Extradição de Chang para os EUA é vitória para o Estado de direito

O jurista André Thomashausen considerou hoje que a decisão da justiça sul-africana em extraditar o ex-ministro das Finanças moçambicano Manuel Chang para os EUA é "uma vitória" para o Estado de direito e o constitucionalismo na África Austral.

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Lusa
11/11/2021 10:40 ‧ 11/11/2021 por Lusa

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Dívidas

"O acórdão deixa bem claro que a justiça não se deixa enganar e que o primeiro pedido de extradição de Moçambique feito com oportunismo depois do pedido de extradição dos Estados Unidos estava viciado de mentiras e que tentou enganar e confundir as autoridades sul-africanas", disse hoje André Thomashausen à Lusa.

Para o catedrático jubilado da Universidade da África do Sul (UNISA), especialista em direito internacional, as várias tentativas por parte do Governo de Moçambique em "remediar" subsequentemente o pedido de extradição, "também falharam porque Maputo nunca explicou sem equívoco a situação da imunidade de Chang como ex-membro do Conselho de Ministros de Moçambique".

"E também nunca chegou a explicar se de facto era uma pessoa arguida e acusada ou se era simplesmente testemunha, porque nos processos em curso Manuel Chang é mencionado como declarante, ou seja, testemunha", adiantou o analista sul-africano.

Nesse sentido, referiu André Thomashausen, a juíza Margarete Victor considerou que o despacho do ministro da Justiça e Serviços Correcionais da África do Sul, Ronald Lamola, em agosto deste ano, para entregar Chang às autoridades em Moçambique, "estava viciado em termos do direito administrativo sul-africano e do direito constitucional porque não tinha motivação racional, objetiva e transparente, sendo simplesmente um despacho sem fundamento e por isso foi declarado nulo e sem efeito".

A juíza do Tribunal Superior de Gauteng, em Joanesburgo, ordenou na quarta-feira a África do Sul a extraditar Manuel Chang, preso há 34 meses sem julgamento, para os Estados Unidos, invalidando a extradição para Moçambique.

Numa mensagem enviada à Lusa na tarde de quarta-feira, o Ministério da Justiça da África do Sul disse ter "tomado nota" da decisão judicial, remetendo qualquer decisão para depois de uma análise da sentença escrita.

O texto do acórdão, de 75 páginas, poderá demorar cerca de duas semanas a ficar disponível na sua versão definitiva, disse à Lusa fonte do tribunal sul-africano.

O analista sul-africano salientou à Lusa que as partes poderão requer autorização para apresentar um recurso impedindo a execução imediata do acórdão do Tribunal, existindo igualmente "forte possibilidade" de o Governo de Moçambique "continuar a frustrar o direito de Chang de ser ouvido e julgado em tribunal".

"Aqui também é de ter em conta os direitos fundamentais do arguido Manuel Chang, que não poderá permanecer por mais alguns anos em detenção aguardando o seu dia no tribunal, a sua oportunidade de se defender", sublinhou.

"Julgo que para respeitar também os direitos fundamentais de Chang, convém que ele seja extraditado e como a extradição para Moçambique foi afastada, como sendo ilegal, só poderá ser extraditado para os Estados Unidos, e espero que o Ministério da Justiça aceite o julgamento do tribunal e que vá agir em conformidade", disse o jurista sul-africano à Lusa.

Nesse sentido, o académico explicou que a decisão do tribunal sul-africano "é executável imediatamente", acrescentando que "só poderá haver uma suspensão da execução através da imposição de um recurso".

"Esse recurso teria de ser apresentado muito rapidamente para evitar que realmente a sentença seja executada", vincou.

"Tudo dependerá também da vontade das partes, porque se o Ministério da Justiça resolver não interpor recurso poderá executar a sentença porque é de facto o ministério que é também responsável pelos assuntos prisionais, portanto, é o mesmo ministério que deveria autorizar a entrega de Chang à Interpol e às autoridades americanas, e poderá fazê-lo sem ter o texto completo e autorizado do acórdão", considerou o jurista sul-africano.

A entrega de Chang está prevista pela terceira vez depois de duas tentativas invalidadas em maio de 2019 e agosto deste ano para Maputo.

Esta decisão judicial surge na sequência de um recurso urgente do Fórum para a Monitoria do Orçamento (FMO), uma plataforma da sociedade civil moçambicana, que contestou a decisão do ministro da Justiça sul-africano Ronald Lamola de extraditar Manuel Chang para o seu país, anunciada em 23 de agosto passado.

O antigo governante moçambicano, detido na África do Sul desde dezembro de 2018 a pedido dos EUA, está alegadamente envolvido no caso das 'dívidas ocultas', de mais de 2,2 mil milhões de dólares (cerca de dois mil milhões de euros), contraídas entre 2013 e 2014 junto das filiais britânicas dos bancos de investimento Credit Suisse e VTB pelas empresas estatais moçambicanas Proindicus, Ematum e MAM.

Os empréstimos foram secretamente avalizados pelo Governo da Frelimo, liderado pelo Presidente da República à época, Armando Guebuza, sem o conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo no país vizinho.

Leia Também: Portugal e Moçambique querem reforçar cooperação científica

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