Por esta e outras razões, expostas na conferência internacional "O Oficial de Justiça no Sistema Judiciário", em Lisboa, Luis Azevedo Mendes defendeu "que representantes dos oficiais de justiça deverão voltar a ter assento no CSM como membros natos", justificando que esse é "o desenho afirmado na Constituição".
"O Estatuto dos Oficiais de Justiça é, na verdade, um eixo nuclear da orgânica do poder judicial. Daí que tenha sido uma má surpresa para o CSM quando o projeto do Governo [sobre o estatuto] foi divulgado sem alguma audição prévia do CSM e com o insólito conteúdo que apresentou", disse Luís Azevedo Mendes na abertura da conferência promovida pelo Sindicato dos Oficiais de Justiça (SOJ).
Contestando o projeto governamental, o juiz conselheiro recordou que, ao ter conhecimento do teor da proposta, o plenário do CSM "votou por unanimidade (...) um parecer que é de rejeição e de fortes críticas" ao diploma do Ministério da Justiça.
Nas suas palavras, o projeto "não só desconsiderou a correta leitura reiteradamente afirmada pelo Tribunal Constitucional, como evidenciou um desconhecimento profundo sobre a estrutura de governação autónoma dos tribunais, confundindo-os com vulgares estruturas da administração pública".
"Os oficiais de justiça não integram substantivamente a administração pública que depende do Governo. Integram antes, na raiz e no que diz respeito aos tribunais judiciais, a macro administração judiciária encabeçada pelo CSM e pelos vários presidentes dos tribunais. E isto mesmo não poderia ter sido desconsiderado pelo Governo no seu projeto, como veio a acontecer", criticou Luís Azevedo Mendes.
Clarificou que estas críticas ao poder executivo "radicam acima de tudo na leitura constitucional da organização do poder judicial independente e separado".
Na sua perspetiva, deve existir um relacionamento "estreito, próximo, assíduo, fácil" entre o CSM e os porta-vozes dos oficiais de justiça, ou seja com as respetivas estruturas sindicais, pelo que é altura "de mudar e construir uma nova via de comunicação".
O juiz conselheiro reiterou que as condições para o trabalho de qualidade nos tribunais dependem totalmente das suas estruturas de apoio e, em primeira linha, dos oficiais de justiça que as integram, destacando: "Sem oficiais de justiça com a capacidade técnica e a cultura de serviço que os oficiais de justiça têm, integrados em secretarias devidamente organizadas do ponto de vista funcional e com as corretas cadeias de orientação hierárquica, não é possível construir qualidade".
Foi por isso com "enorme estupefação e desconforto que foi recebido o projeto governamental", nomeadamente quando propõe que os oficiais de justiça fiquem sujeitos ao sistema integrado de gestão e avaliação do desempenho na Administração Pública, "remetendo o Conselho dos Oficiais de Justiça para uma mera supervisão dessa avaliação e afastando o CSM do poder de avocação na matéria de avaliação do mérito, mantendo-o apenas em matéria disciplinar".
"Independentemente dos assuntos de maior detalhe, reconhecidamente da maior importância, relativos à configuração das carreiras, à adequada compensação do trabalho profissional e à organização das secretarias, é necessário tornar claro e inequívoco o lugar do oficial de justiça no sistema do poder judicial separado", concluiu o juiz.
Na abertura dos trabalhos interveio também o presidente do SOJ, Carlos Almeida, que criticou a política do Ministério da Justiça e o "esbulho" a que os oficiais de justiça "têm sido sujeitos", defendendo que "não é necessário um estatuto novo, mas antes atualizá-lo", reforçando as competências e funções destes profissionais e valorizando as suas carreiras.
Criticou ainda a "desjudicialização do estatuto" pretendida pelo Governo e alertou para a falta de meios e de condições nos tribunais, fatores que contribuem para a dificuldade de recrutamento de candidatos para os concursos de ingresso na profissão.
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