Em declarações esta tarde à agência Lusa, à margem de uma apresentação sobre um projeto na Área Metropolitana de Lisboa, Ana Abrunhosa não quis comentar diretamente a posição crítica que tem vindo a ser assumida pelo presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Moreira, relativamente ao processo de descentralização e à decisão de sair da ANMP, mas disse respeitá-la.
"Essa é uma decisão do senhor presidente da Câmara Municipal do Porto, que respeitamos naturalmente, e acreditamos que o senhor presidente, depois de negociarmos com a ANMP os valores para 2023, fará as contas", afirmou a governante.
Na segunda-feira, o autarca do Porto esteve reunido com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a quem frisou que a decisão de sair da ANMP "não foi uma atitude precipitada".
O autarca independente disse ainda que "não tem nada que negociar" a descentralização com o Governo ou com a Associação Nacional de Municípios e pediu a Marcelo Rebelo de Sousa para não promulgar o Orçamento do Estado para 2022 e para o devolver à Assembleia da República, de forma a que possa ser revista a rubrica da transferência de competências referente à Educação.
Na declaração feita esta tarde à Lusa, a ministra da Coesão reiterou que o interlocutor do Governo é a ANMP, situação que, segundo Ana Abrunhosa, consta da "lei-quadro da descentralização."
"Era impensável [negociar município a município]. A lei não o prevê, mas não era preciso estar escrito na lei. É uma questão de bom senso. Nós, na administração pública, quando negociamos salários negociamos com os representantes dos trabalhadores", argumentou.
Ainda neste âmbito, Ana Abrunhosa afirmou que não vive "obcecada com um ou outro município" e que trabalha a "pensar nos 308 municípios", manifestando confiança no trabalho desempenhado pela ANMP.
"O que eu sinto quando ando no território e os municípios têm oportunidade para expressar as suas preocupações é que elas já me foram transmitidas pela ANMP. Portanto, ela [ANMP) quando fala com o Governo nunca deixa de transmitir as preocupações e os problemas que os municípios sentem", argumentou.
Relativamente ao processo de descentralização, a ministra da Coesão lembrou que se trata de "um processo complexo" e que tem de ser feito com "racionalidade".
"Não podemos passar de 8 para 80 em meses, nem num ano, nem em dois, nem em três. Temos que ir por aproximações. Obviamente que as famílias saberem que, a partir de determinada altura, o seu interlocutor é o presidente de Câmara coloca mais pressão no processo, mas as famílias também entendem que não é pelas competências passarem a ser dos municípios que passamos a ter verbas ilimitadas onde antes elas eram limitadas", apontou.
Em matéria de Educação, Ana Abrunhosa indicou que o Governo está a negociar com a ANMP o "eventual reforço das despesas de manutenção" e está a "tentar corresponder ao esforço financeiro que os municípios estão a fazer nas refeições.
"O que acordarmos com a ANMP será depois aplicado aos diferentes municípios, nunca deixando de ter em conta as especificidades que um grande município tem face a um pequeno município, mas o pequeno também tem outras especificidades e particularidades. Nunca deixando de ter em conta a realidade de cada território", atestou.
A Assembleia Municipal do Porto aprovou no dia 30 de maio a saída da autarquia da ANMP, tendo o presidente da Câmara alegado que não se sentia em "condições" para passar "um cheque em branco" à Associação Nacional de Municípios Portugueses para negociar com o Governo a transferência de competências.
Segundo a Câmara do Porto, a autarquia vai receber seis vezes menos orçamento do que receberia a Parque Escolar para a manutenção da mesma área nas escolas.
O processo de transferência de competências em mais de 20 áreas da administração central para os municípios decorre desde 2019.
Entretanto, esta tarde o secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, considerou que o presidente da Câmara do Porto "tem razão" nas críticas sobre a transferência de competências para as autarquias e exortou o Governo a "desatar os cordões à bolsa" para resolver este diferendo.
Também hoje a ministra da Saúde, Marta Temido, assegurou que a transferência de competências na área da saúde para as autarquias não afetará a equidade no tratamento dos doentes e que o financiamento necessário será "inteiramente assegurado" pelo Estado.
Por seu lado, a comissão parlamentar que acompanha o poder local aprovou um requerimento do PCP para a audição com caráter urgente da ministra Ana Abrunhosa sobre a transferência de competências para as autarquias.
O requerimento do PCP surge na sequência da contestação de municípios às verbas atribuídas às competências que estão em processo de descentralização da administração central para as câmaras e que têm considerado insuficientes, sobretudo nas áreas da Educação, Saúde e Ação Social.
Outros municípios, como Trofa (PSD-CDS/PP), Póvoa do Varzim (PSD), Vale de Cambra (CDS-PP), Pinhel (PSD) e Coimbra (coligação liderada pelo PSD) ameaçam também abandonar ou discutir a saída da ANMP, invocando os mesmos motivos.
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