "o que é que os portugueses esperam" dos autarcas, do Governo e do Presidente da República e deu a resposta.
Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, "como em todos os tempos de guerra", os portugueses esperam "segurança, estabilidade, unidade no essencial, concentração no decisivo, recusa de primazia de incertezas ou tensões secundárias".
Depois de listar os vários desafios deste novo Governo, o Presidente da República admitiu que "são muitas missões para tão pouco tempo e marcado por tantos difíceis embates".
"Não há lugar para "poder absoluto nem ditadura de maioria"
"Os portugueses proporcionaram condições excecionais para sem desculpas ou álibis para fazer o que tem de ser feito”, referiu Marcelo. No entanto, lembrou a Costa que "não lhe deram nem poder absoluto nem ditadura de maioria. E na maioria absoluta cabem todos os diálogos sociais". "Cabem todos os diálogos de interesse nacional: partidos, parceiros, setores sociais, económicos, culturais e políticos", acrescentou.
Avisou ainda Costa que será difícil a sua substituição a meio da legislatura, defendendo que os portugueses "deram a maioria absoluta a um partido, mas também a um homem".
"É o preço das grandes vitórias, inevitavelmente pessoais e intencionalmente personalizadas. E é sobretudo o respeito da vontade inequivocamente expressa pelos portugueses para uma legislatura", afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, na cerimónia de posse do XXIII Governo Constitucional, no Palácio Nacional da Ajuda, em Lisboa.
O chefe de Estado considerou que a maioria absoluta do PS nas eleições legislativas de 30 de janeiro proporciona ao novo executivo "condições excecionais para, sem desculpas ou álibis, poder fazer o que tem de ser feito", mas realçou que em democracia não há lugar para "poder absoluto nem ditadura de maioria".
Dirigindo-se diretamente a António Costa, o Presidente da República disse-lhe: "Deram a maioria absoluta a um partido, mas também a um homem, vossa excelência, senhor primeiro-ministro, um homem que, aliás, fez questão de personalizar o voto, ao falar de duas pessoas para a chefia do Governo".
"Agora que ganhou, e ganhou por quatro anos e meio, tenho a certeza de que vossa excelência sabe que não será politicamente fácil que esse rosto, essa cara que venceu de forma incontestável e notável as eleições possa ser substituída por outra a meio do caminho. Já não era fácil no dia 30 de janeiro, tornou-se ainda mais difícil depois do dia 24 de fevereiro", acrescentou, referindo-se à invasão russa da Ucrânia.
Alerta para "pandemia da inflação", pede reforma do SNS e melhor justiça
O chefe de Estado alertou ainda para o risco de se sair "da pandemia da saúde para a pandemia da inflação sem controlo" e pediu uma reforma do SNS e "passos mais vigorosos" para "melhor justiça".
É preciso "garantir que tudo o que seja possível se fará para ir protegendo os custos dos bens básicos, custos que a guerra agravou e a virtual guerra fria pode ainda agravar mais".
"Para que não saiamos da pandemia da saúde para a pandemia da inflação sem controlo, em clima de crescimento enfraquecido, estagnação com inflação ou estagflação, como se dizia, essa sombra dos anos 70 do século passado. Eis o que temos todos de evitar", afirmou.
"Tratar bem da pandemia da saúde implica reformar com brevidade e bem o Serviço Nacional de Saúde (SNS)", considerou.
Marcelo Rebelo de Sousa referiu que uma "melhor justiça" foi "prenunciada como meta prioritária na legislatura terminada", mas que se exige "passos mais vigorosos".
No que respeita ao sistema eleitoral, fez alusão ao voto dos emigrantes, defendendo que se deve assegurar que "todos, cá dentro e lá fora" se sintam "devidamente representados" e com "idênticas possibilidades" de exprimir as suas escolhas.
Solidário e vigilante sem esquecer "afirmação das oposições"
O Presidente da República prometeu hoje que será solidário e cooperante, mas ao mesmo tempo vigilante, procurando "estabilidade e compromissos" e também "espaços de pluralismo e de afirmação das oposições".
Sobre o seu papel no novo quadro político interno, com maioria absoluta do PS, afirmou: "Aqui estou, como estive durante estes seis anos, e estarei, na busca da estabilidade e de compromissos, mas também de espaços de pluralismo e de afirmação das oposições, e de cultura de democracia, de liberdade e de igualdade, ao serviço do interesse nacional".
"Na proximidade, na explicação, na audição dos portugueses, do mais jovem ao mais pobre ao mais idoso ou privilegiado, mas em especial dos que passam pelas suas vidas sem que ninguém cuide sequer de saber que existem. Na decisão mais ingrata ou arriscada, se necessário for, sem hesitações ou inibições, como aconteceu nas declarações e renovações do estado de emergência ou na convocação de eleições antecipadas", prosseguiu.
Marcelo acrescentou que será, "como sempre, institucionalmente solidário e cooperante, para mais estes quatro anos de aventura coletiva, construindo, não destruindo, unindo, não dividindo, vigiando distrações e adiamentos quanto ao essencial, autocontemplações, deslumbramentos" e "tentando evitá-los".
Dirigindo-se a Costa, o Presidente concluiu: "No fundo, fazendo exatamente aquilo que a Constituição prevê e que vossa excelência reconheceu em plena campanha eleitoral ser uma garantia decisiva contra os temores eventuais de que a maioria absoluta se convertesse no que não pode nem deve ser".
O chefe de Estado desejou ao primeiro-ministro e ao seu Governo, "neste momento tão difícil no mundo e na Europa todas as felicidades a que aspira e que os portugueses merecem".
O XXII Governo Constitucional, que tem como "número dois" a ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, inicia funções com um horizonte mais longo do que o habitual, uma legislatura até setembro ou outubro de 2026, por resultar de eleições legislativas antecipadas.
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