As reações políticas às ameaças racistas (Governo ofereceu proteção)

Da esquerda à direita, as ameaças a uma dezena de deputadas e ativistas não passaram indiferentes. Entretanto, o Governo terá oferecido proteção policial às três parlamentares ameaçadas: Joacine Katar Moreira - não inscrita -, Mariana Mortágua e Beatriz Gomes Dias, ambas do Bloco de Esquerda.

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Mafalda Tello Silva
14/08/2020 09:34 ‧ 14/08/2020 por Mafalda Tello Silva

Política

Racismo

Dez cidadãos portugueses foram ameaçados, na passada terça-feira, por um grupo da extrema-direita. Os alvos foram três deputadas da Assembleia da República - Beatriz Dias e Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, e a parlamentar não inscrita (ex-Livre) Joacine Katar Moreira - e sete ativistas, incluindo o dirigente da SOS Racismo, Mamadou Ba. 

Em causa, está um email enviado aos visados que estipula o prazo de 48 horas para estas abandonarem o país e os cargos que desempenham. Caso não cumprissem o exigido, passariam a correr risco de vida, a par dos seus familiares.

A mensagem foi enviada a partir de um endereço criado num site de e-mails temporários e é assinada por 'Nova Ordem de Avis - Resistência Nacional', a mesma designação de um grupo que reclamou, no Facebook, ter realizado, de cara tapada e tochas, uma "vigília em honra das forças de segurança" em frente às instalações da SOS Racismo, em Lisboa.

Entretanto, o Ministério Público confirmou, ontem, que abriu um inquérito às ameaças racistas e, segundo é avançado hoje pelo jornal Público, o Executivo já terá também contactado as três deputadas, oferecendo-lhes protecção policial especial. O secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro, terá sido o "intermediário" da oferta.

Após o conhecimento público do email, vários foram os políticos e partidos que repudiaram a situação. 

Do lado da família socialista, a vice-presidente da bancada parlamentar do PS, Constança Urbano de Sousa, considerou "intoleráveis" as ameaças de que foram alvo os 10 cidadãos e defendeu a necessidade de "aplicar com determinação" as leis existentes. "As autoridades competentes têm que os investigar com celeridade, eficácia, de forma a também ter aqui uma atitude preventiva porque são situações que não se podem tolerar", asseverou a deputada em declarações à Lusa. 

O presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, também socialista, repudiou as ameaças por parte de um "grupúsculo de extrema-direita", condenando os "atos racistas e fomentadores do ódio" e a tentativa de intimidação.

Do lado do partido 'laranja', Luís Newton, presidente do PSD Lisboa, defendeu que atos de racismo "são intoleráveis seja contra quem forem praticados". Em comunicado, o social-democrata condenou também o "radicalismo" e o facto de estar a surgir "cada vez mais discursos populistas e extremistas que produzem ódios e divisões de parte a parte". "E não o afirmo porque deputados foram alvo de ameaças. Afirmo-o porque tais atos são intoleráveis seja contra quem forem praticados e estão infelizmente a caminho da normalização. Não o podemos permitir", denotou ainda. 

Ainda no PSD, André Coelho Lima, deputado e vice-presidente do partido, já tinha condenado a manifestação levada a cabo pelo mesmo grupo que enviou o referido email, em frente à sede da associação SOS Racismo, no sábado. "Mas o que vem a ser isto!? Porventura Portugal agora é um país intolerante a outras raças? Após séculos de História a demonstrar o contrário?", atirou, numa publicação divulgada na sua página oficial de Twitter. 

À direita, o líder do CDS-PP também condenou qualquer tipo de ameaça de caráter racista, mas considerou que o discurso de extrema-direita é alimentado pelos movimentos de extrema-esquerda e criticou a "normalização" de "discursos bárbaros" por "alguns partidos". "Os últimos tempos alguns partidos têm infelizmente insistido em normalizar e acomodar discursos bárbaros e investido numa guerrilha extremista no seio da nossa vida plítica e comunitária. O resultado está à vista", criticou Francisco Rodrigues dos Santos, numa nota enviada às redações e publicada nas redes sociais.

Já João Cotrim Figueiredo, dirigente e deputado único da Iniciativa Liberal, recorreu às redes sociais para condenar os atos racistas: "Quem usa o racismo, o colectivismo mais primário, como causa identitária para dividir a sociedade terá sempre o nosso maior repúdio. Nada é mais contrário ao Liberalismo".

Apesar de não ter condenado os atos racistas, o líder do Chega afirmou que todas as ameaças a deputados ou a outros políticos "merecem a mais viva reprovação" do partido. Ainda assim, André Ventura acusou a "extrema-esquerda" de criar o "fantasma do racismo", mas garantiu que não teve qualquer implicação nos eventos em causa. "Nem o Chega nem eu próprio temos nada a ver, obviamente, com ameaças feitas a deputadas ou a ativistas. Eu combato a extrema-esquerda no parlamento e na rua, não com ameaças", disse em declarações à agência Lusa.

Já à esquerda, o Livre defendeu que deveria ser "veementemente condenada" qualquer tentativa de "silenciar ou intimidar ativistas, políticos ou qualquer outra pessoa". Por seu turno, o PCP exigiu uma "intervenção determinada e firme de combate à intolerância" levada a cabo por "forças reacionárias e populistas". E o PAN repudiou as ameaças e a manifestação "tipo 'ku klux klan'", pedindo punição "exemplar" para "crimes de ódio".

O Bloco de Esquerda tem optado pelo silêncio, tendo as duas deputadas do partido visadas pelas ameaças apresentado queixa na Polícia Judiciária.

Marcelo pede "tolerância zero" e Governo vê ameaça "à própria democracia"

Tanto o Presidente da República como o Governo reagiram, ontem, às ameaças racistas. Em declarações aos jornalistas Marcelo Rebelo de Sousa considerou que os "democratas devem ser firmes nos seus princípios", o que significa uma "tolerânica zero em relação àquilo que é condenado pela Constituição". Para o chefe de Estado, a sensatez é outra qualidade que deve ser aplicada nesta situação, o que se traduz em "estar atento às campanhas e às escaladas que é fácil" ocorrerem quando se está a falar sobre "temas sensíveis na sociedade portuguesa". O Presidente ainda apelou ao respeito e apoio ao inquérito que foi levantado pelo Ministério Público. 

Já Mariana Vieira da Silva, ministra de Estado e da Presidência, repudiou as ameaças feitas a deputadas e ativistas e considerou que constituem "uma ameaça à própria democracia" que deve indignar "todos os democratas". Em conferência de imprensa, no final da reunião do Conselho de Ministros, a governante ainda sublinhou que a "tentativa de condicionamento político de representantes eleitos é crime e é como crime que deve ser tratado, e é como crime que está a ser tratado".

 

 

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