Contactado pela agência Lusa, o deputado bloquista José Soeiro sublinhou que o Governo "quis lançar uma espécie de guerra constitucional contra uma medida de emergência social e de apoio aos trabalhadores independentes", quando pediu a fiscalização sucessiva da constitucionalidade do diploma.
"Parece-nos incompreensível do ponto de vista daquilo que estava em causa... E este acórdão não tem efeito prático, porque os apoios não vão ser anulados", completou.
Para José Soeiro "não surpreende que o TC diga que o Orçamento do Estado para 2021 (OE2021) não previa estas medidas", uma vez que o executivo socialista não as contemplou, apesar de, mais tarde, as considerar necessárias.
"Era um orçamento que deixava muita gente para trás, como se verificou logo em janeiro, quando a pandemia se agravou e o próprio Governo reconheceu que o orçamento não era suficiente", prosseguiu o bloquista, sustentando que "se tivesse sido o Governo a prever estes apoios, a fazer estas alterações, não haveria nenhum problema de constitucionalidade".
O deputado considerou que "o parlamento só agiu porque o Governo não o tinha feito" e que, "em todo o caso, verifica-se que, mesmo com esta posição do Tribunal Constitucional, o próprio Governo, obviamente, não se atreve a reverter" esta medida.
O Tribunal Constitucional (TC) considerou hoje inconstitucionais várias normas alteradas pelo parlamento relativas ao apoio no estado de emergência e no âmbito da suspensão da atividade letiva e não letiva, que tinham sido promulgadas pelo Presidente da República.
O pedido de fiscalização sucessiva da constitucionalidade foi anunciado pelo primeiro-ministro, António Costa, em 31 de março, na sequência da promulgação pelo Presidente da República de leis aprovadas pela Assembleia da República e que ampliavam os apoios decididos pelo Governo.
O TC decidiu hoje declarar inconstitucionais uma norma relativa ao diploma que estabeleceu mecanismos de apoio no âmbito do estado de emergência devido à redução da atividade económica, nomeadamente no alargamento do apoio aos trabalhadores independentes, e duas normas da lei sobre os apoios à atividade letiva e não letiva por considerar que as três implicavam "em parte, um aumento de despesas no corrente ano económico.
"Mais decidiu o Tribunal ressalvar (...) por motivos de segurança jurídica e de equidade, os efeitos produzidos até à publicação deste acórdão em Diário da República pelas normas que declarou inconstitucionais", acrescentam.
O TC informa ainda que "o restante pedido do primeiro-ministro não obteve provimento do Tribunal" e que a decisão "foi aprovada por unanimidade" dos juízes em exercício de funções.
Em 31 de março, o primeiro-ministro justificou o pedido de fiscalização sucessiva de três diplomas aprovados pelo parlamento e que alargavam o âmbito dos apoios decididos pelo Governo com o entendimento de que violavam a "lei suprema" da Constituição ao aumentarem a despesa prevista no Orçamento.
"A nossa Constituição é muito clara na repartição de poderes. O parlamento é soberano na aprovação do Orçamento e o Governo é totalmente responsável pela sua execução. Por isso, uma vez aprovado o Orçamento, a Assembleia [da República] não pode nem aumentar a despesa nem diminuir a receita previstas nesse Orçamento", alegou António Costa, que negou a existência de qualquer conflito institucional com o Presidente da República.
Leia Também: Bloco vai "negociar" com o Governo Orçamento do Estado para 2022