Nelson Teich, que foi ministro da Saúde do Brasil menos de um mês, quando a pandemia do novo coronavírus já se encontrava no país, prestou depoimento, esta quarta-feira, perante a comissão parlamentar de inquérito (CPI) à gestão da pandemia no Brasil, esclarecendo que deixou o cargo por perceber que havia intenção de alargar o uso da cloroquina, medicamento recomendado pelo governo de Jair Bolsonaro mas sem eficácia comprovada contra a Covid-19.
"O pedido específico [de demissão] foi pelo desejo [do governo] de ampliação do uso de cloroquina. Esse era o problema pontual. Mas isso refletia uma falta de autonomia e uma falta de liderança", afirmou o antigo ministro da Saúde.
Teich acrescentou, ainda, que a sua saída do cargo ministerial se deveu também à "constatação de que não teria a autonomia e liderança" que julgava "indispensáveis para o exercício do cargo". "Essa falta de autonomia ficou mais evidente em relação as divergências com o governo quanto à eficácia e extensão do uso do medicamento cloroquina para o tratamento da Covid-19".
Recorde-se que a hidroxicloroquina e a cloroquina, medicamentos usados no tratamento da malária e também prescritos para o lúpus e para a artrite reumatoide, podem provocar problemas no ritmo cardíaco, ao baixar significativamente a pressão sanguínea, bem como danos musculares ou nervosos.
O médico oncologista declarou, ainda, que o país poderia ter o acesso mais facilitado às vacinas contra a Covid-19 se o governo o tivesse planeado. "Numa estratégia onde a gente tivesse foco na vacina a gente provavelmente teria um acesso muito maior e mais precoce a vacinação", afirmou, sublinhando que, durante o tempo em que titulou a pasta da Saúde, não havia ainda vacinas para comprar.
Quando o novo coronavírus chegou ao país, em 26 de fevereiro do ano passado, o Ministério da Saúde era liderado pelo médico Luiz Henrique Mandetta, que foi demitido em abril por defender as medidas de isolamento social contrariando Jair Bolsonaro, que menorizou, desde o início, a gravidade da pandemia. Nelson Teich substituiu Mandetta, ainda em abril, mas ocupou o cargo por menos de trinta dias.
Em maio de 2020, Bolsonaro nomeou o general Eduardo Pazuello como ministro interino da Saúde. O militar tinha vasta experiência em logística, mas era novato no que se refere a gestão da saúde pública. Em março deste ano, quando o país atravessava a pior fase da crise pandémica, Bolsonaro fez uma nova mudança na tutela, anunciando para o cargo o cardiologista Marcelo Queiroga.
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