"É preciso, mesmo, que se puna estas atuações, e se puna com as agravações ligadas ao ódio xenófobo, se foi mesmo esse o caso", afirmou à Lusa a docente da Lisbon Public Law (Centro de Investigação em Direito Público da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa) e especialista em migrações.
Segundo a investigadora "é diferente punir um comportamento apenas e punir o comportamento especialmente levado a cabo com uma intenção censurável", porque "só assim se passa a mensagem de que os mesmos não são tolerados numa sociedade democrática que não se revê nesses valores".
Para a jurista, "o problema foi também ter-se evitado falar de imigração no país durante tanto tempo, impondo-se um discurso único", porque a "integração também depende da sociedade de acolhimento, de a preparar".
Hoje, em Portugal, "já não é preciso ter vergonha, agora já se pode falar e ser xenófobo publicamente, pelo que se entra na normalização" do discurso.
Ana Rita Gil criticou as declarações da procuradora-geral da República que, na segunda-feira, admitiu uma "maior apreensão" face "ao crescente ingresso em território nacional de jovens não acompanhados das respetivas famílias", que estão "desenraizados, indocumentados, de distintas origens e proveniências".
"Vejo a normalização, ao mais alto nível, de discursos simplistas que fazem ligação perigosa entre imigração e criminalidade", disse a investigadora, classificando a declaração de Lucília Gago como "particularmente grave vindo da mais alta responsável pela magistratura responsável pela investigação de crimes em Portugal".
Na madrugada de sexta-feira, ocorreram três ataques e agressões a imigrantes na zona do Campo 24 de Agosto, na rua do Bonfim e na rua Fernandes Tomás, no Porto.
A investigadora considera que estes crimes "poderão ter, como causa incentivadora, o aumento do discurso de extrema-direita em Portugal.
No seu entender, "o debate sobre a imigração nunca foi feito por pessoas moderadas, e, mais uma vez, quem tomou conta disto foi o populismo extremista, que encerra sempre uma mensagem de violência sub-reptícia", pelo que o que, "dantes estava escondido nas desconfianças primárias das pessoas, vem agora ao de cima porque esses receios começam a ter validação no espaço público".
Em resposta à Lusa, o gabinete do Secretário de Estado Adjunto da Presidência referiu que o Governo prepara uma reforma no setor.
"Depois de reunir com algumas entidades, o senhor ministro da Presidência apresentará ao Conselho de Ministros um plano de ação para as migrações, que resolva a herança pesada da 'inépcia política passada' e assegure um sistema que conjugue controlo efetivo com integração digna e humanista", referiu a tutela, confirmando que essas "reuniões têm vindo a ser realizadas".
Segundo a PSP, os ataques foram feitos por vários grupos, tendo cinco imigrantes sido encaminhados para o hospital devido aos ferimentos.
Na sequência das agressões, seis homens foram identificados e um foi detido por posse ilegal de arma.
Face à suspeita de existência de crime de ódio, o caso passou a ser investigado pela Polícia Judiciaria.
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