O debate presencial desta quarta-feira entre Marcelo Rebelo de Sousa e André Ventura esteve em dúvida, mas, ao início da noite, os candidatos na corrida a Belém sentaram-se efetivamente 'à mesa' para medir forças. Numa troca acesa de 'farpas', o debate subiu de tom e Marcelo acusou mesmo o líder do Chega de ter uma postura diferente nos encontros em Belém.
Marcelo Rebelo de Sousa começou o dia em isolamento profilático já que esteve em contacto com uma pessoa infetada com Covid-19. Chegou a ponderar-se a realização do debate por via remota, mas a Direção-Geral da Saúde 'liberou' Marcelo ao considerar que este não era um contacto de alto risco.
O debate, transmitido na antena da SIC Notícias, começou com um 'toque' de cordialidade, com Marcelo a atribuir a sua presença ali à "providência divina". O recandidato a Belém Marcelo fez, logo numa fase inicial, questão de 'separar as águas', defendendo que há uma "diferença" entre ele e Ventura: representam "Direitas diferentes. Eu sou de uma Direita social", enquanto Ventura é da "Direita persecutória".
Durante o debate, o líder do Chega chegou a tirar 'duas cartas da manga', mostrando duas fotos a Marcelo. Numa delas, o atual Presidente aparecia no Bairro da Jamaica, na outra estava nos incêndios de Pedrógão. As fotos chegaram acompanhadas de acusações a Marcelo pela performance que assumiu. Ora, Marcelo não gostou e o debate começou a subir de tom.
Perante a possibilidade de Marcelo vir a exercer um segundo mandato na Presidência, Ventura acusou-o de "apaparicar o Governo". O debate não passou também à margem da análise das sucessivas renovações do Estado de Emergência, com Marcelo a defender-se das 'investidas' do líder do Chega a dizer que não é "manipulado por ninguém. Não admito que o senhor deputado diga aqui o que não diz nas audiências em Belém. Usa outra conversa e outro tom. É o deputado e presidente [de partido] André Ventura".
Recorde aqui os principais temas do debate para as presidenciais:
Ventura é um candidato que ameaça a democracia?
Marcelo: A providência divina quis que estivesse aqui [em alusão ao facto de ter estado em isolamento profilático por algumas horas]. Os eleitores escolhem, os partidos existem. Portanto, partido legalizado, líder do partido legalizado, por definição, é aceite pela democracia. Não há ameaças relativamente a deputados de partidos eleitos pelo povo. Aceito e tolero as posições mais diversas de quem contesta determinados princípios da Constituição. A democracia tem essa força, que não tem a ditadura.
Ventura: De facto, há uma diferença que marca uma rutura em relação a outras candidaturas, que têm dito que a primeira coisa que vão fazer é ilegalizar o Chega e mandar André Ventura para Peniche. Há uma diferença de uma visão liberal que não é a que tem tido Marisa Matias e Ana Gomes, que só falta dizerem para me prenderem.
Não estará na eleição errada [para Ventura]?
Ventura: Uma sondagem dizia que o que os portugueses valorizam em mim é a capacidade de fazer rutura. Acho que temos de fazer uma rutura em Portugal [alusão ao caso da ministra da Justiça]. Este regime precisa de uma limpeza e aqui aponto responsabilidades ao candidato Marcelo.
[Em alusão ao caso de Vítor Caldeira e Joana Marques Vidal] Marcelo sabe que isto é um polvo que está a asfixiar a democracia e não fez nada para o impedir. Só posso ficar desapontado à Direita com a candidatura Marcelo Rebelo de Sousa.
Marcelo: Há uma diferença entre nós, representamos Direitas diferentes. Eu sou de uma Direita social. Tenho posições, do ponto de vista social, que são diferentes de uma direção securitária, dos que dividem uns dos outros. O papel do Presidente é ser aglutinador. Não sou líder partidário. Não faço das presidenciais umas primárias das legislativas.
[Substituição de Marques Vidal e Vítor Caldeira] A sua substituição não travou a corrupção? Não. Num caso como no outro, mandato único. O que aconteceu foi que, como uma nova procuradora e um novo presidente do Tribunal de Contas, avançaram processos (BES, Tancos, operação Lex). E essa é uma prioridade.
Ventura: Joana Marques Vidal estava a fazer um trabalho extraordinário. Tínhamos um primeiro-ministro que tinha sido preso. Se é verdade que o Governo tinha responsabilidades, o PR tinha aqui um papel a desempenhar. [Marcelo] Refugiou-se num papel formal.
Sobre a Direita securitária [mostra fotografia de Marcelo no Bairro da Jamaica], esta fotografia mostra o que a minha Direita não é. Marcelo juntou-se a bandidos que tinham atacado uma esquadra policial. Quando foi ao Bairro da Jamaica foi visitar os bandidos, não foi visitar os polícias. Eu represento a Direita que nunca vai deixar as polícias e forças de segurança estarem sozinhas.
Marcelo: A direita social não distingue os bons dos bandidos. Um candidato presidencial deve ser um integrador. Não há nenhuma decisão da justiça ainda. O PR vai a bairros de ciganos como africanos e vai não descrimina. Fui lá e não disse uma palavra sobre o que se tinha passado. Tenho muitas fotografias em esquadras de polícias. Não há portugueses puros e impuros.
Ventura: Nunca vou ser Presidente dos traficantes de droga, de pedófilos. O que fez aqui não tem nenhuma justificação. Um PR, antes de mais, tem de dar um sinal aos portugueses que sustentam Portugal. Não foi capaz de dar o sinal às polícias de que estava ao lado deles.
Marcelo: Sou o Presidente de todos os portugueses, dos desempregados, dos pobres, dos emigrantes, dos reformados, pensionistas, daqueles que foram até eventualmente condenados por crimes. Por isso não aceito pena de mote e de prisão perpétua.
Ventura: [Sobre o caso de Joana e de Pedro Dias] Não aceito a pena de morte. Mas aceito a prisão perpétua.
Marcelo: A prisão perpétua não faz qualquer sentido porque sou católico e para um cristão é possível a reconversão até qualquer segundo.
Segundo mandato, Marcelo perderá força?
Ventura: Espero que não haja um segundo mandato de Marcelo. Será que alguém à Direita pode em consciência votar em Marcelo quando teve leis que devia ter vetado e não vetou e o inverso? Disse que Costa deixou um legado credível? Alguém que esteja bom da cabeça [de Direita vota em Marcelo]?
Marcelo: O povo português votou duas vezes numa maioria de Esquerda. Eu respeitei. Os açorianos votaram uma maioria de Direita nos Açores, eu respeitei. Aí já acha muito bem. Dá-lhe jeito quando a maioria de Direita é respeitada pelo Presidente e não lhe dá jeito quando o Presidente respeita uma maioria de Esquerda.
Ventura: Não podia fazer outra coisa. Os açorianos é que quiseram o Chega. O Presidente não podia fazer nada.
Marcelo: [Perante maiorias de Direita no futuro ia agir da mesma maneira?] É evidente. Eu não mudo. Não sou líder de fação.
Ventura: [O que Marcelo podia fazer de diferente?] Pode não estar sempre a apaparicar o Governo, dizer que Costa está muito bem. Como é que promulga uma lei que permite expropriações? [Mostra nova foto sobre os incêndios de Pedrógão]
Marcelo: Estive sempre em contacto com ele [o senhor da fotografia que morreu sem ver a casa reconstruída].
Ventura: Não acha que ficou muito aquém de chamar o Governo à colação?
Marcelo: Eu estive lá [no local dos incêndios] É pura demagogia. Fiz o discurso mais violento ao Governo. A ministra da Administração Interna demitiu-se. O senhor fazia o que tem dito e dissolvia a torto a direito. Demitia ministros. O PR só pode demitir sobre proposta do primeiro-ministro. Era muito popular chegar aqui, despir o fato de Presidente e dizer que demitia este e aquele ministro.
Lei de Emergência sanitária ?
Marcelo: Os partidos reconheceram que não é em plena pandemia que se vai aprovar uma lei de Emergência sanitária [como propôs Ana Gomes em alternativa ao Estado de Emergência].
Ventura: Há um Governo que se apresenta na Assembleia da República e diz vamos libertar reclusos em pleno Estado de Emergência e um Presidente de Direita permite que reclusos saiam quando os portugueses estão confinados em casa? É um dos exemplos de como o PR permitiu a maior infâmia. Tínhamos bandidos a serem colocados cá fora.
Marcelo: [Sobre libertar presos] Quem decretou o Estado de Emergência quase contra tudo e todos fui eu. É importante lembrar. Não aumentou a criminalidade, era um problema humano. O senhor é da Direita persecutória. Eu não sou manipulado por ninguém. Não admito que o senhor deputado diga aqui o que não diz nas audiências em Belém. Usa outra conversa e outro tom. É o deputado e presidente [de partido] André Ventura.
Ventura: Marcelo não pode dizer que quer o Estado de Emergência e depois não querer saber como o Governo o regulamenta.
Marcelo: Vamos ver o que os portugueses dizem no dia 24 [de janeiro].
Revisão da CRP que instale um regime presidencialista?
Marcelo: Não concordo porque o Presidencialismo em Portugal iria conduzir à ditadura. No passado, o Presidencialismo conduziu à ditadura e o parlamentarismo conduziu a uma instabilidade de poder executivo.
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