Ao quarto dia de campanha, um candidato da AD trouxe para cima da mesa o tema do aborto. Paulo Núncio, vice-presidente do CDS-PP, durante um debate promovido pela Federação Portuguesa pela Vida, defendeu que deve ser feito um novo referendo ao aborto.
Segundo a Rádio Renascença, o candidato a deputado por Lisboa nas listas da Aliança Democrática (AD) às eleições legislativas de março considera que "a única forma revertermos a liberalização da lei do aborto passa por um novo referendo".
Paulo Núncio mostrou-se ainda a favor de iniciativas que possam "limitar o acesso ao aborto”, tais como taxas moderadoras. Note-se que essa medida chegou a ser implementada pelo governo PSD/CDS-PP, em 2015, mas acabou por ser revogada pela maioria parlamentar de Esquerda.
O vice-presidente do CDS-PP sublinhou ainda que no acordo político celebrado com a AD foi identificado como ponto essencial colocar a dignidade humana no centro e na prioridade da atividade política.
As declarações acicataram a opinião pública (e os partidos) e tanto Luís Montenegro como Nuno Melo foram obrigados a reagir.
"Esse assunto está absolutamente arrumado", diz Montenegro
O presidente do PSD assegurou que a AD não vai mexer na lei do aborto na próxima legislatura, considerando que este é um assunto arrumado e que a posição de Paulo Núncio só a ele vincula.
"Esse assunto é um assunto que está absolutamente arrumado. Nós não vamos ter nenhuma intervenção nesse domínio na próxima legislatura", declarou Luís Montenegro. Interrogado sobre a posição do vice-presidente do CDS-PP Paulo Núncio, quarto candidato pela AD no círculo de Lisboa, a favor de um novo referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez (IVG), o presidente do PSD apontou-a como uma "expressão individual e apenas e só a comprometer e a vincular o doutor Paulo Núncio".
"O que os portugueses querem saber é qual é a minha [posição] e o comprometimento da AD, e esse é muito claro: nós não vamos mexer nesta legislação. É tão simples quanto isso", acrescentou Luís Montenegro.
Questionado se, caso consiga maioria no parlamento, a AD não quererá aprovar medidas relacionadas com o acesso à IVG como fez na legislatura 2011-2015, o presidente do PSD respondeu: "Nós não temos nenhuma intenção de o fazer, que não seja cumprir a lei, dar às mulheres portugueses todas as condições para poderem, dentro daquilo que a lei estabelece, tomar a sua decisão, de forma bem informada, de forma planeada, de forma segura do ponto de vista da sua saúde".
Novo referendo ao aborto "não consta do acordo de coligação" com PSD
Mais contido na hora de comentar o tema esteve Nuno Melo, que salientou que um novo referendo ao aborto em Portugal não consta do acordo de coligação da Aliança Democrática, que junta centristas e PSD, rejeitando que seja "tema para a próxima legislatura".
O líder do CDS-PP começou por afirmar que Paulo Núncio "não disse nada disso" e deixou "três notas" sobre o tema.
"O que o Paulo Núncio disse foi uma afirmação de grande respeito democrático. Disse que um resultado de um referendo só pode ser alterado por outro referendo. Ponto dois: este tema não é um tema que conste do acordo de coligação, não constando no acordo de coligação, não é tema para a próxima legislatura", salientou.
Por último, Melo afirmou que "em relação ao tema" a posição do CDS-PP - que é contra a interrupção voluntária da gravidez - é conhecida.
"Sabem que o CDS é o mesmo e, portanto, aquilo que o CDS sempre foi é aquilo que o CDS sempre é. Dito isto acho que está esclarecido", sublinhou.
Dos partidos também não se fizeram esperar reações à declarações polémicas.
Pedro Nuno acusa AD de querer "voltar ao passado" no aborto e nas pensões
O secretário-geral do PS acusou a Aliança Democrática (AD) de querer "voltar ao passado" na criminalização do aborto e no corte das pensões, pedindo que os pensionistas e as mulheres se desloquem às urnas para defender os seus direitos.
"Aquilo que nós vemos é uma AD a querer voltar para trás. Voltar para trás para onde? Ao tempo da prisão, da criminalização e do risco de vida para a mulher? Porque esse tempo nós já o ultrapassámos. Nós queremos apontar para o futuro, não é apontar para o passado", afirmou.
Chega "não voltará a alinhar num referendo sobre isso"
O presidente do Chega, André Ventura também se manifestou hoje contra um novo referendo ao aborto e o eventual regresso à criminalização da interrupção voluntária da gravidez, defendendo que não é algo prioritário para o país neste momento.
"Enquanto eu for presidente do Chega, entendo que nós não devemos voltar à criminalização do aborto", afirmou André Ventura, indicando que "o partido não vai voltar a propor a criminalização do aborto e logo, por consequência, não voltará a alinhar num referendo sobre isso".
"Montenegro esteve contra o direito ao aborto sempre que pôde"
A coordenadora do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, assinalou que nenhum partido da direita parlamentar "se atreveu" a pôr em causa a lei do aborto que gerou um "consenso inviolável", mas cujo acesso considerou ser preciso garantir a todas as mulheres.
"Há muito para fazer para consagrar os direitos das mulheres, mas também valorizo que nenhum partido da direita parlamentar se atreva a pôr em causa, e esta campanha serviu para essa clarificação, uma lei histórica e tão importante como a lei da interrupção voluntária da gravidez", enfatizou.
Por sua vez, a deputada bloquista Joana Mortágua acusou o presidente do PSD de ter estado "contra o direito ao aborto sempre que pôde no parlamento" e considerou que o líder socialista "está enganado" porque o SNS tem falhado às mulheres.
Brilhante Dias acusa a AD de começar a fazer discurso da extrema-direita
O cabeça de lista do PS por Leiria, Eurico Brilhante Dias, também reagiu, acusando a Aliança Democrática (AD) de começar a fazer o discurso da extrema-direita, explorando a questão da imigração, e de ameaçar um "retrocesso social" no aborto.
Numa alusão ao discurso proferido na segunda-feira pelo ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, num comício da AD, em Faro, considerou impensável que "um partido democrático fizesse a relação entre gente que trabalha - e que todos os dias constrói este país - e insegurança".
Eurico Brilhante Dias insurgiu-se também contra as declarações proferidas pelo vice-presidente do CDS-PP, Paulo Núncio, candidato pelo círculo eleitoral de Lisboa nas listas da AD, que defendeu a realização de um novo referendo à interrupção voluntária da gravidez (IVG), durante um debate promovido pela Federação Portuguesa pela Vida.
"Declarações de Núncio sobre a IGV revelam a agenda escondida da AD"
Para Inês Sousa Real "as declarações de Paulo Núncio sobre a IGV revelam a agenda escondida da AD".
"Já bastou que o PSD e o CDS a última vez que foram governo tenham imposto o pagamento de taxa moderadora às mulheres que quisessem abortar! Um voto na AD é um voto contra os direitos das mulheres", sublinhou a líder do PAN.
"Direita quer reabrir debates que já foram encerrados"
O porta-voz do Livre também acusou a Direita de querer reabrir debates que já foram encerrados, referindo-se à criminalização do aborto, considerando que seria interessante falar sobre um referendo à regionalização.
Em reação às declarações do vice-presidente do CDS, Rui Tavares manifestou-se convicto que não há na sociedade portuguesa nenhum pedido para reabrir esse debate e que foi encontrado um ponto de equilíbrio sobre este assunto.
IL não está para "acordo que envolva algum retrocesso" na lei do aborto
Por fim, o presidente da Iniciativa Liberal defendeu que a atual lei do aborto é adequada, sublinhando que o seu partido não está disponível para acordos que envolvam qualquer retrocesso nessa matéria.
"A IL entende que o quadro legal é adequado, portanto, isso salienta também a necessidade de dar força à IL para que a transformação que desejamos seja uma transformação de futuro e não uma transformação no sentido do passado", afirmou Rui Rocha, no final de uma visita e reunião na União das Misericórdias em Lisboa, naquele que é o quarto dia oficial da campanha para as eleições antecipadas de março.
Note-se que no primeiro referendo, em 1998, o "não" à despenalização da IVG, realizada por opção da mulher, nas primeiras dez semanas de gravidez, venceu com 50,91% dos votos. No segundo referendo, em 2007, o "sim" venceu com 59,25%.
[Notícia atualizada às 19h56]
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