Depois de perceber as causas que levaram os médicos a tomar esta decisão, a Ordem dos Médicos vai estabelecer um plano para entregar à tutela, avançou Carlos Cortes, no dia em que foi divulgado um estudo sobre o ‘burnout’ nos jovens médicos.
O objetivo é corrigir, com a ajuda do Ministério da Saúde, as deficiências nesta área, “para que não volte a acontecer aquilo que tem acontecido, cada vez em maior dimensão no Serviço Nacional de Saúde, que é os médicos nem sequer escolherem as vagas que estão disponíveis” e que são de “especialidades muito procuradas”.
O estudo realizado pelo Conselho Nacional do Médico Interno (CNMI), entre agosto e setembro de 2023, revela que 55,3% dos internos inquiridos está em risco de desenvolvimento de ‘burnout’ e quase 25% já apresenta sintomas graves da síndrome.
Carlos Cortes manifestou preocupação com estes dados e referiu que a Ordem está preocupada com a situação da formação médica, nomeadamente com as 406 vagas que ficaram por ocupar no procedimento concursal de ingresso no Internato Médico 2023.
No seu entender, esta situação mostra que há um problema: “Os médicos não se sentem atraídos pelo Serviço Nacional de Saúde, que não lhes dá condições adequadas não só para tratar os seus doentes, mas também condições adequadas de formação”.
Para compreender o problema, a Ordem está a desenvolver “uma série de iniciativas”, entre as quais o estudo “Avaliação do ‘burnout’ no internato médico português” que mostra que os internos têm uma prevalência de ‘burnout’ grave (24,7%) mais de três vezes superior aos restantes médicos (7%).
“Muitas vezes os médicos internos são usados para tapar buracos em escalas”, lamentou o bastonário, apelando ao Ministério da Saúde e à Direção Executiva do SNS para darem “melhores condições de formação para os médicos”, garantindo, por exemplo, um tempo protegido tanto para os orientadores de formação como para os médicos internos.
Defendeu também a possibilidade de desenvolvimento de programas de investigação, “que são muito importantes e ajudam ao desenvolvimento do SNS”, e dar condições para que os internos possam participar em cursos, apresentar trabalhos em congresso, o que tem sido “cada vez mais dificultado, até pelos vencimentos que os jovens médicos recebem”, uma vez que “um congresso normalmente é muito caro”.
“Devia haver uma maior atenção do SNS, do Ministério da Saúde, para esta questão da formação médica e, nomeadamente, para dar condições para os médicos internos se sentirem mais realizados, mais integrados e sentirem que efetivamente têm apoio numa área que é muito sensível não só para eles, mas também para o país e para a qualidade dos cuidados de saúde”, destacou Carlos Cortes.
O presidente do CNMI, José Durão, disse que "assusta a aparente falta de vontade institucional, política para tentar agir e para inverter esta situação”.
“Falta aqui muito apoio. Não só apoio às pessoas que já estão nesta situação de 'burnout' ou perto dela, porque também temos 55% em risco de entrar em 'burnout' severo, mas também agir para que as pessoas não cheguem a esse ponto”, salientou.
José Durão defendeu que um interno deve ter “um equilíbrio entre as exigências laborais e as exigências formativas”, com um “período protegido” para o estudo autónomo nas 40 horas semanais que têm de fazer.
“Neste momento, é obrigado a fazê-lo nos tempos livres, nos fins de semana, nas férias, nas folgas, etc., o que agrava imenso este estado de 'burnout' em que a pessoa já não faz as 40 horas laborais, faz 50 ou 60 ou 70 e em cima disso vai fazer horas extras para a sua formação", lamentou.
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