"Milhões estão a passar fome na Síria, em grande parte por causa do fracasso do governo em lidar com a crise do pão que ajudou a criar", indicou Sara Kayyali, investigadora daquela organização de defesa dos direitos humanos, citada num comunicado.
Segundo Kayyali, "as autoridades sírias dizem que garantir que todos tenham pão suficiente é uma prioridade, mas as suas ações mostram o contrário".
A crise económica em crescendo e a destruição de infraestrutura devido à guerra levou a uma grave escassez de trigo. Esta é agravada pela distribuição discriminatória do pão, aliada à corrupção e às restrições sobre a quantidade de pão subsidiado que se pode comprar, resultando em fome.
De acordo com um estudo divulgado pela Universidade Humboldt em 2020, citado pela Human Rights Watch (HRW), a Síria perdeu 943.000 hectares de terras cultivadas entre 2010 e 2018, devido a "operações militares, ao deslocamento de agricultores e trabalhadores rurais e à má gestão de recursos do Estado e custos relacionados com o conflito".
A HRW refere que o ano passado o governo sírio teve grande dificuldade em comprar e importar trigo, quer do estrangeiro quer de áreas da Síria sob controlo curdo, que constituem a maior parte das terras cultivadas.
De acordo com o Programa Alimentar Mundial, em fevereiro, pelo menos 12,4 milhões de sírios, de uma população estimada em 16 milhões, sofriam de insegurança alimentar, um aumento de 3,1 milhões num ano.
Segundo a HRW, em setembro o governo anunciou limitações à quantidade de pão subsidiado que as pessoas podem comprar e em outubro duplicou o preço do pão subsidiado.
Residentes que já enfrentavam uma grave escassez de alimentos, disseram à organização de defesa dos direitos humanos, que aquela política piorou a situação.
De acordo com dados da ONU e pessoas entrevistadas pela HRW, "as famílias reduziram o número de refeições e os pais passam fome para alimentar os filhos".
Moradores também referiram uma distribuição discriminatória do pão, com grande prejuízo para os deslocados.
"As políticas restritivas do governo sírio em resposta à crise do pão estão a piorar a situação, dando origem a um mercado negro que atende aos ricos e bem relacionados", disse Kayyali. "A Síria deve garantir que uma quantidade e qualidade suficientes de pão seja distribuída a todos que precisam em todas as áreas que controla", adiantou.
Desencadeada em 2011, a guerra na Síria já causou mais de 388.000 mortos e obrigou mais de metade da população que existia no país antes da guerra a fugir, 6,2 milhões de pessoas estão deslocadas no país e 5,6 milhões estão refugiadas no estrangeiro, segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos.
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