"O CDS hoje vive um momento de asfixia. Está ligado a um ventilador"

Francisco Mota, líder da Juventude Popular, é o entrevistado de hoje do Vozes ao Minuto, num momento em que "o CDS está nos Cuidados Intensivos", diz, fazendo uma analogia com o atual período que vivemos.

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Catarina Correia Rocha
05/03/2021 08:20 ‧ 05/03/2021 por Catarina Correia Rocha

Política

Francisco Mota

Um ano e três meses. Foi este o período de tempo em que a Juventude Popular (JP) esteve sob a presidência de Francisco Mota. Mandato que termina, este fim de semana, no Congresso Nacional.

Natural de Braga, o ainda líder dos jovens centristas considerou, em entrevista ao Notícias ao Minuto, que a JP, tendo em conta também a situação pandémica que atravessamos, "soube estar à altura dos desafios". Em jeito de balanço, houve espaço para questões sobre a JP e sobre o lugar que ocupa atualmente o CDS na política nacional.

Temas como a prestação do Governo durante a pandemia – e o que apelida de "embirração ideológica" -, o que faria de diferente, e a recente polémica que seguiu a morte de Marcelino da Mata tiveram também espaço nesta conversa.

Deixa de ser presidente da Juventude Popular este fim de semana. Fez todo o trabalho a que se propôs?

Sinto-me muito satisfeito com o trabalho que foi desenvolvido ao longo deste mandato. Acho que entraremos para a História - bem como todos os líderes partidários e de juventudes partidárias -, com esta pandemia, pelo simples facto de ninguém estar preparado para ela, quer quem estivesse no Governo, quer quem estivesse na oposição. Isso levou-nos a ter de reconfigurar a ação política. Os propósitos que estavam em primeira linha, assumidos para este mandato, rapidamente tiveram de ser reconfigurados e a ação política teve de ser feita de uma forma distinta.

Muito do trabalho ao longo deste ano de pandemia – e cabe muito dentro deste espaço temporal a própria avaliação daquilo que foi o exercício do nosso mandato – acho que a JP soube estar à altura dos desafios. Quisemos sempre estar na linha da frente daquilo que era uma avaliação e um acompanhamento da evolução da pandemia, soubemos estar ao lado do Governo e dar indicações claras do que, na nossa perspetiva, devia ser a ação política face aos momentos que o país vivia. Nunca abdicámos do nosso papel preponderante de fiscalização e acompanhamento das medidas que eram implementadas.

E aproveitaria para dizer que, as juventudes partidárias são acusadas de, sobretudo, participar em campanha política e acho que ficou bem demarcada a diferença entre a JP e as restantes. Porque, desde logo, não temos um parlamentar, o que nos obriga a um exercício de esforço muito maior para estarmos à tona e sermos reconhecidos. Mas também em nada nos minorou e acho que conseguimos liderar a voz de Direita no país, ser alternativa, apresentar caminhos e, mais do que isto, apresentar soluções.

Como por exemplo?

Sempre defendemos uma coisa que, infelizmente, a ministra da Saúde não percebeu, que foi o facto de haver uma coordenação única entre o setor privado, particular e social, de forma a garantir que os doentes Covid tinham o maior número de recursos e as próprias unidades de saúde, os próprios profissionais, tinham os maiores recursos disponíveis. Assumimos isso como fundamental, porque os recursos eram escassos e, mais do que saber quem praticava o serviço, era importante salvar vidas. Não só no aspeto dos doentes Covid, mas sobretudo nos milhares de portugueses que ficaram para trás, que não eram doentes Covid.

Como os doentes oncológicos. Para estes, um dia faz a diferença. Uma semana pode ditar as dificuldades em recuperar ou não. Infelizmente, esta embirração ideológica de um Governo que não foi preparado para governar o país nem muito menos em pandemia – foi para responder à estatização da extrema-esquerda e dos acordos que o Partido Socialista fez -, tem este peso ideológico e não teve esta capacidade organizativa, sobretudo entre o SNS e as entidades particulares e sociais, que eram fundamentais à resposta.

Fez então, depreendo das suas palavras, tudo o que se tinha proposto mesmo em tempos diferentes, de pandemia...

Sim, até porque fomos a primeira juventude partidária a desconfiar. Tivemos o Conselho Nacional em Ponte de Lima, fomos a única juventude partidária a fazer uma escola de quadros dentro, naturalmente, das normas de segurança e comprovámos uma coisa que é óbvia, cada vez mais estou ciente disso: esta pandemia e as circunstâncias em que vivemos entrou de tal forma nas nossas vidas que tivemos que nos adaptar. E como muitos idosos que fui ouvir iam dizendo: 'Oh, menino. Olhe que nós se não morremos da doença, morremos da cura'. Para além do planeamento, da organização, há também uma grande responsabilidade individual. E nós demos um sinal claro de podermos retomar a nossa normalidade politica, naturalmente, com as responsabilidades assumidas que tínhamos. Mas, sim, o balanço é bastante positivo e tivemos um foco muito grande naquilo que era a representatividade dos jovens e dar-lhes voz.

Deixou de se pensar que o presente era um empréstimo dos nossos filhos para simplesmente ser uma herança dos nossos pais. É aqui que reside esta grande desconfiança, a grande falta de esperança dos portugueses perante a politica e os políticos"

Como vê a participação atual dos jovens na política? Sente que há desinteresse?

Esse é sempre um grande debate que todas as juventudes partidárias fazem e, hoje, cada vez mais os partidos políticos também o têm que fazer face ao que é a participação na escolha dos nossos representantes por parte da população portuguesa. Acho que sim, existe um grande divórcio entre as pessoas e a politica.

E dos jovens em particular?

Dos jovens, particularmente. Estes reinventaram a sua participação política, a sua participação cívica. Podem é não se rever atualmente num sistema político-partidário e na forma como os políticos olham para a realidade do país. Por isso, mais do que neste momento tentarmos perceber o que é que fez com que as pessoas se afastassem da politica, a grande reflexão a que nós somos chamados é qual o caminho que temos que fazer para reconquistar a confiança das pessoas.

Sobretudo, foi esta falta de compromisso que houve entre os políticos e os portugueses. Nós deixámos de ter uma política a longo prazo, uma política que pensasse no futuro das próximas gerações em detrimento de cada ato eleitoral. Deixou de se pensar que o presente era um empréstimo dos nossos filhos para simplesmente ser uma herança dos nossos pais. É aqui que reside esta grande desconfiança, a grande falta de esperança dos portugueses perante a politica e os políticos. Perde-se demasiado tempo no presente a cultivar a conservação do poder, do poder pelo poder, em vez de lhe dar sentido para o futuro, já que é sempre o futuro aquilo que nos define e interpela. Mas, lamentavelmente, aquilo que vamos sentindo é que há única e exclusivamente a procura do poder pelo poder, a influência dos próprios corredores, que os políticos não vêm a politica como uma missão, mas sim como um caminho para atingir os seus objetivos pessoais e tudo aquilo que é a sua agenda, seja do ponto de vista profissional, seja unicamente do ponto de vista político.

E a política perdeu esta essência de missão e de serviço, ou seja, uma política feita das pessoas, com as pessoas e para as pessoas. E isto, naturalmente, fica prisioneiro de uma coisa que me parece mais do que óbvia. Nós deixamos de ter líderes na política para ter apenas gestores de circunstância.

Mas a 'culpa' também não é das juventudes partidárias?

Parece-me que não. Aliás, refaço a resposta porque estaria a ser injusto. As juventudes partidárias fazem parte do espetro politico. Estas também têm responsabilidade dentro dos partidos políticos e têm de ser uma voz de inconformismo. Já dizia Adelino Amaro da Costa que a 'juventude não é instalada'. E, ao mesmo tempo, esta não vive sob as amarras daquilo que é o politicamente correto, as amarras do carneirismo político. As juventudes partidárias têm de ser uma pedrada no charco necessária, que tem de ser feita dentro dos próprios partidos políticos.

Nós o que precisamos não é de um país liderado por 'influencers' [políticos], precisamos de políticos com visão e ação"

Mas não está a conseguir captar os jovens. E não falo da JP em particular...

Não está. O modelo atual das juventudes partidárias está falido e, pior do que isso, preocupa-me bastante olhar hoje para a realidade nacional e perceber que os novos jovens políticos acham que a política deixou de ser feita através do contacto com as pessoas e passou exclusivamente a passar por aquilo que é o domínio das redes sociais, do online. É verdade que estas ferramentas são importantes numa aproximação, num contacto mais permanente, mas mas a excecionalidade não pode passar a ser a regra. E nós o que precisamos não é de um país liderado por 'influencers', precisamos de políticos com visão e ação. E o erro em que estamos - e começamos a cair em descrédito também nesse sentido -, é que parece que atrás de um ecrã de computador tudo se resolve. Isto é perigoso. Perigoso não só para quem faz politica, para quem tem de nos governar, mas também para quem tem de fazer oposição. E denote-se que aquilo que nós hoje temos é estes políticos de cadeira ou de cadeirão, atrás de um computador numa rede social e a achar que, por si só, são capazes de ser donos de uma realidade num país que em nada é real. Costumo dizer que, durante o período da pandemia, médicos, enfermeiros, produtores agrícolas... ninguém confinou. Porquê? Porque faziam falta ao país. Os políticos, se confinarem, estão a dar razão aos críticos: os políticos não fazem falta. Este é um erro crasso que a Democracia cometeu ao longo deste ano.

Passou a ocupar o mais alto cargo na JP com a saída de Francisco Rodrigues dos Santos para a liderança do CDS. Como viu este ‘salto’ do atual presidente do partido?

Em primeiro lugar, dizer que, quando tantas vezes se pede o envolvimento dos mais jovens para lhes dar uma oportunidade de mostrar o que valem, é interessante ver que foi o partido mais conservador a dar o primeiro sinal e a eleger um jovem para assumir os destinos. Por outro lado, também é uma prova de que o nosso bilhete de identidade e a nossa data de nascimento não tem que ser impedimento para absolutamente nada. O que deve ser avaliado é a nossa capacidade de trabalho, a nossa competência, o nosso mérito. O Francisco é uma renovação, uma nova aragem nos corredores do poder. Mas o país não está preparado para isto. Não está preparado, porque hoje em dia ser jovem não é um beneficio, é cadastro. Ora porque não tem experiencia, ora porque não tem competência. Ser jovem neste país e tomar a dianteira e a liderança é incriminado pela própria sociedade. Esquecendo-se que, no início da nossa Democracia, quase todos os líderes partidários, quase todos os governantes tinham abaixo de 30 anos.

Hoje, o jovem quando chega a um lugar qualquer cimeiro é logo rotulado de 'carreirismo politico' - "Lá vêm eles das juventudes partidárias". A sociedade também tem de perceber que tipo de país é que quer. Não podemos ter políticas novas com políticos velhos. A política deixou de ser uma missão nobre, de serviço. Hoje é alimentada pelos corredores de poder, as influências, a cunha como fator para subir na vida, uma política corrompida pelos poderes instalados. E aquilo a que nós somos desafiados, sobretudo os mais jovens, é que é necessário resgatar o crédito dos valores acima do crédito dos interesses. É fundamental sermos uma parte ativa na reabilitação da sociedade em que vivemos atualmente.

O Francisco é uma renovação, uma nova aragem nos corredores do poder. Mas o país não está preparado para isto. Não está preparado, porque hoje em dia ser jovem não é um beneficio, é cadastro"

O CDS tem perdido eleitores e registado dos piores resultados nas mais recentes idas às urnas. Como encara estes resultados? Qual o significado deles no seio do partido?

Relativamente à questão dos resultados, o CDS teve o pior resultado nas Legislativas em 2019, que levou à substituição de Assunção Cristas e eleição de Francisco Rodrigues dos Santos. O partido estava num momento de fragilidade muito grande, como está hoje. O CDS hoje vive um momento de asfixia, está ligado a um ventilador, aproveitando aqui a comparação com o momento pandémico que vivemos. O CDS, neste momento, está nos Cuidados Intensivos. Isto não é consequência da atual direção. Mas há uma coisa que é certa: há uma responsabilidade da atual direção, da qual faço parte, em encontrar um caminho, em resolver o problema do partido. E com uma certeza: é que todos fazem falta. Os que estiveram antes, os que estão agora e aqueles que nós queremos conquistar.

É para isso que o poder serve, para estar ao serviço das pessoas e demonstramos o quanto podemos marcar a diferença na governação de uma Câmara, de um Governo regional, no Parlamento ou no Governo. O CDS empresta o seu conhecimento, o seu serviço, o seu poder ao serviço das pessoas. E depois há um segundo nível, que são as sondagens, as sondagens valem o que valem, mas ditam naturalmente tendências.

Sendo que os resultados do CDS têm, ultimamente, comprovado as sondagens...

Bem, nos Açores davam-nos 1% e tivemos 6%. Quanto às sondagens, valem o que valem. São tendências, temos de estar alerta, mas ninguém é detentor dos votos dos portugueses. Mais do que discutir a forma como o CDS se apresenta aos eleitores e a tendência de escolha dos eleitores, há uma coisa de que nós temos de estar conscientes: o CDS faz falta a Portugal e todos que estão no CDS fazem falta ao CDS. E, depois, as próprias sondagens ditam um divórcio da maioria dos eleitores dos partidos. E daí o aparecimento de partidos - que nós sabemos quais são - e que rapidamente se afirmam na sociedade portuguesa.

O CDS já fez um 'corte' entre Assunção Cristas e Francisco Rodrigues dos Santos, mas os resultados prosseguem...

O CDS sofreu recentemente, é publico e sabido, uma revolução interna. Além das dificuldades, neste momento, que tem de se reorganizar devido às circunstâncias difíceis em que o partido se encontra do ponto de vista politico e depois também na questão financeira... Torna-se complicado. Vai ter de haver uma reinvenção naquilo que é a ação politica do CDS mas, parece-me, há estrada para andar e caminho a fazer. Há um processo natural das coisas e é preciso dar tempo ao próprio tempo. Espero que Francisco Rodrigues dos Santos, não só para o bem do Francisco, mas sobretudo para bem do CDS e da Democracia de Portugal, tenha esta capacidade - que irá ter certamente, juntamente com todo o partido - de dar a volta a uma circunstância que é difícil mas possível.

O aparecimento de partidos como o Chega! e IL reforçam aquilo que é o desafio - ainda mais - difícil do CDS"

Qual julga ser a ideia atual que os portugueses têm do CDS? Os novos partidos à Direita são, de alguma forma, uma ameaça?

Quando se fala de dois novos partidos à direita... o Iniciativa Liberal (IL) é um partido de Centro, de Centro-Esquerda, porque nos valores, o IL partilha o campo do BE, não partilha o do CDS. Aquilo em que o IL é de Direita é na política económica. O CDS sempre se afirmou como a grande casa das ideias, da Democracia cristã, dos conservadores e dos liberais. Agora, é verdade, o aparecimento de partidos como o Chega! e IL reforçam aquilo que é o desafio - ainda mais - difícil do CDS.

O que considera que os portugueses pensam que podem encontrar nesses partidos e que não têm no CDS? E daí a 'deserção' de militantes...

Essa questão da passagem, da transferência, quase como se fosse o mercado de inverno numa linguagem futebolística, de militantes do CDS para outros, acho que tem de ser um bocadinho desconstruída. Isso não acontece de uma forma galopante, não há transferência de plantéis completos. O que acontece é que aqueles que já estavam descontentes nos próprios partidos políticos - ou seja, aqueles que nunca conseguiram ascender ao topo da hierarquia partidária, aqueles que estiveram sempre do contra -, viram agora nesses partidos um refúgio para poderem levar aqueles que são os seus objetivos pessoais. O CDS, para demonstrar que é diferente, não é a negar esses partidos que o irá conseguir fazer. É no espaço político que temos de concorrer com eles.

Foi também público que ficou infetado com o novo coronavírus. Que comentários lhe merece a ‘prestação’ do Serviço Nacional de Saúde – consigo e em toda a pandemia?

Sobre a forma da questão como fui tratado, não tive a infelicidade de ter de ser assistido num hospital. Consegui superar sozinho e em casa a Covid-19, mas também sou testemunha do pior que existe neste combate à pandemia. Aquilo que é gritante neste momento é a falta de planeamento, de organização e de antecipação de cenários. Ou seja, no fundo, o Governo precisava de trabalhar muito mais do que aquilo que faz hoje.

Há toda uma configuração no SNS que simplesmente por embirração ideológica (...) é que não foi dada a resposta necessária"

O que o Governo deveria ter feito e não fez para controlar a Covid-19?

Desde logo, uma coordenação única entre o SNS, o particular e o social. Para defender os doentes Covid mas, sobretudo, os doentes não Covid. Doentes que ficaram para trás, idosos que vivem isolados e abandonados à ingratidão de um Estado que não sabe cuidar deles… Há toda uma configuração no SNS que simplesmente por embirração ideológica – porque há um peso ideológico demasiado neste Governo – é que não foi dada a resposta necessária.

Mas se não existisse essa "embirração ideológica", a situação ter-se-ia resolvido?

Resolvia-se, claro que sim. Mais. Há outra embirração ideológica clara. Propus que as Forças Armadas liderassem esta guerra. São as Forças Armadas que têm a capacidade, a experiência e a organização para responder ao combate à Covid. E isso não aconteceu, uma vez mais, por embirração ideológica, porque a Esquerda olha para as Forças Armadas como uma ferramenta de outro tempo qualquer. Foram necessários meses a fio de incompetência, culminando com a questão de todo o processo de vacinação, para que fossem as Forças Armadas a assumir a liderança.

Sabemos de antemão que há três formas de combater esta pandemia: o confinamento, a testagem massiva e permanente, e a capacidade de gestão e controlo das redes de contágio. Para esta última, é inadmissível que continuemos a ter médicos e enfermeiros a controlar. Estamos a falar de inquéritos que qualquer português fazia. Porque é que isto não foi entregue às Forças Armadas do ponto de vista regional? Segundo, a testagem à população. A melhor prenda que se podia dar era uma testagem massiva a todos os portugueses nos últimos 15 dias do ano. A Áustria fez isso, a Eslováquia fez isso… e funcionou. Mas o Governo não o quis fazer. Como também a testagem massiva que nos foi prometida no início do ano para as escolas. Nunca aconteceu. Nos espaços públicos? Nunca aconteceu. Nós corremos sempre atrás do prejuízo.

E como é que nós deixámos que isto acontecesse nos lares? É inaceitável que, em quem está já confinado por natureza, ter sido o vírus a vir de fora e a ir para dentro. Aconteceu em pontos do país. Os familiares não podiam visitar os idosos, mas a Proteção Civil entrava nos lares para medir a separação das camas entre os idosos. Quando estavam todos dentro do mesmo espaço. Qual era a diferença de estarem a dois metros ou um metro? O que não podia acontecer era entrarem pessoas que pudessem ser portadoras de vírus.

E a vacinação?

A vacina é um bem raro. A falta de planeamento ditou que se tivesse de escolher entre uns e outros, entre idosos e menos idosos, entre 50% dos corpos de bombeiros e os outros 50% entre as forças de segurança e as Forças Armadas. Há todo um imbróglio à volta disto. E, desde que foi entregue às Forças Armadas, nunca mais se ouviu falar em perdas de vacinação. Há também uma coisa que tem de ser dita sobre o SNS. Este estava entupido, os centros de saúde não conseguiam assegurar os doentes Covid nem dar consultas aos idosos, era só pelo telefone, e fomos colocar sobre estes profissionais de saúde ainda mais a vacinação? É tudo em cima do joelho, sem qualquer capacidade organizativa.

Fora estas questões de saúde, há processos que são inaceitáveis de acontecer, sobretudo a mensagem que o primeiro-ministro deu em setembro do ano passado, dando nota de que o país não poderia voltar a fechar, que as famílias, as escolas e sobretudo a economia não aguentaria. E, depois, fecha o país novamente, e, pior do que isso, deixa todos para trás.

É triste que o Estado tenha este olhar míope e que não responda ao futuro, deixando de lado setores fundamentais como o turismo, a restauração..."

Como é que Portugal pode recuperar?

Neste momento, do ponto de vista da Educação, mais do que reabrir escolas, era fundamental termos um plano para a recuperação. Porque um aluno ter aulas em casa, sobretudo na escola primária não é a mesma coisa que o acompanhamento na sala. É fundamental que o Governo, logo que abra as escolas, apresente um plano de recuperação educativo para estas crianças. Se não tiverem férias de verão, não têm. Se os professores não puderem ir de férias, não vão de férias. Este é o momento que mais do que perguntar o que é que o país pode fazer por eles é o que eles podem fazer pelo país.

Quanto à questão económica e o dito Programa de Recuperação e Resiliência (PRR), a grande bazuca que, na verdade, mais parece uma pólvora seca... é extraordinária a forma ideológica e irresponsável como o documento está transcrito. Impõe-se que haja um sentido patriótico na gestão dos recursos. O dinheiro ainda não veio e as pessoas já desconfiam de Portugal. Também era fundamental que as receitas do passado não se voltassem a repetir. E que aquilo que deve ser uma esperança, sobretudo para a Economia e para as empresas, não se torne numa oportunidade perdida. Neste momento, o PRR oferece muito mais a solução dos problemas para o Governo. É um Plano que oferece mais Estado e pouca Economia. É triste que o Estado tenha este olhar míope e que não responda ao futuro, deixando de lado setores fundamentais como o turismo, a restauração...

E era para esses setores que os fundos deveriam ser canalizados? Ou mais canalizados?

É para as empresas. Quem cria postos de trabalho? Quem investe e arrisca? Quem paga impostos? Quem impulsiona a recuperação económica? É o setor privado, são as empresas. Este não é um plano para rasgar a escuridão da pandemia, para reerguer Portugal, para dar uma nova visão do país, mas é mais uma cartilha socialista para continuar a alimentar a dependência dos portugueses perante o Estado. Penso que a crise pandémica se vai tornar numa crise económica e social e, muito provavelmente, vai tornar-se numa crise soberana do Estado e onde, infelizmente, teremos de ter intervenção novamente das instâncias externas para recuperar o país.

Em que questões considera que o Executivo de António Costa esteve bem no combate à pandemia?

Torna-se difícil encontrar circunstâncias em que o Governo esteve bem, mas há uma coisa que tenho de reconhecer e que acho que todos os partidos, independentemente da posição, estão cientes. Isto não era fácil para ninguém, para nenhum Governo. Creio que o Executivo, no início, teve uma atuação sensata. Procurou aliar esforços, unir todas as forças políticas, tentou dar uma mensagem de unidade nacional. Só que rapidamente perdeu o norte. E perdeu-o sobretudo pelas implicações político-partidárias e passou a ter uma gestão de acordo com o que era a empatia das pessoas. Deixamos de ter líderes para passarmos a ter gestores de circunstância.

Entre tudo isto ocorreu a Festa do Avante!. Mostrou-se totalmente contra a realização, lançou uma petição e revelou ter sido alvo de insultos e ameaças. Não o move, neste quadro, o argumento de que em Emergência a Democracia não está suspensa?

Move. Move de tal forma que eu fiz um Conselho Nacional, fiz uma Escola de Quadros, fiz outro Conselho Nacional... Fui muito claro na altura. Quando o país estava na circunstância em que estava, em que foram proibidos os festivais, as festas, as romarias seculares, em que empresas e trabalhadores do setor dos eventos e da logística estavam impedidos de trabalhar, porque é que, sobre o chapéu de um partido político, era autorizado a uns aquilo que não foi admitido a outros?

Por que essas romarias seculares não são atos de Democracia.

Fui a favor que todos os partidos fizessem as suas rentrées políticas. E ficava à responsabilidade de cada um fazê-las de acordo com as normas.

Não é uma questão de ideologia.

Não, não. É o PCP, mas se a festa fosse do PS era exatamente igual. O que não posso aceitar é que fizeram um festival de verão - porque o Avante! é o mais antigo festival de verão em Portugal. E também é um momento político. Que podia existir. Podia existir um comício, como existiu de Jerónimo de Sousa. E se o NOS Alive passasse a chamar-se NOS Alive CDS? Já se podia fazer? E a Romaria da Senhora da Agonia? Se colocasse no canto dos cartazes um logótipo do BE? É isto que está em causa.

Existe uma história que tem de ser honrada, respeitada. E, se cometemos erros no passado, que saibamos aprender com eles para não os voltar a repetir"

Houve também polémica após a morte do tenente-coronel Marcelino da Mata. O que foi mal gerido – e quem geriu mal – esta situação?

Quem geriu mal? A resposta que queria não a posso dar. O que posso dizer é que há uma tentativa clara, de algum tempo a esta parte, de procurar fazer acertos com o passado. Uma agenda cultural de imposição de uma nova realidade que é passar uma borracha sobre mais oito séculos de história e achar que a única história verdadeira e boa que existe é só depois do 25 de abril. Temos de perceber em que momento é que as coisas são alocadas. Portugal só não foi mais uma Catalunha de Espanha porque teve dimensão mundial. Quando hoje se fala em globalização, quem a fez foram os portugueses com tudo aquilo que implicou. Existe uma história que tem de ser honrada, respeitada. E, se cometemos erros no passado, que saibamos aprender com eles para não os voltar a repetir.

Para terminar. Quais os seus planos políticos no futuro?

Assumi lugares na JP durante muitos anos, mas sempre afirmei que a política local me dá mais prazer. E, portanto, como projeto futuro espero, em nome do meu partido, entregar o conhecimento em prol da minha terra e poder exercer lugares de vereação na Câmara Municipal de Braga.

Nunca virei as costas ao meu partido, não sei o dia de amanhã, mas o meu foco vai ser na minha cidade"

Não vamos ver Francisco Mota como presidente do CDS?

[Risos] Há uma garantia: Teremos um Francisco como presidente do CDS. Não está em cima da mesa. [Neste mandato] senti o peso de não ser de Lisboa, de ter pronúncia do Norte. Não é que me tratassem de forma diferente, mas há sempre o sentimento provinciano de que quem vem para lá da capital... que tem pouco capital. Nunca virei as costas ao meu partido, não sei o dia de amanhã, mas o meu foco vai ser na minha cidade. Saio agora da JP, mas a JP não sai de mim.

Leia Também: JP pede a Presidente da República que inclua jovens no Conselho de Estado

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