OA estima adesão a protesto sobre defesas oficiosas acima de 80%
A Ordem dos Advogados estima que a adesão ao protesto sobre defesas oficiosas que se inicia em setembro supere os 80%, mas o Ministério da Justiça sublinha que os tribunais têm alternativas para contornar um protesto "despropositado e incompreensível".
© Pedro Correia/Global Imagens
País Advogados
As listas de advogados inscritos no Sistema de Acesso ao Direito e aos Tribunais (SADT), as chamadas defesas oficiosas, podem ter uma quebra entre 80% a 85% em setembro, segundo a bastonária da Ordem dos Advogados (OA), Fernanda de Almeida Pinheiro, que em declarações à Lusa na quinta-feira dizia que nesse dia a adesão ao protesto ainda rondava os 90%, mas que habitualmente os advogados deixam a inscrição para os últimos dias.
Se a adesão se fixar em pelo menos 80%, isso significa, segundo os números da OA, que estarão disponíveis para serem chamados pelos tribunais cerca de 1.800 advogados, contra os cerca de 9.000 que habitualmente se inscrevem.
"Mesmo que essa adesão fique na casa dos 80% ou 85% será um protesto muito significativo por parte da classe, que está a enviar um sinal claro ao Governo que não aceita continuar a trabalhar por estes valores", defendeu a bastonária, que considera que os valores, que não são revistos há quase 20 anos, estão "muitíssimo desfasados da realidade atual".
Por exemplo, o valor de referência unitário para pagamento da tabela está fixado em 26,73 euros, sendo este o valor que um advogado recebe por uma consulta jurídica, "antes de impostos", sublinhou a bastonária.
Fernanda de Almeida Pinheiro exemplificou que, no caso de um processo penal em tribunal singular, um advogado recebe oito unidades de referência por todo o processo, ou seja, 213,84 euros, independentemente da duração do caso, do total de diligências realizadas e só após o trânsito em julgado da sentença, o que significa que o advogado pode esperar anos para receber os seus honorários, o que exclui despesas com deslocações.
"O advogado, quando faz contas no final do processo, muitas vezes o que acontece é que está a pagar para trabalhar e, portanto, isto não é digno", defendeu a bastonária.
A negociação da revisão da tabela iniciou-se ainda com o anterior Governo e "o trabalho já estava muito adiantado", frisou a bastonária, que critica o novo executivo por ter proposto nas últimas reuniões com a OA mais um grupo de trabalho para analisar uma matéria que foi acompanhada por serviços e pessoal técnico que transitou e conhece o 'dossier'.
"O que nós propusemos foi um aumento de cerca de 20%, na casa de 1% ao ano [do total de anos em que não houve atualizações]. Foi o que propusemos para começarmos a falar, agora estamos a aguardar a contraproposta, que é o que estamos à espera desde maio, uma contraproposta para podermos negociar a revisão e atualização da tabela", disse.
A OA quer um acréscimo de 20 milhões no próximo Orçamento do Estado para as defesas oficiosas e "um sinal claro" do Governo de que a revisão da tabela "não é para continuar a protelar", considerando um mau sinal que a próxima reunião tenha ficado agendada para 09 de outubro, véspera da entrega do orçamento no parlamento.
"Se o Ministério da Justiça (MJ) não demonstra vontade expressa em manter e tornar esta negociação efetiva e digna, naturalmente que os protestos poderão e deverão continuar", garantiu a bastonária.
No entanto, o MJ defende a sua condução deste 'dossier', afirmando que "está a prestar atenção a este tema desde o início, mas está a fazer o seu trabalho de casa" e que "quando tiver chegado a uma conclusão certamente informará os interessados e a opinião pública".
"O MJ considera que este protesto vem a 'destempo', porque está em marcha um plano de trabalhos com uma calendarização precisa, para que até ao final de setembro o MJ possa apresentar uma proposta de revisão dos honorários dos advogados oficiosos. Desse plano de trabalhos foi informada a OA que será chamada no início de outubro para ser informada dessa proposta", afirmou o ministério.
"Em nenhum momento o Governo desistiu de cumprir o que está no Programa do Governo sobre a revisão desta matéria. É justo reconhecer que quando, num espaço muito curto de tempo, o MJ está a fazer o trabalho que não foi feito em 20 anos, a convocatória para um protesto deste tipo parece despropositada e incompreensível aos olhos dos cidadãos", acrescentou a tutela na resposta enviada à Lusa.
O MJ sublinha ainda que os tribunais têm alternativas para responder a eventuais escalas de prevenção vazias, como a nomeação direta de qualquer "advogado presente ou contactável".
E se é certo que o advogado nomeado pode ser dispensado do patrocínio se alegar causa que o tribunal julgue justa, enquanto não for substituído, e embora possa ser nomeado apenas para ato, mantém-se para os atos subsequentes do processo e é remunerado pela atividade", acrescenta a MJ.
A OA acredita que "durante o mês de setembro as coisas podem complicar-se", com muitas diligências a serem adiadas, rejeitando disponibilidade para ajudar os tribunais a encontrar um advogado disponível como habitualmente, em solidariedade com o protesto convocado.
A Ordem rejeita que possam estar em causa direitos e garantias de arguidos, sublinhando que terão sempre direito a defesa, ainda que a diligência tenha que ser reagendada, e que em caso de incumprimento de prazos para interrogatórios judiciais, levando à libertação de arguidos detidos, isso é algo que "acontece todos os dias nos tribunais" devido a situações como greves de funcionários judiciais, frisou a bastonária.
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