A inversão da pirâmide demográfica é considerada um dos maiores desafios deste século. Por cá, o número de pessoas a atingir os 100 anos aumentou 77% na última década, para quase três mil cidadãos centenários em 2022, segundos a Pordata. Todavia, dados do Eurostat (relativos a 2020) revelam que Portugal é dos países da União Europeia onde a resposta à população idosa é mais escassa. Foi a pensar nisto que nasceu a Hug, que já presta apoio a mais de 100 idosos.
Promover a mudança de mentalidades em relação à velhice, evitando o isolamento e mostrando que a terceira idade pode ser uma fase alegre, saudável e ativa da vida, é a principal missão do projeto, que assinala a entrada do grupo Ó Capital no mercado do apoio ao envelhecimento. Além dos serviços disponíveis durante 24 horas, a Hug conta com duas lojas e, até ao final do ano, pretende abrir as portas de um clube.
"Partimos, convictos, da premissa de que não há nada como envelhecer em nossa casa, envolvidos pela familiaridade do nosso bairro, dos nossos amigos e de tudo o que compõe a nossa vida", afirma a CEO do projeto, Rita Correia Mendes, ao Lifestyle ao Minuto. Lamenta, no entanto, que continuemos a viver numa sociedade que invalida os idosos. "O idadismo infelizmente é um preconceito/discriminação em relação à idade bem presente na nossa sociedade", diz, sublinhando que "afeta vários aspetos da vida do idoso, desde o emprego e oportunidades de trabalho à autoestima e participação ativa na sociedade". E, tudo isto, "dificulta a promoção de um envelhecimento saudável".
Rita Correia Mendes, CEO da Hug© Hug
O que é a Hug?
É a primeira empresa que olha para o processo de envelhecimento através de uma abordagem e oferta 360º alicerçada numa visão holística que incorpora as necessidades de cuidados a longo prazo em termos físicos, psicológicos e sociais para o bem-estar e a qualidade de vida da pessoa idosa, através de serviços de apoio domiciliário, lojas geriátricas e um clube com programas e atividades que permitem combater o isolamento e simultaneamente fomentar a atividade física e intelectual dos nossos clientes. Partimos, convictos, da premissa de que não há nada como envelhecer em nossa casa, envolvidos pela familiaridade do nosso bairro, dos nossos amigos e de tudo o que compõe a nossa vida. Valorizamos os detalhes da vida quotidiana, e mais do que os cuidados físicos e logísticos queremos assegurar que trazemos alegria e estímulo intelectual ao dia a dia do idoso resgatando prazeres perdidos, reavivando antigas paixões perdidas e que no meio do processo de envelhecimento foram esquecidas pelo medo ou pela falta de esperança e espontaneidade que o declínio e a perda das nossas faculdades provocam. Não são mudanças abruptas, mas sim valorizar e honrar pequenos tesouros que conseguem combater o envelhecimento e promover um envelhecimento mais alegre. Nascemos com o propósito de ajudar a impulsionar a mudança deste paradigma social e contribuir decisivamente para o incremento da qualidade de vida e da felicidade dos mais velhos e suas famílias, nas suas casas.
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Como surgiu a ideia?
Há acontecimentos na vida que nos batem à porta e que nos fazem ganhar uma clareza de consciência tão forte que perante ela, para pessoas empreendedoras, é impossível ficar de braços cruzados. A Hug nasceu disto mesmo e acabou por se tornar num apelo à ação da Sara do Ó, presidente do conselho de administração da Ó Capital, que iniciou a conceção da Hug há cerca de dois anos.
De que serviços dispõe?
A Hug é uma estrutura de apoio ao envelhecimento, na qual se destaca o serviço de apoio domiciliário. Este serviço inclui, desde o primeiro momento, um diagnóstico completo realizado por uma equipa especializada de forma a conhecer a pessoa na sua vertente física mas sobretudo emocional, fazendo uma leitura mais profunda de cada indivíduo, que possibilite conhecer a sua personalidade, história de vida e emoções. É esta atenção ao detalhe que resulta numa experiência mais humana e transformadora, assegurando que o plano e rotina de cuidados propostos de forma personalizada para cada pessoa, para além de estar adaptado a necessidades como horários de presença de cuidadores e outros aspetos relativos a cuidados de saúde, contribuem verdadeiramente para o estímulo intelectual e afetivo. Temos também uma loja de produtos de geriatria com um conceito inovador, inaugurada no coração do bairro de Campo de Ourique, que replica o ambiente de uma casa de habitação, apresentando os produtos e serviços oferecidos no contexto natural em que costumam ser utilizados. Para além da venda de produtos, temos também uma programação mensal com atividades lúdicas para os mais velhos.
Anunciaram ainda que estão já a trabalhar no Clube 65+. Do que se trata?
É um clube dedicado e inspirado por pessoas de valor, experiência e sabedoria. Um espaço onde a juventude e vitalidade se podem encontrar com a maturidade e a experiência de uma vida, formando uma combinação única e enriquecedora. Neste clube, mediante um pagamento único anual, cada sócio terá acesso a uma programação mensal com um vasto número de atividades, workshops, encontros, aulas, almoços e viagens. E Teremos novidades em breve.
A Hug disponibiliza serviços 24 horas por dia, conta duas lojas e vai abrir um clube até ao final do ano.© Hug
O envelhecimento da população é um dos maiores desafios com que se debatem muitos países. Como pretendem promover um envelhecimento saudável?
Apesar da projeção futura ser aterrorizadora, os números atuais já são um grande alerta. Embora a esperança de vida geral a partir dos 65 anos possa ser longa, a expectativa de vida saudável é bastante mais baixa. O grande objetivo é aproximar a esperança média de vida à esperança de vida saudável. Em Portugal, segundo o Instituto Nacional de Estatística, a esperança média de vida aos 65 anos é de 19.6 anos, mas a questão é que os anos de vida saudável está bastante abaixo deste número. As pessoas estão a viver mais tempo, mas parte significativa deste tempo é marcada por problemas de saúde com um consequente declínio na qualidade de vida.
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Do lado da Hug, pretendemos mudar isso através da abordagem holística que está na génese da marca e presente em todas as áreas de negócio, seja no apoio domiciliário, nas lojas geriátricas, no clube ou no voluntariado. Outras estratégias que nos ajudarão a promover o envelhecimento saudável são o foco na saúde mental/ emocional da pessoa, a promoção de atividades que promovam o combate ao isolamento e a atividade física e inclusão social através de um programa de voluntariado que iremos abrir em breve.
O idadismo é uma barreira?
O idadismo infelizmente é um preconceito/discriminação em relação à idade bem presente na nossa sociedade. Afeta vários aspetos da vida do idoso, desde o emprego e oportunidades de trabalho à autoestima e participação ativa na sociedade, o que, dificulta a promoção de um envelhecimento saudável.
A seu ver, que preconceitos existem em relação à idade?
Existem vários preconceitos associados à velhice, mas acredito que os principais são:
- Os idosos são considerados menos válidos e aptos a nível de contribuição para a sociedade. São muitas vezes carimbadas como pessoas que já não estão muitas vezes capazes de tomar decisões ou participar de forma ativa e relevante na sociedade;
- Geralmente, são vistos como pessoas mais frágeis, esquecidas, teimosas e isso leva a que muitas vezes não sejam tidas em conta mesmo a nível familiar;
- O preconceito associado à profissão! Quantos preconceitos e discriminações ainda existem relativamente ao idoso no contexto do mercado de trabalho. Ouve-se muito: ou tem experiência a mais, ou não terá a energia e capacidade de adaptação necessária que as empresas procuram;
- E, finalmente, o aspeto físico. Quer seja porque se promove a todo o custo que os mais velhos mantenham um aspeto eternamente jovem, ou porque se critica quem tenha essa vontade e a persegue através de tratamentos ou mesmo formas de vestir. Qualquer uma das duas afeta a autoestima.
Como lutar contra o estigma?
Combater o estigma envolve esforços contínuos para desafiar e mudar atitudes, crenças e comportamentos em relação aos idosos. É preciso muita educação e conscientização, mostrar exemplos de sucesso e que inspirem a sociedade, desenvolver medidas concretas de apoio a pessoas vítimas do estigma e por último um grande trabalho a fazer relativamente a legislação e políticas para esta geração. De qualquer das formas, acredito que mesmo que a sociedade continue a olhar para esta geração como um fardo para a economia e para as famílias, a verdade é que vemos atualmente cada vez mais idosos que buscam vida ativas e produtivas, fazendo por se manter física e mentalmente saudáveis, e persistindo na busca de um propósito para as suas vidas. Estes exemplos estão sem dúvida a ser impulsionadores de novos hábitos, mas sobretudo estão a ser prova de que é possível viver a velhice sob uma nova perspetiva. Podemos estar ainda longe, mas o caminho está a fazer-se.
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