Após ter votado a favor da proposta de retirada de confiança a Joacine Katar Moreira na Assembleia do Livre, apoiando o adiamento da decisão no Congresso do Livre, Rui Tavares admitiu, em entrevista ao Diário de Notícias e à TSF, divulgada esta terça-feira, que o partido que fundara nunca tinha enfrentado "um problema destes" e confirma que o futuro político da atual deputada única não continuará a passar pelo Livre.
"O partido demorou seis anos a chegar à Assembleia da República, mas o Livre tem representantes, nas juntas de freguesia, em assembleias municipais, que também votam votos sobre a Palestina e sobre outros assuntos. Nunca houve um problema destes. Quando essas questões se tornam um problema, não é certamente porque alguém chegou atrasado a uma reunião ou foi mais intempestivo, ou se irritou...", começou por afirmar fazendo alusão aos vários episódicos polémicos que tem vindo a público nos últimos meses sobre Joacine.
Recordando que em novembro, quando decorreu a assembleia do partido, foi reforçado que "os compromissos para se exercer o mandato em nome do Livre" são a necessidade de "exigência na atitude, na postura, na responsabilidade, na forma de responder às perguntas dos eleitores, dos jornalistas e dos próprios camaradas de partido", o fundador da estrutura partidária nascida em 2013 apontou que "quando não se cumpre o que está nessa resolução, é a própria pessoa que está a prescindir da confiança que nela foi depositada".
Denotando que a quebra de confiança entre o partido e Joacine foi uma consequência das ações da parlamentar, Rui Tavares esclareceu: "Acho que há compromissos que lamentavelmente não estão a ser seguidos, e reiteradamente não estão a ser seguidos".
Contudo, o historiador reforçou que a deputada única do Livre tem sofrido bastante "pressão" para além da habitual que vem com o cargo de parlamentar, sobretudo, devido a "um discurso de ódio racista" de que foi alvo e que "foi absolutamente violento".
"Sempre nos solidarizámos com a Joacine, cheguei a ir a uma manifestação, correndo até riscos e críticas, tivemos solidariedade. Compreendemos, e continuamos sempre a compreender, que esse discurso de ódio pode criar reações que não sejam aquelas que eu ou vocês teríamos. Mas compreendendo isso tudo, chega a um ponto em que se não são cumpridos os compromissos com o partido, o partido tem de dizer que não há confiança", sustentou.
Senti a vergonha alheia dos outros. Senti que as pessoas que estavam a ver aquilo estavam incomodadas e incomodadas connosco, com o Livre, comigo também (...) é duro quando se fez um partidoSobre se Rui Tavares iria manter a sua posição sobre a retirada de confiança de Joacine, o professor universitário não deixou dúvidas. "Esta não é uma situação de cedências de parte a parte, nem do ponto de vista dos factos nem do ponto de vista político".
"Concordo com o grupo de contacto, porque as cedências de parte a parte significam em geral que há erros dos dois lados. Isso significaria que chamar mentirosa à assembleia, um órgão do partido, fazê-lo em público, e daquela maneira e com aquela agressividade, seria equivalente a qualquer um de nós, eu, que faço parte da assembleia e que, portanto, também fui chamado mentiroso", argumentou.
Rui Tavares ainda lamentou a atitude de Joacine no discurso em que a deputada se exaltou dizendo "é mentira, é mentira!".
"Senti a vergonha alheia dos outros. Senti que as pessoas que estavam a ver aquilo estavam incomodadas e incomodadas connosco, com o Livre, comigo também (...) é duro quando se fez um partido", confessou.
Garantindo que ninguém no partido, incluindo Joacine, "esperava nem pensava que era assim que as coisas iam correr", o fundador do partido deixou críticas à deputada sobre o seu comportamento pós-eleitoral.
"Há um erro de comportamento pós-eleitoral por parte da Joacine, de atitude em relação aos eleitores, de atitude em relação ao partido, e essa atitude também conta porque ela também é política. Tudo é política. Uma atitude de um partido libertário, da esquerda libertária, não pode ser uma atitude autoritária. A atitude de um partido antipopulista não pode ser uma atitude populista", apontou.
Sobre o futuro e as possíveis consequências que esta crise pode representar para o partido, Rui Tavares garantiu que não acredita que hajam danos irreversíveis confiando que irá eleger mais deputados após estas legislatura.
Nos próximos dias, num momento difícil para o partido, Rui Tavares vai ser obrigado a afastar-se para dar aulas na Universidade de Massachusetts e participar em atividades do Centro de Estudos Europeus da Universidade de Harvard neste semestre. Ainda assim, o fundador do partido da papoila promete continuar a trabalhar remotamente e acompanhar o desenrolar dos próximos eventos do Livre.