A Secretaria da Comunicação Social da Presidência da República (Secom), órgão do governo brasileiro que trata a comunicação da administração de Jair Bolsonaro, fez várias publicações através do Twitter onde tece duras críticas a uma entrevista dada pela cineasta Petra Costa, que, nesta altura, faz a promoção do seu documentário 'Democracia em Vertigem' como nomeado para um Óscar da Academia de Hollywood.
O órgão, que é liderado por Fabio Wajngarten, chega a apelidar a realizadora brasileira de "militante anti-Brasil", acusando-a de "difamar a imagem do país no exterior".
Em causa, está uma entrevista dada por Petra Costa a um programa da estação pública norte-americana PBS, na semana passada, onde a cineasta de 36 anos de idade fala sobre a subida ao poder de Jair Bolsonaro, que diz ter sido ancorada numa campanha de 'fake news', e critica o inação do governo em relação à Amazónia ou à violência policial, por exemplo.
A Secom rebate estas ideias com vários tweets, em português e em inglês, para chegar ao público internacional, onde acusa Petra Costa de ter perdido "todo o contacto com a realidade" e de "mentir de novo".
Filmmaker Petra Costa played the role of an anti-Brazil activist and tarnished the country's image abroad with a series of fake news in an interview on American television. pic.twitter.com/jRxCGqLoAo
— SecomVc (@secomvc) February 3, 2020
"Sem o menor sentido de respeito pela sua terra natal e pelo povo brasileiro, a Petra disse (...) que a Amazónia depressa se vai tornar numa savana e que o presidente Bolsonaro ordena o assassinato de afro-americanos [entenda-se afro-brasileiros] e de homossexuais", acusa o órgão governamental, nas publicações em inglês.
O filho do presidente brasileiro, Eduardo Bolsonaro, foi mais longe, chamando a realizadora de "canalha". "Não costumo perder tempo desmentindo canalhas como a sra Petra Costa, mas o nível dos absurdos da sujeita chega a ser criminoso", escreveu, dizendo que é uma "militante comunista" e "herdeira da Andrade Gutierrez, empresa metida até o pescoço no Petrolão [processo criminal que envolveu a Petrobras]".
Não costumo perder tempo desmentindo canalhas como a sra @petracostal, mas o nível dos absurdos da sujeita chega a ser criminosoSabe o que não é mentira? A militante comunista aí é herdeira da Andrade Gutierrez, empresa metida até o pescoço no Petrolão. Quero ver distorcer isso https://t.co/KHFqUsXPMC
— Eduardo Bolsonaro (@BolsonaroSP) February 3, 2020
As críticas ferozes por parte da administração brasileira encontraram eco nos apoiantes do presidente de extrema-direita, que criaram a hashtag #PetraCostaLiar ('Petra Costa mentirosa'), uma etiqueta que tem sido amplamente usada no Twitter.
A Secom acusa Petra Costa de mentir sobre o descaso do governo brasileiro em relação à Amazónia, lembrando a criação de programas como o Conselho da Amazónia ou a Força Nacional Ambiental - mas ignorando os alertas de organizações como a Inpe, que registam um aumento de desflorestação, como refere a Folha de São Paulo.
O órgão fala também na violência policial no Rio de Janeiro, que Petra diz estar a intensificar-se, algo que a Secom diz ser 'fake news' com esta justificação: "o número de homicídios teve uma queda de aproximadamente 20% no Brasil". De acordo com o Guardian, porém, as estatísticas oficiais mostram que a polícia do Rio de Janeiro matou 1810 pessoas em 2019, o maior número de mortes em mais de 20 anos naquele estado e 18% acima do número de 2018.
O documentário 'Democracia em Vertigem', realizado por Petra Costa, debruça-se sobre o processo de destituição da ex-presidenta Dilma Rousseff e consequente prisão do antigo presidente Lula da Silva. O filme está nomeado na categoria de Melhor Documentário desta 92.ª edição de entrega de prémios da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.