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"Era de loucos. Fiz guiões do Secret Story no carro da Teresa Guilherme"

É o autor de canções que ainda hoje não nos saem da cabeça e o 'pai' dos icónicos trocadilhos dos reality shows. Do sucesso dos Mercuriocromos aos discos da 'Floribella', Miguel Dias esconde um sem fim de outros êxitos que recorda esta terça-feira em entrevista ao Vozes ao Minuto.

Notícia

© Miguel Dias

Catarina Carvalho Ferreira
25/02/2025 08:13 ‧ há 7 horas por Catarina Carvalho Ferreira

Fama

Miguel Dias

Miguel Dias sonhava ser jornalista, mas sem dar por isso, aos 16 anos, fazia parte de uma banda icónica. O sucesso dos Mercuriocromos abriu-lhe as portas da televisão, na 'caixinha mágica' deu cartas como apresentador, arrebatou audiências, e aos 30 anos chegou finalmente ao teatro.

 

O papel de destaque em 'My Fair Lady' trouxe o esperado reconhecimento, uma nomeação aos Globos de Ouro e mostrou-lhe a paixão da sua vida: a representação.

Porém, a sua carreira esconde um sem fim de outros êxitos. É autor dos discos e canções de 'Floribella', de temas como 'Porquê', dos Anjos, e o responsável pelos guiões dos tempos gloriosos dos reality shows em Portugal.

No ano em que completa 30 anos de profissão, Miguel Dias fala, em entrevista ao Notícias ao Minuto, sobre os sucessos escondidos de uma carreira que abraça desde o primeiro dia por paixão e sem pretensões de fama e reconhecimento. 

No Brasil, havia as Mamonas Assassinas, em Portugal há, de repente, os Mercuriocromos, os Fúria do Açúcar, os Porquinhos da Ilda, os Ena Pá 2000. Esse estilo ganhou muitos fãs em Portugal

O Miguel nasce numa família ligada ao mundo do espetáculo. Era possível ter sido outra coisa que não artista?

Na verdade, não dizia que queria ser ator, dizia, por influência do meu pai e da minha tia, que queria ser jornalista. Cheguei a estudar para isso. Muito pouco, mas estudei. Os planos eram ser jornalista, ser ator era uma brincadeira de amador. Nunca vi como possibilidade tornar-me profissional. A influência artística da família era grande, mas para ser uma brincadeira e não uma profissão.

Quando se dá, então, o despertar para o mundo das artes?

Começa primeiro pela música em vez do teatro, quando aos 16 anos começo a tocar em bares, à noite, com o meu mais antigo amigo, Hugo Franco. Formámos um duo, O Duo Avesso. Aquela coisa da música começou-me a fascinar e ao Hugo também. Acabámos por formar uma banda com outros amigos, os Mercuriocromos, que têm um sucesso gigante. É aí que percebo que o mundo artístico era um apelo maior, com 18 anos.

Qual o segredo para o sucesso que os Mercuriocromos alcançaram na época? 

Ainda hoje é difícil de explicar, mas houve uma altura, nos anos 90, em que o conceito de juntar o humor à música estava muito em voga. No Brasil, havia as Mamonas Assassinas, em Portugal há, de repente, os Mercuriocromos, os Fúria do Açúcar, os Porquinhos da Ilda, os Ena Pá 2000. Esse estilo ganhou muitos fãs em Portugal.

Como tinha o complemento do teatro, que levei para a banda, as pessoas achavam muita graça aos espetáculos. Tínhamos sketches no meio dos concertos, era um espetáculo completamente diferente. Colocávamos perucas, chapéus, mudávamos personagens e as pessoas achavam muita graça. Os dois singles que lançámos, o 'Camionista Cantor' e o 'Luzia', caíram no goto, não só das rádios, que deram uma grande visibilidade, como também a malta nova, principalmente quem estava na universidade. Foram os grandes impulsionadores dos Mercuriocromos. Em 1996, no mês das queimas das fitas, fizemos 22 queimas, de norte a sul do país. Era uma loucura. 

Quando dou por mim sou apresentador do maior canal em Portugal, o líder absoluto de audiênciasComo é que passa depois da música para o teatro, a representação?

Este ano faço 30 anos de carreira e, há poucos dias, quando me apercebi disso, comecei a a fazer uma retrospetiva deste percurso. Já fiz muita coisa ao longo destes 30 anos, coisas que nem sequer imaginava. E, curiosamente, o teatro é o que surge no fim, porque da música passo primeiro para a televisão.

Um dia sou chamado ao Teatro Politeama pelo Filipe La Féria, que me diz: "Disseram-me que você faz espetáculos em bares e que é muito engraçado, quer vir participar num programa meu?" Participei no 'Todos ao Palco', como ator convidado. O Filipe achou muita graça aos disparates que fiz, aos personagens que fiz nesse programa. Estive um ano sem parar a trabalhar com o Filipe, em televisão, onde fiz imensas coisas. Fiz a apresentação da grelha da RTP, nesse ano, a gala dos 40 anos, no Coliseu em direto, o programa de fim de ano.

Não tardou a passar da RTP para a SIC. Como surgiu esta 'transferência' na época? 

A Teresa Guilherme, que me conhecia desde miúdo, por ser sócia e amiga do meu pai [o jornalista Abel Dias], foi ver a gala dos 40 anos da RTP, como convidada, e quando me vê em palco diz: "Não pode ser o Miguel". Ela conhecia o Miguel de casa, muito tímido, muito calado, nada artista. A Teresa estava na SIC, nessa altura, e chamam-me para ir fazer um programa como cantor, o 'Paródia Nacional', em 1996, que torna-se um sucesso, uma coisa louca de audiências.

Tinha 30 anos e estava a fazer um homem de 70. Aquele papel chamou muito a atenção, fui nomeado para os Globos de Ouro

Faço o 'Paródia Nacional', o Emílio Rangel repara em mim e diz: "Este rapaz gordinho tem graça, vamos fazer uma experiência". Convida-me para apresentar o 'Furor', com a Bárbara Guimarães. Isto foi tudo muito rápido, quando dou por mim, sou, sem esperar, apresentador do maior canal em Portugal, uma altura, o líder absoluto de audiências. O 'Furor' também se torna num mega sucesso, o Emílio Rangel decide apostar em mim para apresentar um programa sozinho e apresento o 'Cantigas de Maldizer', com a participação da equipa da 'Noite da Má Língua'.

Um ano e pouco depois, a RTP convida-me para mudar de canal. Acabo por aceitar o convite, vou para a RTP apresentar um concurso, 'Só Números'. Um concurso que, durante as férias de verão, substituiu 'O Preço Certo', do Fernando Mendes. Era um gordo a substituir outro. Só em 2000 é que surge o convite para fazer a minha primeira peça profissional, que foi um convite da Plano 6, um musical infantil chamado 'Festa na Floresta'.

É então aí que surge o teatro e o grande salto para o 'My Fair Lady'?

Correu tão bem que o Filipe La Féria chamou-me para fazer o 'My Fair Lady'. É onde tenho um papel inesquecível para mim, como pai da Eliza Doolittle. Tinha 30 anos e estava a fazer um homem de 70. Aquele papel chamou muito a atenção, inclusivamente fui nomeado para os Globos de Ouro como Melhor Ator de Teatro. Não ganhei, mas fui nomeado. A partir daí começo a fazer teatro sem parar, é aí que o teatro surge. Depois de 'My Fair Lady', fiz a digressão do 'Amália', a 'Canção de Lisboa', 'Os Produtores'. O teatro entra na minha vida e tem sido, desde aí, a principal atividade que tenho exercido. A paixão maior tem sido o teatro.

Acho que não era um grande apresentadorTantos anos depois, há saudades dos seus tempos de televisão?

Tenho saudades de fazer televisão, não faço televisão há muito tempo, há 10 anos. Fiz o 'Bem-vindos a Beirais' [da RTP], foi a última série que fiz, desde aí não surgiram mais convites. Nessa atura também estava há muito tempo sem fazer televisão. 'Beirais' era para durar três meses, eram 60 episódios, acabou por durar três anos e serem 300 e tal episódios. Depois, pronto, não surgiram mais convites.

E da comunicação, do trabalho como apresentador, sente falta?

Acho que não era um grande apresentador, com sinceridade, não se perdeu um grande apresentador de programas.

Ganhou-se, então, um grande ator?

Acho que se ganhou um melhor ator do que apresentador de programas. Gostava muito de o fazer, mas não era a 'praia' onde estivesse melhor.

'Chegar' ao teatro aos 30 anos é, perante os restantes, chegar tarde e a precisar de provar ainda mais que há talento?

Há 25 anos estar a fazer um musical com... não era 30, eram 28 anos. Fazer um musical daquele tamanho com 28 anos não era uma coisa muito normal. Não era normal alguém que não tinha nome no mercado fazer aquele papel. Toda a gente dizia: "Quem é este Miguel Dias? Como é que ele apareceu para o Filipe La Féria lhe dar esta visibilidade num musical?" E era um musical de sonho, eram 40 pessoas em cena, uma orquestra de 25 músicos. Eram luxos aos quais, hoje em dia, o teatro português já não se pode dar, infelizmente. Tive o privilégio de fazer essa mega, mega produção do Filipe La Féria, que foi inesquecível.

Acho que na altura, mesmo assim, era visto como um miúdo. A prova disso é que fui fazendo sempre, ao longo do meu percurso como ator, papéis de personagens que eram bastante mais velhos. Até em 'Os Produtores', quando fiz o protagonista com o Manuel Marques, o papel tinha sido feito pelo Nathan Lane já ele tinha 50 e muitos anos, eu tinha 35 anos. Possivelmente, fui dos atores mais jovens no mundo a fazer aquele papel, de que muito me orgulho. 

De volta à televisão, o Miguel fez parte de uma série icónica da televisão nacional - a 'Floribella'. 

A 'Floribella' marca a passagem da Teresa Guilherme na SIC como responsável pela ficção. Ela vê numa feira internacional a novela, a versão original, argentina, e decidiu trazê-la para Portugal. A Teresa primeiro convida-me para fazer parte deste projeto e da equipa dela como diretor musical da ficção da SIC.

Muitas das canções da 'Floribella' foram escritas na escadaria da paragem dos comboios no Cais de SodréFoi a sua estreia como diretor musical?

Foi, é verdade. É quando entro na SIC como responsável por toda a parte musical da ficção da SIC. No caso da 'Floribella', fui o pai, digamos assim, de todos os discos, de todas as canções que a Luciana Abreu cantava. Ainda hoje digo a brincar: lembras-te do tema 'Pobres dos Ricos'? Assumo, sou eu o culpado 

A música que ainda hoje está na cabeça de quem cresceu nos anos 2000.

É verdade, é verdade. Muitas pessoas não fazem ideia que fiz todas as adaptações para português das canções da 'Floribella', fui o produtor musical.

Hoje em dia, poderia ser multimilionário se estivessem em causa os direitos de autorEsse tema foi escrito de uma forma algo peculiar, não foi?

Todo esse disco foi escrito de uma forma muito peculiar. Os estúdios eram fora do Lisboa, gravávamos em Bucelas, não tenho carro, nunca tive, apanhava boleias das carrinhas de estúdio e a paragem era no Campo Grande ou no Cais de Sodré. Muitas das canções da 'Floribella' foram escritas na escadaria da paragem dos comboios no Cais de Sodré, à espera das carrinhas, com os fones nos ouvidos, um walkman com o CD da 'Floribella' a tocar e com um caderno a escrever as adaptações das músicas para português. Foram muitas, muitas canções começadas e acabadas às 6h30 da manhã.

Precisamente por serem adaptações, e apesar do enorme sucesso da banda sonora, o Miguel acabou por não lucrar tanto como seria de esperar com este projeto. Correto?

Não me posso queixar de uma parte que recebi. A única coisa é que, em termos de direitos de autor, a autora argentina sempre considerou que as versões portuguesas eram traduções... e não eram. Não tinha nada a ver, se as pessoas ouvirem as músicas argentinas e ouvirem as versões portuguesas, apercebem-se facilmente que não tem nada a ver. Há uma música na Argentina que se chama 'Los Niños No Mueren', que no Brasil também era 'As Crianças Não Morrem'. Ouvi aquilo e pensei, não posso fazer uma música de uma novela e dizer as crianças não morrem. Tive muito trabalho a fazer a adaptação mas, como disse, não me posso queixar do que ganhei com os discos da 'Floribella'. É claro que, hoje em dia, poderia ser multimilionário se estivessem em causa os direitos de autor, mas não estão e não me queixo disso.

Sozinho escrevi mais de 100 letras, três discos da 'Floribella', dois discos das 'Chiquititas', um disco dos Anjos, um disco da 'Rebelde Way'Entre os factos que poucos sabem sobre si está ainda a banda sonora da novela 'Vingança'.  Foi o Miguel quem escreveu todos temas interpretados pelos Anjos neste projeto?

Sim, os Anjos são meus amigos há muitos anos. A Teresa quis ir ainda mais longe, fez pela primeira vez em Portugal um disco conceptual onde tudo era cantado pelo mesmo artista, contando a história da novela e dos vários personagens. Foi esse o ponto de partida para eu escrever as músicas, que também eram argentinas. É mais um quadro que tenho aqui na parede de casa, porque foi um sucesso fantástico. Ainda hoje, quando digo às pessoas: "Estás a ver aquela música, 'Porquê?', fui eu que escrevi". Ninguém faz ideia. 

Qual o sentimento de ser 'a peça escondida' de uma série de sucessos, que muitos nem fazem ideia que são autoria sua?

Na altura, o suposto era eu ser uma peça da engrenagem. Era o autor, é verdade, mas não era quem estava a interpretar, não era quem dava a cara. Fazia parte do meu trabalho e da minha função enquanto diretor musical da SIC. Claro que me deixava muito feliz quando as pessoas reconheciam, isto foi feito pelo Miguel Dias, mas também não era suposto ter esse reconhecimento. O importante era centrar na Luciana Abreu, nos Anjos e principalmente nos formatos - 'Floribella' e 'Vingança'. Ao mesmo tempo, não era um autor mega famoso. Não era a mesma coisa que, hoje em dia, dizer-se que foi o Tony Carreira ou o Toy a escrever o disco de uma novela. Eu não tinha ainda essa visibilidade e esse reconhecimento.

Ainda fiz imensos genéricos para programas e séries, como 'Aqui Não Há Quem Viva', 'Cenas do Casamento', 'Rebelde Way'. Foi um período louco em termos de criatividade obrigatória, foram dois anos, quase três, em que sozinho escrevi mais de 100 letras, três discos da 'Floribella', dois discos das 'Chiquititas', um disco dos Anjos, um disco da 'Rebelde Way'. Guardo com muita saudade essa altura em que a minha casa parecia uma loja de CDs, porque tinha que ouvir as centenas de discos que as editoras me mandavam. Foram três anos de muito trabalho, mas de muito prazer e gozo.

Foram mais de 20 reality shows que escrevi com a Teresa GuilhermeO despertar para a escrita volta a nascer por um desafio proposto pela Teresa Guilherme?

A Teresa sempre me foi, ao longo dos anos, lançando desafios. A primeira vez que dirigi cantores, foi coma Teresa. Dizia-lhe que nunca fiz e ela respondia-me sempre a mesma coisa: há sempre uma primeira vez. Foi assim também que nasceu o primeiro guião que escrevi com a Teresa.

Ligou-me a dizer que ia apresentar um programa chamado 'Momento da Verdade' e que precisava de alguém para escrever com ela. Foi a partir daí que ganhei o gosto de escrever guiões, nunca mais parei, perdi a conta aos reality shows que escrevi.

Os icónicos trocadilhos.

Exatamente, os icónicos trocadilhos, que a Teresa muitas vezes já dizia: "Não, isto não foi eu, foi o Miguel Dias que escreveu". Eu ainda gostava mais de trocadilhos do que a Teresa, levava os trocadilhos ao limite. 

Foram, seguramente, mais de 20 reality shows que escrevi com a Teresa. Os primeiros 'Big Brothers' não fui eu que escrevi, começo a escrever com a Teresa a partir do 'Secret Story 2'. É um trabalho que é uma coisa de doidos. A partir do momento em que aceitava escrever os guiões, deixava de ter vida. A minha vida passava a ser a vida dos concorrentes.

Escrevi guiões do 'Secret Story' na parte de trás do carro da Teresa Guilherme porque alguém se tinha passado. São tempos gloriosos

Como é que funcionava esse trabalho de bastidores?

Aprendi com a Teresa que a dedicação aos reality shows tinha de ser a 100%. As pessoas não imaginam o que é para uma equipa de escrita, que tem que escrever uma gala que resume a semana toda, eu de 4 em 4 horas recebia um apanhado, um relatório de tudo o que se tinha passado na casa. A gala de domingo, as pessoas não imaginam que implicava 30 horas de escrita.

Ia para a casa da Teresa à sexta-feira, à tarde, e fechávamos o primeiro alinhamento. Na sexta-feira à noite começávamos a escrever o guião, passávamos o sábado inteiro a escrever. Era uma média de 30, 32 horas até termos o guião final. Era um exercício de loucos, mas também um trabalho que agradeço muito à Teresa ter feito. Era tudo para ontem, escrevi guiões do 'Secret Story' na parte de trás do carro da Teresa, a caminho da casa da Venda do Pinheiro, porque alguém se tinha passado ou batido. São tempos gloriosos de trabalho.

As galas do domingo, na altura da Teresa, tinham bastante mais 'sumo' do que as galas hoje em diaAcha que hoje em dia faz falta a existência de um guionista a trabalhar em conjunto com os apresentadores de reality shows?

Não existe e acho que faz falta. É a minha opinião, não é uma crítica, de maneira nenhuma, nem à Cristina, nem ao Manuel Luís Goucha, nem ao Cláudio Ramos que optam por fazer o programa assim. É uma opção deles, eles consideram que não é importante e que se pode fazer o programa mais na base do improviso. São visões que respeito, mas o que acho é que as galas do domingo, na altura da Teresa, tinham bastante mais 'sumo' do que as galas hoje em dia.

Ainda hoje no TikTok vejo os inesquecíveis confessionários da Cátia Palhinha, de concorrentes que ficaram na história do 'Secret Story' muito por aquilo que se brincava com eles. Isso era o guião, a criação, que permitia.

Há algum trocadilho desses tempos que lhe tenha ficado na memória?

Lembro-me de uma abertura do programa 'A Quinta', que era algo como: ovelhas ou novas. Era um texto que tinha 22 trocadilhos com os animais todos da quinta. Aquilo dava muito trabalho, mas divertia-nos muito. 

Começa a cair por terra a ideia pré-concebida de que a revista está ultrapassada, não tem público. Não é verdade

O Miguel continua hoje a apostar na escrita, tem neste momento três peças de teatro da sua autoria em cena. 

É verdade, é verdade.

E uma delas, precisamente, com interpretação de Teresa Guilherme. 

'As Vaginas e Eu' foi escrita por mim e pela Teresa, e encenada por mim. Além dessa peça, escrevi em parceria com o Flávio Gil e Renato Pinto a revista do Parque Mayer, em cena no Maria Vitória, 'E Ninguém Vai Preso', e uma comédia que está em cena na Academia de Santo Amaro, 'Amo-te Tanto Que Te Odeio'. É bom sentir que são três espetáculos que estão a ter muito público e que as pessoas gostam, isso é o melhor de tudo.

Fazer comédia é muito mais difícil do que fazer dramaEm relação ao teatro de revista, ainda existe o tão falado preconceito relativamente a este género?

Sim. Mas é com muito orgulho que enquanto guionista, que escreve há oito anos para o Maria Vitória, que digo que essa ideia, essa má vontade das pessoas em relação à revista, está a cair por terra. Basta ver os números desta revista, o 'E Ninguém Vai Preso?' está há cinco meses em cena, tem mais de 50 mil espectadores e 120 escurões que já vieram de todo o país. Assim começa a cair por terra a ideia pré-concebida de que a revista está ultrapassada, não tem público e o público da revista, o pouco que há, são tudo velhos. Não é verdade.

Outro rótulo difícil de cair é o de 'ator de comédia'. Quando se fazem maioritariamente papéis de cómicos, torna-se mais difícil receber convites para outros géneros?

É, é difícil existirem convites para fazer outras coisas. Quando fiz 'Beirais', como durou tanto tempo, havia episódios em que o centro da história daqueles cangalheiros não era cómico, era mais dramático, mais pesado. Muitas vezes apanhei a equipa no final das cenas que fiz com o Heitor Lourenço a surpreender-se com a minha capacidade de fazer mais do que comédia. Fazer comédia é muito mais difícil do que fazer drama. Acabou por acontecer estar mais ligado à comédia e optar pelo caminho mais difícil, porque é muito mais difícil fazer uma pessoa rir do que levar uma pessoa à emoção.

Faz parte desta profissão, é isso que a torna tão apaixonante e, ao mesmo tempo, faz com que todos os dias pense em desistirO descrédito que acaba por existir em relação aos atores de comédia não causa um sentimento de ingratidão?

É ingrato, é ingrato. Por exemplo, fazer revista é fazer cinco, seis bonecos num espetáculo de duas horas, onde temos sete minutos para provar aquilo que somos capazes. É muito, muito difícil. A revista é dos géneros teatrais mais difíceis de fazer, porque dentro da revista cabe tudo. 

Acha que é por estar associado aos papéis cómicos que faltam convites para fazer televisão?

Talvez, acho que são marés. Há alturas em que tudo acontece ao mesmo tempo e outras em que não acontece nada. Faz parte desta profissão, é isso que a torna tão apaixonante e, ao mesmo tempo, faz com que todos os dias pense em desistir. 

Não vim para esta profissão pela fama e reconhecimentoJá sentiu que a sua imagem, ser 'o gordinho', como já o disse, motiva essa falta de convites para o pequeno ecrã?

Sim, é possível. Há alturas em que isso é um peso horrível e não acontece, porque se é mais gordinho, porque se tem barba, e noutras alturas dá imenso jeito ser gordinho e ter barba. São modas, acredito é que há uma moda que nunca passa: a capacidade de exercer a profissão. Sempre fui entregue a 100% à minha profissão.

Estar 'escondido' atrás de tantos sucessos fá-lo sentir que ainda não teve o reconhecimento que gostaria?

Não vim para esta profissão pela fama e reconhecimento. Obviamente, sabe bem as pessoas reconhecerem que fizemos um bom trabalho, mas não é o foco principal. O foco é saber que as pessoas gostaram. Haverá sempre um dia em que vou cruzar-me com essas pessoas, que não sabem, e vão descobrir que fui eu que escrevi, que fiz. 

Falava-me há pouco das frustrações e dificuldades da vida de ator, mas escolheu uma companheira que também é artista [coreógrafa e bailarina]...

É verdade. Um mal nunca vem só. Quando for para todos termos trabalho, todos temos e quando for para estarmos todos sem trabalho e aflitos para pagar as contas, ao menos, também estamos juntos nisso. Ainda não somos casados, vamos casar-nos este ano, mas estamos juntos na alegria e na tristeza, na saúde e na doença e também na riqueza e na pobreza. 

Vão casar-se este ano?

É verdade, é verdade. Em junho vamos casar-nos. 

Notícias ao Minuto Miguel Dias com a companheira, Lucila Pereira, coreógrafa e bailarina© Reprodução Instagram - Miguel Dias  

No que respeita à vida profissional, quais os planos para o futuro?

A coisa mais sensata nesta profissão é não fazer planos e dedicar-me a 100% a tudo o que faço. À partida, irei continuar no Parque Mayer para escrever uma nova revista... Depois, virá o que tiver de ser. 

O que é que ainda lhe falta fazer?

Falta-me fazer muita coisa, mas se me perguntar o quê não lhe sei dizer. Falta-me fazer coisas que me criem empolgamento, quer a nível criativo, quer como ator.

O rapaz que na adolescência fazia sucesso nos Mercuriocromos, alguma vez achou que chegaria até aqui?

Não, de maneira nenhuma e é isso que me surpreende quando olho para trás e vejo tudo o que fiz nestes 30 anos. As páginas deste livro são principalmente trabalho. Trabalhei muito e intensamente, mas nunca imaginaria que a três meses de fazer 50 anos olhasse para trás e visse tudo o que já fiz, tudo o que já conquistei.

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