O diploma em causa, que resulta de um projeto-lei do BE aprovado em maio de 2021 apesar do voto contra do PS, que não tinha ainda maioria absoluta na Assembleia da República (AR), previa a abertura de um processo negocial com as estruturas sindicais com vista à revisão do regime de recrutamento e mobilidade do pessoal docente dos ensinos básico e secundário.
No entanto, o Governo veio questionar a constitucionalidade do diploma e, em agosto, requereu ao Tribunal Constitucional (TC) a fiscalização sucessiva da constitucionalidade da lei, por entender que o parlamento tinha extravasado as suas competências ao definir, por exemplo, um calendário e um ritmo de negociação.
Na altura, o primeiro-ministro, António Costa, justificou a decisão afirmando que não é saudável para as instituições "transferir para a Assembleia da República competências que são próprias do Governo"
Num acórdão divulgado hoje, o TC dá razão ao executivo ao declarar o diploma inconstitucional, por considerar que viola a "separação organizatória entre diferentes poderes ou órgãos de soberania do Estado", designadamente "uma compressão intolerável da liberdade ou autonomia do Governo por parte da AR", refere o comunicado.
A decisão do Tribunal é conhecida, no entanto, numa altura em que o Ministério da Educação e os sindicatos do setor já iniciaram um processo negocial para a revisão do regime de recrutamento, com uma primeira reunião em setembro e a segunda agendada para o final do mês.
O TC avaliou também, a pedido do Governo, uma outra Lei aprovada na mesma altura pelo parlamento com vista à abertura de um concurso de vinculação extraordinária de docentes das componentes técnico-artísticas do ensino artístico especializado para o exercício de funções nas áreas das artes visuais e dos audiovisuais, nos estabelecimentos públicos de ensino.
Sobre esse diploma, o Tribunal declarou inconstitucional apenas o artigo que obrigava o Governo a abrir, até ao final do ano letivo de 2020/2021, um processo negocial para a aprovação de um regime específico de seleção e recrutamento dos docentes daquelas áreas, apresentando o mesmo argumento.
"A decisão sobre o se e o quando da iniciativa de desencadear negociações com vista à alteração do ordenamento jurídico (...) é uma opção política que um órgão de soberania não pode impor a outro", refere o TC.
Quanto ao artigo que previa a abertura de um concurso para a vinculação extraordinária dos professores no prazo de 30 dias após a publicação da lei em 13 de julho do ano passado, o TC considerou que não viola o princípio da separação de poderes.
"Ainda que se reconheça a existência de uma injunção da AR ao Governo para abrir o concurso, este concurso não é aberto pela norma em questão, sendo perfeitamente legítima a intervenção da AR a qual não constitui, desta forma, uma invasão de competências constitucionalmente reservadas ao Governo", lê-se no comunicado.
A propósito dos professores do ensino artístico especializado, o ministro da Educação anunciou, na sexta-feira, que o Governo está a preparar a possibilidade de vincular na carreira docente os técnicos especializados das escolas artísticas António Arroio, em Lisboa, e Soares dos Reis, no Porto.
Durante um debate parlamentar sobre política setorial, João Costa explicou que o objetivo é "finalmente regularizar a situação" dos profissionais que dão aulas naquelas escolas, mas não estão integrados na carreira docente, sendo considerados técnicos especializados.
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