"Apesar de a escala do fardo diferir fortemente consoante os países, é genericamente cerca de duas vezes e meia maior do que há uma década, o que significa que para um país médio de baixo rendimento, essa percentagem [da dívida sobre as receitas] subiu de 6% para 14%, e até de 9% para 25% nalgumas economias", disse o FMI.
Na nota, assinada pela diretora da divisão de dívida no departamento de estratégia, políticas e análise, Allison Holland, e pela diretora do departamento, Ceyla Pazarbasioglu, as autoras vincam que este é um dos indicadores fundamentais na análise da sustentabilidade da dívida, "que sinaliza se um país está em risco de precisar de apoio financeiro do FMI ou em risco de falhar um pagamento da dívida", e apontam que a pressão de financiamento proveniente dos elevados juros, para além do ritmo com que os países mais pobres precisam de pagar essa dívida, está a apertar os orçamentos.
"Isto impede os países de gastarem mais nos serviços essenciais ou em investimentos críticos para atrair investimento, criar empregos, melhorar a prosperidade e criar um clima resiliente", alertaram.
No artigo publicado no 'site' do FMI, as autoras afirmaram que os países de baixo rendimento, entre os quais se incluem todos os lusófonos em África (Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Moçambique), com exceção de Angola e Guiné Equatorial, vão precisar de refinanciar cerca de 60 mil milhões de dólares, mais de 55 mil milhões de euros, todos os anos, o que é três vezes mais que a média na década que acabou em 2020.
Chamando a atenção para a grande quantidade de concorrência na captação de fundos externos, incluindo de economias avançadas que estão também a tentar adaptar-se às alterações climáticas, estas especialistas alertam: "Há um significativo risco de uma crise de liquidez, ou seja, um falhanço na obtenção de financiamento suficiente a um custo aceitável, o que pode, por seu lado, levar a uma desestabilizadora crise da dívida".
Na opinião de Allison Holland e Ceyla Pazarbasioglu, esta dificuldade de aceder a crédito a preços acessíveis decorre do aumento do endividamento e dos défices para mitigar o impacto da pandemia de covid-19, do aumento das taxas de juro por parte dos bancos centrais e da subida do recurso a credores privados, que representam agora cerca de um terço do total, quando dantes o crédito fornecido por investidores privados representava apenas um quinto do total da dívida destes países de baixo rendimento.
"Estas alterações aumentaram não só os custos de financiamento, mas também a vulnerabilidade a choques financeiros globais", alertaram, apontando como soluções para esta possível crise da dívida o recurso a doações ou a financiamento concessional, como aquele oferecido pelos bancos multilaterais de desenvolvimento, como o próprio FMI, e a implementação de reformas económicas.
"Construir resiliência obriga os países a agir, e alguns já fizeram progressos, como Angola, Gâmbia, Nigéria e Zâmbia, que deram passos para implementar reformas nos subsídios energéticos que criam espaço para despesas de desenvolvimento, mas muitos estão ainda atrasados, especialmente nos esforços para aumentar a base tributária", dizem as autoras, sublinhando que, em média, um país da África subsaariana angaria apenas 13% do PIB em receitas em 2022, o que compara com 18% noutras economias emergentes e 27% nos mercados avançados.
As limitações no financiamento, concluíram, têm de ser bem acompanhadas, porque um cenário onde o financiamento barato acontece é possível, mas também há cenários que mostram a necessidade de reformas mais ambiciosas, cooperação internacional mais forte, e melhoramentos mais rápidos na arquitetura global de reestruturação da dívida, para garantir que as economias emergem da crise mais fortes e mais resilientes.
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