"O arguido é o único responsável pela prática do crime e agiu com elevado grau de culpa e ilicitude", lê-se no acórdão, proferido na semana passada e que ainda não transitou em julgado.
O coletivo de juízes deu como "provada" a acusação de burla qualificada deduzida pelo Ministério Público contra Paulo Saraiva e a sociedade de advogados, de que é sócio maioritário.
O advogado foi condenado como "autor material de um crime de burla qualificada na pena de quatro anos de prisão suspensa na sua execução pelo mesmo período e subordinada à condição de o condenado pagar" a indemnização de 77.240 euros, o "valor do prejuízo causado" à empresa lesada, acrescido de juros.
Durante esse período, deverá pagar esse montante em prestações semestrais de, pelo menos, 9.655 euros.
Já a sociedade de advogados foi condenada pelo mesmo crime a pagar uma multa de 54 mil euros.
O tribunal deu como provado que um grupo económico ligado ao setor da construção civil atravessava dificuldades de tesouraria e necessitava de 30 a 40 milhões de euros de liquidez, sem que existisse disponibilidade dos bancos para o financiamento.
Nesse contexto, em julho de 2018, o administrador do grupo contactou o advogado que lhe foi indicado por "gerir interesses/fortunas de grandes investidores".
Durante as negociações, que se prolongaram por cinco meses, o advogado disse ter investidores interessados, e que o financiamento estava assegurado, e foi prometendo encontros e a assinatura de contratos entre investidores e credores que nunca se concretizaram.
A título de honorários pela intermediação do negócio, durante esse período, o advogado cobrou à empresa diferentes montantes que atingiram 77.240 euros.
"Não obstante o prometido, o arguido foi adiando, sucessivamente, quer a assinatura dos contratos, quer a disponibilização das verbas", é referido no acórdão.
A empresa "sentiu-se enganada em todo este procedimento" pelo advogado e, em meados de novembro desse ano, solicitou a devolução do dinheiro que pagou, o que o arguido recusou, "situação que se mantém" à data do acórdão.
O coletivo de juízes concluiu que "o arguido, num plano previamente definido, intencionalmente induziu o assistente em erro sobre a existência dos ditos clientes com intenção de investirem cem milhões de euros, com o objetivo de obter dinheiro sem a intenção de fornecer qualquer contrapartida equivalente".
Este comportamento, é acrescentado, "revela um propósito claro de enriquecimento ilícito desde o início da relação com o assistente".
O advogado está também a ser investigado por outros crimes de burla qualificada alegadamente praticados a clientes particulares, existindo vários inquéritos em segredo de justiça na Comarca Lisboa Norte, confirmou à Lusa o Ministério Público.
Clientes lesados e os seus advogados contaram à Lusa que o defensor ter-se-á apropriado de elevadas quantias de dinheiro que pedia aos clientes, no âmbito de processos judiciais ou de penhoras que acompanhava em sua representação, sem chegar a dar andamento aos processos ou devolver os montantes.
Questionada pela Lusa, a Ordem dos Advogados confirmou ter recebido "mais do que uma" queixa contra o advogado, tendo em curso "procedimentos" com vista a instaurar um inquérito disciplinar.
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