"Estar desprendido e não ter obrigação de gravar também nos libertou"

Os Trêsporcento estão de volta com um novo disco, que saíra ainda este ano, depois de terem lançado 'Território Desconhecido' em 2017. Já deram a conhecer o primeiro single deste novo trabalho, 'Dedicados', e 'prometem' que este é um álbum com "temas completamente diferentes uns dos outros".

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© Iolanda Pereira

Marina Gonçalves
11/04/2025 08:43 ‧ há 2 dias por Marina Gonçalves

Cultura

Trêsporcento

Foi há 14 anos, em 2011, que os Trêsporcento lançaram o primeiro álbum, 'Hora Extraordinária' (com temas como 'Elefantes Azuis'), seguindo-se quase de seguida o segundo trabalho, 'Quadro', em 2012, e depois 'Território Desconhecido', em 2017. Entre estes discos, também lançaram um registo ao vivo, 'Lotação 136', gravado no Teatro Aberto em 2014. 

 

Após o lançamento do último álbum, ainda chegaram a "gravar material para o arranque de um novo trabalho, em formato alargado, com a contribuição de músicos que acompanharam a banda em palco ao longo dos anos". No entanto, e com a chegada da pandemia da Covid-19, esse trabalho acabou por ser deixado de lado. Ainda assim, garantem em conversa com o Notícias ao Minuto, nunca estiveram propriamente afastados enquanto grupo. 

Aliás - como explicaram também durante a entrevista - esse trabalho acabou por ser agora reaproveitado neste novo disco, que saíra ainda este ano. 

A nossa banda só existe se formos os cinco

Estão de volta com um novo álbum, que saíra ainda este ano. Por isso, começo por perguntar o porquê deste regresso agora? Como é que sucedeu este novo 'reencontro'?

Lourenço Cordeiro (LC): Acho que não demorámos tanto tempo a fazer coisas novas porque, como para toda a gente, a altura da Covid, houve ali uns anos que passaram um bocado de pressa e nós não nos apercebemos. O nosso baterista [António Moura] estava a dizer que foi só quando viu umas das notícias que saiu entretanto, ele estava surpreendido por ter passado oito anos desde o último disco. Ele não se tinha apercebido.

Houve ali uma altura que sim, que nos apercebemos que gostávamos de fazer alguma coisa, mas não havia ninguém que estivesse a puxar por isso, necessariamente. Tivemos dois convites para tocar em, talvez, três anos, e que nos chamou a atenção para isso. Apesar de nós não termos gravado nada recentemente, nessa altura, mesmo assim, ainda haviam pessoas que nos estavam a convidar para concertos. Tivemos uma conversa sobre o que é que queríamos, se queríamos gravar coisas novas ou não. Apercebemo-nos que se a resposta fosse não naquela altura, se calhar, isso podia dizer que a banda tinha chegado ao seu fim natural.

A banda só existe connosco, os cinco. Apesar de colaborarmos com outras pessoas, não estamos muito habituados a ter composições muito fluidas. Há certas bandas que duram muitos anos, mas que, no fundo, têm um grupo de músicos que podem entrar e sair. Nós não. A nossa banda só existe se formos os cinco. E nessa altura chegámos à conclusão que sim, que todos queríamos e estávamos cheios de vontade de fazer coisas novas.

Tem demorado o seu tempo, o disco está quase todo gravado. Entretanto, saiu este single que lançámos ['Delicados']… Mas a razão foi mais o deixar passar o tempo e não haver nenhuma razão, ninguém que tivesse um conjunto de canções que quisesse gravar.

Tiago Esteves (TE): Sim, mas acrescento que, durante estes oito anos, nunca desaparecemos como banda. Somos amigos, mantivemos o contacto e, embora mais esporadicamente, continuámos a ensaiar e a fazer coisas, a desenvolver músicas… Não ao ritmo que tínhamos desenvolvido, nem com a intensidade suficiente para se conseguir juntar um conjunto de canções que merecessem ser gravadas. Mas a banda nunca desapareceu e sempre esteve com atividade. 

Vocês enquanto grupo mantiveram sempre o contacto, aliás, até tinham algum trabalho preparado um bocadinho antes da pandemia, mas acabaram por achar que não fazia sentido dar continuidade…

TE: Fizemos uns testes, umas gravações, acho que foram dois temas que fomos gravar na Black Box, do CCB, na altura até se juntou a nós o João Gil… Mas acabámos por não gostar muito do resultado. As músicas que tínhamos para trabalhar também achávamos que não estavam completamente estabelecidas. Portanto, a coisa acabou por ficar ali um bocadinho morta.

LC: E depois veio a pandemia, logo a seguir.

TE: Duas dessas músicas foram reinterpretadas e vão estar neste disco que vamos lançar este ano.

Vão reaproveitar esse trabalho…

TE: Exatamente! Acabou por não ser um trabalho perdido, mas, no fundo, foi um primeiro passo para este disco que sai agora.

O estar desprendido e não ter a obrigação de gravar nada também é uma coisa que nos libertou bastante. Acima de tudo, a vontade de fazer faz com que a pessoa seja mais criativa, e a vontade de estarmos juntos também

Além de se manterem em contacto enquanto grupo e de não terem estado efetivamente separados nestes oito anos, também fizeram outras coisas a solo, como o caso do Tiago Esteves, que até lançou o segundo disco (a solo) em 2022, 'O Alpinista'...

TE: Sim, já gravei dois, mais um disco ao vivo e agora há de sair o terceiro.

E o Lourenço Cordeiro está no Luxemburgo. É por alguma razão profissional? 

LC: Vivo cá há 10 anos por uma questão profissional e de família também. Quando vim para cá, achávamos que isso ia ser, ou causou um problema. Os Trêsporcento chegaram a dar vários concertos com músicos que me substituíram, e entretanto isso corria tão bem que mesmo naqueles onde eu ia eles também participavam. Portanto, a banda alargava-se. Houve ali uma altura que achámos que isso era um [problema], que a banda tinha que se reinventar porque eu já não estava aí a tempo inteiro. Mas hoje em dia, felizmente, as ligações são muito fáceis e tenho ido muito frequentemente a Portugal e participado nos ensaios, gravações…

Mas o Lourenço está no Luxemburgo também a trabalhar enquanto músico?

LC: Não. Para além da música, sou arquiteto. Vim para o Luxemburgo não tanto por mim, mas pela minha mulher e pela minha família. E continuamos cá. 

Sabemos que o que soa a Trêsporcento é a música que nós os cinco fazemos em conjunto, seja o que for. Isso dá uma liberdade muito grande e o resultado é bastante mais interessante

O que é que este tempo desde o último álbum - em 2017 - em que estiveram a fazer outras coisas a solo (também) trouxe à vossa bagagem enquanto músicos, e que acrescentou neste novo disco?

TE: A bagagem foi sendo criada com os discos que gravamos. Cada disco é uma aprendizagem e é uma altura em que experimentamos se funciona ou não. Nós já vimos com os nossos discos anteriores e já com ideias de querer fazer as coisas de maneira diferente, ou testar outras coisas, ou voltar a uma fase em que, se calhar, éramos mais criativos e tínhamos menos barreiras estéticas ou coisas que adulterassem o processo criativo.

O estar desprendido e não ter a obrigação de gravar nada também é uma coisa que nos libertou bastante. Acima de tudo, a vontade de fazer faz com que a pessoa seja mais criativa e a vontade de estarmos juntos também. Como estivemos pouco tempo juntos durante estes anos, também ajuda a que a coisa surja de maneira mais orgânica. Não foi uma aprendizagem, mas acabou por ser um resultado que se vai refletir neste disco.

LC: O que o Tiago disse agora é muito importante. Houve ali uma altura - se calhar depois de termos gravado o primeiro e o segundo álbum, que foram gravados muito perto um do outro - que sempre que queríamos fazer coisas novas estávamos preocupados se aquilo soava a Trêsporcento. Muitas vezes havia qualquer coisa que nascia e depois alguém dizia: ‘Mas isso não sei se soa a Trêsporcento’. Isso é uma coisa que não nos preocupa minimamente hoje em dia, porque sabemos que o que soa a Trêsporcento é a música que nós os cinco fazemos em conjunto, seja o que for. Isso dá uma liberdade muito grande e o resultado é bastante mais interessante.

Este conjunto [de músicas] - acho que vão ser 10 canções neste disco, se elas sobreviverem todas ao corte final [risos] -, vão ser muito heterogéneas, vão haver coisas diferentes por causa disso, porque não estamos preocupados em produzir uma música que tenha um resultado pré-concebido à partida. E isso é muito libertador. 

Quando o disco é gravado, seja qual for, isso não significa que aquela música esteja sedimentada para todo o infinito, elas depois ao vivo ganham vida própria

Neste novo disco têm mais liberdade e não estão tão apegados em manter o registo dos Trêsporcento…?

TE: Sim! No fundo é trabalhar as canções pelas canções, e por aquilo que nos dá gozo. Essencialmente, é aquilo que juntos achamos que resulta sem tentar perceber se aquilo vai funcionar em disco, ou se as pessoas vão gostar… O que interessa é o gozo que nos dá e a energia.

LC: Ao longo dos anos também nos apercebemos que o que nos dá mais prazer é tocar ao vivo. E, talvez por isso, há muita coisa que evolui. Quando o disco é gravado, seja qual for, isso não significa que aquela música esteja sedimentada para todo o infinito, elas depois ao vivo ganham vida própria. Até foi uma das razões que nos levou a gravar aquele disco ao vivo, depois dos dois primeiros, porque queríamos mostrar um bocado isso. Neste disco, sinto que é um conjunto de canções que nos vai apetecer muito tocar ao vivo. É uma coisa que me está a entusiasmar muito.

Dez temas completamente diferentes uns dos outros. A escrita é parecida, mas os arranjos, acabámos por ter uma interpretação específica para cada uma das músicas que vamos apresentar

Já lançaram o tema 'Dedicados', mas ainda nos falta conhecer nove canções porque, "se tudo correr bem", este novo disco será composto por dez músicas. Em termos de letras de música e de 'arranjo musical', o que podemos esperar dos próximos temas que estão para ser lançados?

TE: Acima de tudo, dez temas completamente diferentes uns dos outros. A escrita é parecida, é a minha, portanto, não varia muito de música para música o texto, mas os arranjos, acabámos por ter uma interpretação específica para cada uma das músicas que vamos apresentar. Embora, como é lógico, há denominadores comuns, que são os sons das guitarras, os próprios sons que cada um de nós tira do instrumento, e os sons que nós gostamos, porque no fundo não somos assim tão variados nas nossas escolhas.

LC: Não sei se este conjunto de canções é assim tão diferente, para nós é. Se calhar para quem ouve de fora, elas vão soar a Trêsporcento porque quando nós nos juntamos a fazer música soa a Trêsporcento. Mas pelo menos a carga emocional de cada canção é muito diferente entre as elas. E a razão pela qual chegámos [a estes anos enquanto banda] foi aquilo que foi sobrevivendo à sala de ensaio. No fundo, se calhar houve outras coisas que fizemos e que morreram porque passado dois meses parte da banda já não tinha interesse em tocar… Isto é quase como um bebé, quase como uma ninhada em que os que sobreviveram foram os que tiveram mais força para sobreviver à vontade de cinco pessoas diferentes.

TE: Sobreviveram ao tempo e à repetição.

LC: E a cinco sensibilidades - não é que sejam muito diferentes. Não somos assim tão diferentes uns dos outros nos nossos gostos musicais, mas são cinco pessoas diferentes e somos uma democracia. Tirando as letras que são feitas pelo Tiago, e sempre foram, musicalmente somos quase uma democracia absoluta. Se alguém não quer, não gosta de tocar alguma coisa, geralmente essa coisa morre.

Sou bastante otimista, acho que antes do verão o disco está acabado

Em março apostaram numa página 'fresca' de Instagram para promover este novo disco. Hoje em dia é quase crucial estarem nas redes sociais, e para vocês faz sentido estarem presentes e ativos? 

LC: Quando nós aparecemos, a rede social que mais tinha crescido era o Facebook. Tínhamos uma página do Facebook e éramos muito ativos ali, e foi uma comunidade que chegou ali à volta daquilo. Agora, quando começámos a pensar como é que havíamos de promover este novo trabalho, chegámos à conclusão que houve, nestes anos, uma mudança da atenção das pessoas no Facebook mais para o Instagram, ou até para outras redes sociais que não usamos.

Sempre tivemos uma página de Instagram só que não era usada há sete ou nove anos. E agora, basicamente, fizemos um esforço para ela ter conteúdo mais interessante e é mais por aí que tem vindo até o feedback que temos tido. Portanto, acho que isso é inevitável hoje em dia.

Quais são os vossos planos, o que é que está em cima da mesa para este regresso com o novo álbum? Já têm algum concerto planeado? 

TE: Concertos estamos sempre prontos para tocar, não depende de nós, depende dos convites. Não temos nada, para já, agendado em nome próprio. Ainda não estamos a pensar num concerto de lançamento do disco, isso, se calhar, mais provavelmente para o fim do ano. Diria que iremos lançar um segundo single em breve, mas ainda não decidimos qual será. Estamos a fazer o percurso natural, ir lançando as coisas, dando entrevistas como esta e ir tocar onde for preciso – e onde nos chamarem, nós vamos estar. Estamos sempre disponíveis para tocar ao vivo.

LC: A nossa energia, neste momento, está concentrada em acabar o disco. Ainda não sabemos como é que ele vai ser acabado, no sentido em que não sabemos qual é que vai ser o resultado final, sabemos o que é que temos para fazer… Neste momento queremos primeiro acabar o disco e depois logo saber.

Mas o disco vai mesmo sair este ano, ou ainda se pode alargar a data de lançamento? 

TE: Sou bastante otimista, acho que antes do verão o disco está acabado. Sim, sairá ainda este ano, provavelmente depois do verão, por inteiro. 

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