Após o anúncio da morte do pintor e ceramista português Manuel Cargaleiro, este domingo, aos 97 anos, várias foram as reações de várias personalidades políticas, que destacaram a "intensa atividade artística", "obra" e o prestígio dado a Portugal.
O primeiro foi o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que homenageou Cargaleiro através de uma nota publicada no site oficial da Presidência da República, dando conta que "hoje nos deixou", contudo, "nunca deixou que o cosmopolitismo significasse desenraizamento".
"Prova disso é a memória das imagens e das cores da Beira Baixa na sua obra, nomeadamente a lembrança das mantas de retalhos; prova disso igualmente a empenhada presença do artista na região onde nasceu, através da Fundação e do Museu Cargaleiro", lê-se na nota oficial, relembrando o "último encontro" entre os dois, "semanas atrás, na casa deste em Lisboa, em que continuava a sonhar projetos para o futuro e a acreditar na vida, sempre prestigiando Portugal".
O primeiro-ministro Luís Montenegro manifestou o seu "profundo pesar" pela morte Manuel Cargaleiro, que classificou de "artista multifacetado, conhecido do grande público sobretudo pela sua obra como pintor e ceramista".
Além disso, numa nota enviada às redações, foi anunciado que o Governo vai decretar um dia de luto nacional para "o dia das cerimónias" fúnebres do artista plástico.
A ministra da Cultura, Dalila Rodrigues, assinalou a "intensa atividade artística" que "se traduz num legado essencial para a arte portuguesa".
"Manuel Cargaleiro deixa um legado ímpar, cruzando referências e gerações", diz a nota de pesar de Dalila Rodrigues, assinalando que Cargaleiro, nascido em 1927, em Chão das Servas, Vila Velha de Ródão (distrito de Castelo Branco), criou a fundação com o seu nome em Castelo Branco, cujo Museu mostra a sua obra, incluindo a extensa coleção de cerâmica.
Também o presidente da Câmara Municipal de Castelo Branco, Leopoldo Rodrigues, recebeu a notícia da morte do mestre Cargaleiro "com enorme pesar e consternação" e sublinhou que o município vai decretar três dias de luto municipal.
"O dia de hoje é um dia de pesar, de tristeza e é também um dia que serve para refletir sobre o sentido da vida", afirmou o autarca à agência Lusa, considerando ainda que o ceramista foi uma figura maior da cultura nacional e albicastrense.
A Câmara Municipal de Lisboa também prestou uma "sentida homenagem" ao artista nas suas redes sociais.
"Pintor e ceramista, reconhecido em todo o mundo, deixou a sua assinatura em igrejas, jardins, estações de metro e em muitas peças. Recebeu a Medalha de Honra da cidade em 2022", pode ler-se numa publicação na rede social X.
#Lisboa presta sentida homenagem ao Mestre Manuel Cargaleiro. Pintor e ceramista, reconhecido em todo o mundo, deixou a sua assinatura em igrejas, jardins, estações de metro e em muitas peças. Recebeu a Medalha de Honra da cidade em 2022. Morreu hoje, 30 de junho. Tinha 97 anos. pic.twitter.com/gR0TShRPQr
— Lisboa (@CamaraLisboa) June 30, 2024
A Câmara Municipal do Seixal também manifestou "profundo pesar" pela morte de Cargaleiro e enfatizou as suas "fortes ligações ao Seixal".
"O mestre Manuel Cargaleiro é autor de uma obra que tem percorrido o mundo e um dos mais conceituados e internacionais artistas plásticos portugueses. Com a Oficina de Artes Manuel Cargaleiro, o mestre regressou ao Seixal e, em particular, à Quinta da Fidalga, local de onde guarda memórias e vivências da sua infância e juventude, quando residiu na margem sul em virtude de o pai ter sido administrador da Cooperativa Agrícola de Almada e Seixal e o primeiro Provedor da Santa Casa de Misericórdia do Seixal", destacou o município num comunicado a que o Notícias ao Minuto teve acesso.
A empresa Viúva Lamego, para a qual o pintor e ceramista Manuel Cargaleiro colaborava desde 1949, expressou enorme pesar pela partida do seu "operário mais antigo".
"Hoje partiu um dos nossos. Fica a enorme saudade amaciada pela nossa memória coletiva do sorriso que a todos conquistava, a simpatia e amizade, sempre acompanhadas pelo cuidado, o rigor e a excelência", lembra a empresa, em comunicado, indicando tratar-se de "um legado" de que muito se orgulha.
O ex-presidente da República, Cavaco Silva, disse ter-se despedido de "um grande amigo".
"Manuel Cargaleiro deixou-nos só fisicamente, porque artistas como ele nunca morrem. Vidas longas ou curtas, as que importam são as que deixam marcas. Nós, para lá do grande e único artista, despedimo-nos também de um grande amigo, que esteve muito presente em vários momentos importantes da nossa vida", afirmou Cavaco Silva numa nota também assinada pela sua mulher Maria Cavaco Silva.
O secretário-geral do Partido Socialista (PS), Pedro Nuno Santos, assinalou que o artista "não foi apenas um grande ceramista e pintor, mas um inovador, com merecido reconhecimento internacional", manifestando o seu "profundo pesar e homenagem" e transmitindo "as mais sentidas condolências" à sua família e amigos.
O ex-líder parlamentar do Partido Socialista (PS), Eurico Brilhante Dias, destacou que Cargaleiro é "uma referência como ceramista" e "um vulto único das artes portuguesas".
"Tem o seu museu em Castelo Branco, onde o conheci. Um vulto único das artes portuguesas, que passou pela Escola António Arroio, antes de partir para Paris.
Morreu o Mestre Manuel Cargalareiro. Aos 97 anos. Um referência como ceramista. Tem o seu museu em Castelo Branco, onde o conheci. Um vulto único das artes portuguesas, que passou pela Escola António Arroio, antes de partir para Paris.
— Eurico BRILHANTE DIAS (@BrilhanteDias) June 30, 2024
A deputada do Bloco de Esquerda (BE), Joana Mortágua, deixou uma breve mensagem na rede social X (antigo Twitter).
"RIP mestre Cargaleiro", pode ler-se.
RIP mestre Cargaleiro
— Joana Mortágua ️️️ (@JoanaMortagua) June 30, 2024
Por fim, a viúva de Cargaleiro, Isabel Brito da Mana, declarou que o marido "morreu tranquilo, rodeado pelos seus, adormeceu", numa breve declaração à Lusa.
A Fundação Manuel Cargaleiro reagiu à morte do seu fundador, afirmando que "o céu ganhou ainda mais azul", numa mensagem publicada na sua página na rede social Facebook.
A instituição que criou o Museu Manuel Cargaleiro em Castelo Branco, e tem à sua guarda um acervo de cerca de dez mil obras do pintor e ceramista, garante que a obra transcendente do mestre, como a define, "fica para sempre". Assim, agradece-lhe por continuar a "acrescentar luz, cor e poesia aos nossos dias".
Por seu lado, o artista Vhils escreve "Obrigado, Mestre", na sua página no Instagram, ao mesmo tempo que publica imagens do artista e do trabalho conjunto que desenvolveram no ano passado para o Museu Manuel Cargaleiro.
A Fundação Calouste Gulbenkian publicou um vídeo sobre o artista, em que conjuga as suas palavras com imagens das suas obras. "Eu nasci para Paris com a Fundação Gulbenkian", afirma Cargaleiro neste vídeo, recordando os seus tempos de bolseiro na cidade onde viria a fixar-se e a obter reconhecimento internacional.
A Gulbenkian reproduz estas palavras de Cargaleiro "com orgulho", recordando "a sua extraordinária carreira". Cargaleiro está representado na Coleção do Centro de Arte Moderna da fundação com mais de sete dezenas de obras, onde os elementos da natureza, como as flores, são os mais presentes.
O Museu Nacional de Arte Contemporânea também lamenta a morte do autor de "Ruínas da Grécia" e de "Le départ de l'ombre", reconhecendo a importância da sua obra, assim como o Museu Nacional Soares dos Reis que o define como "nome de referência da arte portuguesa [...] a nível internacional", e adiantando que obras do artista entraram recentemente no seu acervo, através da "doação de uma coleção de arte privada".
O Museu Nacional do Azulejo fala de "um dos nomes maiores do panorama artístico nacional e, em particular, da cerâmica portuguesa". O museu recorda alguns dos seus trabalhos em cerâmica e que o artista se "considerava o operário mais antigo da [fábrica de azulejos] Viúva Lamego, onde tinha atelier desde a década de 1940".
Quem foi o Mestre Manuel Cargaleiro?
O artista plástico nasceu em 16 de março de 1927 em Chão das Servas, no concelho de Vila Velha de Ródão, no distrito de Castelo Branco.
A sua obra foi fortemente inspirada no azulejo tradicional português. Em 1949, ingressou na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa e participou na Primeira Exposição Anual de Cerâmica, no Palácio Foz, em Lisboa, onde realizou a sua primeira exposição individual de cerâmica, no ano de 1952.
No início de carreira, ainda na década de 1950, recebeu o Prémio Nacional de Cerâmica Sebastião de Almeida, e o diploma de honra da Academia Internacional de Cerâmica, no Festival Internacional de Cerâmica de Cannes, em França, numa altura em que iniciara funções de professor de Cerâmica na Escola de Artes Decorativas António Arroio e apresentara as suas primeiras pinturas a óleo no Primeiro Salão de Arte Abstrata.
Nas décadas de 1960 e 1970, participou em exposições individuais e coletivas e durante este período afirmou-se não apenas como conceituado ceramista, mas também como desenhador e pintor. Nos anos 1980 começou a explorar a tapeçaria.
A partir da década de 1990, predominariam na sua obra os padrões aglomerados e cromaticamente intensos onde continuaria a ser evocado o azulejo português.
Em Castelo Branco, viria a ser inaugurada a Fundação Manuel Cargaleiro, em 1990, depois expandida com o respetivo museu e mais tarde, no Seixal, distrito de Setúbal, a Oficina de Artes Manuel Cargaleiro.
No último ano teve patente as exposições "Eu Sou... Cargaleiro", no Mosteiro de Ancede - Centro Cultural de Baião, no distrito do Porto, uma mostra de pintura na Casa Museu Teixeira Lopes - Galerias Diogo de Macedo, em Vila Nova de Gaia, intitulada "Cargaleiro, Pintar a Luz Viver a Cor", e uma exposição de gravura no Fórum Cultural de Ermesinde, em Valongo, de nome "A essência da cor". Este ano levou obras nunca expostas à sua oficina, no Seixal.
O ceramista recebeu, em Paris, em 2019, a medalha de Mérito Cultural do Governo português e a Medalha Grand Vermeil, a mais alta condecoração da capital francesa, onde viveu grande parte da sua vida.
Na altura, foi também inaugurada a ampliação da estação de metro de Champs Elysées-Clémenceau, com novas obras de Manuel Cargaleiro, depois de originalmente concebida e totalmente decorada pelo artista português, em 1995, incluindo o painel em azulejo "Paris-Lisbonne".
Em 2017, no exato dia do seu 90.º aniversário, foi condecorado com a Grã-Cruz da Ordem do Infante Dom Henrique.
[Notícia atualizada às 19h02]
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