Da imigração ao poder de compra. O que separou Macron e Le Pen no debate
O presidente cessante e a candidata da extrema-direita reeditaram o duelo de 2017.
© Ludovic Marin/Pool via REUTERS
Mundo presidenciais em França
Emmanuel Macron versus Marine Le Pen. Os dois candidatos que vão disputar, no próximo domingo, a eleição presidencial em França estiveram esta noite, frente a frente, naquele que se configurou como o único debate televisivo agendado para a segunda volta do escrutínio.
Foram vários os temas que marcaram a argumentação de ambas as partes, naquele que se tratou de uma reedição do duelo de 2017 - ano em que o presidente cessante e a candidata de extrema-direita disputavam também, entre si, o Palácio do Eliseu.
O Notícias ao Minuto acompanhou, a par e passo, este debate. Fique a saber quais os principais temas discutidos pelos dois candidatos:
O poder de compra dos franceses
Ao nível do poder de compra, Marine Le Pen começa por referir que os "franceses estão a perder poder de compra", com muitos a relatarem que não têm dinheiro para chegar "até ao final do mês". A este nível, a candidata à Presidência defende que é necessário descer, nomeadamente, os preços da "eletricidade, do gás, do petróleo e da gasolina", através de uma baixa de fiscalidade. A "redução do IVA" em todas as fontes de energia, de 20% para 5,5%, é uma das prioridades de Le Pen a este nível.
A candidata da extrema-direita faz ainda uma critica direta aos impostos sobre os carburantes, dizendo que foi este o grande responsável pelo "problema do poder de compra dos franceses". "Recorda-se que aumentou os impostos sobre os combustíveis, o que provocou os Coletes Amarelos?”, questiona ainda a candidata.
Le Pen diz ainda que pretende reduzir os "impostos [do rendimento]", "aumentar os salários de professores, profissionais de saúde e outros” e "aumentar o apoio às pessoas com deficiência". Somando todas estas medidas, o rendimento familiar líquido poderia subir "numa média de 150 a 200 euros", argumenta.
A propósito destes temas, o candidato reconhece que existem "dificuldades" ao nível do poder de compra, tal como a rival relata. Porém, Macron responde às propostas apresentadas pela opositora, começando por dizer que pretende, contrariamente, "congelar os preços da eletricidade e do gás", considerando uma estratégia "mais eficaz que a baixa do IVA". Assim, na perspetiva do presidente cessante, a "melhor forma de conseguir obter mais poder de compra é lutar contra o desemprego".
No que toca ao estabelecimento de um limite máximo ao preço da energia, que ele próprio defende, o candidato diz que Le Pen "votou contra esse limite". Na sua perspetiva, o mesmo deve ser mantido "enquanto existir uma crise", pois este trata-se de um "mecanismo de gestão de crise". Porém, a transição energética é uma das preocupações do candidato liberal, que considera que o país será mais forte se conseguir "abordar as questões ecológicas".
Abordando o tema das pensões, Macron compromete-se a subir as pensões mínimas para 1.100 euros, tendo falado ainda na subida do salário mínimo em 34 euros.
A Guerra na Ucrânia
O tema da guerra na Ucrânia esteve, claro está, presente no debate. Na perspetiva de Emmanuel Macron, a França deve continuar a "ajudar" a Ucrânia a resistir às investidas russas, tanto ao nível do armamento, como a nível financeiro e humanitário.
Num contexto como o que se vive neste momento, de guerra na Europa, o presidente defende a necessidade de uma França e de uma União Europeia "com uma boa capacidade de Defesa", de forma a impedir uma "contaminação do conflito".
A propósito desta temática, Marine Le Pen diz estar, regra geral, de acordo com as sanções que têm vindo a ser aplicadas pela União Europeia à Rússia, nomeadamente contra os seus oligarcas. Com uma exceção: "o bloqueio contra a importação do petróleo e gás russo". Na sua perspetiva, a adoção de medidas dessa natureza causariam apenas "dano aos franceses".
Garantindo "condenar" a invasão russa sobre a Ucrânia, a candidata à Presidência diz concordar com a prestação de ajuda "humanitária", "financeira" e de "armamento" ao povo ucraniano. Ainda assim, alerta que a entrega de armamento pode tornar França um país “co-beligerante”.
Perante um cenário desta natureza, a candidata da extrema-direita diz ter "medo" de que tudo isto "atire a Rússia para os braços da China" - fazendo com que eles se tornem aliados tão próximos que se tornem num superpoder".
Durante esta discussão, Emmanuel Macron acusa ainda Marine Le Pen de "depender do poder russo e de Putin", referindo-se ao empréstimo concedido por um banco russo sua à adversária. A candidata de extrema-direita responde que "não tinha outra dependência senão pagar o seu empréstimo".
A União Europeia
Voltando-se para a temática da União Europeia, Emmanuel Macron acusa a opositora de querer sair do bloco europeu e do Euro. “A sua campanha não mudou, continua a querer sair do Euro, mas já não o diz. Já eu acredito no Euro”, acusa o presidente cessante, que considera que a União Europeia deve ter um "eixo franco-alemão" capaz de liderar o caminho dos 27 Estados-membros.
Marine Le Pen contradiz estas afirmações do rival, garantido que pretende que França permaneça na União Europeia. Porém, revela as suas intenções de "transformá-la radicalmente", visto que a mesma tem uma "série de políticas" com as quais diz discordar - como é o caso, exemplifica, da "política de comércio livre" e da "política dos trabalhadores destacados". "Toda a gente sabe que eu defendo a Europa das Nações, mas que repudio este modelo de União Europeia", esclarece.
A idade da reforma
Um dos temas trazidos à discussão passou pela idade da reforma em França. Marine Le Pen garante que, caso ganhe as eleições de 24 de abril, "os franceses terão a reforma entre os 60 e os 62 anos”. Defende, a este nível, a necessidade de aplicação de um sistema progressivo: "Quanto mais tarde uma pessoa tiver começado a trabalhar, mais tarde se pode reformar", esclarece.
O opositor propõe, diferentemente, que a idade da reforma continue a subir de forma faseada nos próximos anos, fazendo com que a mesma atinja os 65 anos em 2032. Na sua perspetiva, essa trata-se da "única maneira" de impedir um aumento dos impostos. Atualmente, lembre-se, os franceses podem abandonar a vida ativa aos 62 anos.
Apoio às empresas durante a pandemia
Abordando, ambas as partes, os efeitos nefastos que a pandemia de Covid-19 teve na economia francesa, Macron diz que, no desempenhar do seu papel de presidente, "ajudou os pequenos empresários", na medida do possível, a atravessar as dificuldades, através de "empréstimos" e de um alívio nos "impostos".
Porém, a candidata da extrema-direita considera que os "confinamentos" impostos sucessivamente para conter a propagação do vírus tiveram graves consequências para as pequenas empresas, muitas das quais acabariam por fechar. “Não era nos pequenos negócios que o vírus se transmitia. E agora você diz que eles lhe devem estar gratos, por lhes ter pago pelas perdas que você provocou?”, questiona.
A emergência climática
No que concerne as questões do ambiente, Marine Le Pen começa por criticar severamente a importação de "produtos que são produzidos a milhares de quilómetros". Defende, assim, uma "relocalização das empresas" em França, pois considera que não faz sentido "importar 50% das frutas e vegetais”.
Apelidando a rival de "cética climática", o candidato liberal considera que o principal problema a este nível não passa pelas questões do "comércio livre" e das "importações excessivas". “O desequilíbrio na verdade é no petróleo e no gás", assevera, criticando diretamente a opositora por propor uma redução do IVA nestes produtos.
Le Pen critica ainda a aposta de Emmanuel Macron na energia eólica, questionando ainda o encerramento de centrais nucleares. “É um atentado à biodiversidade e que faz baixar os preços imobiliários nas imediações. E quando não existe vento não funcionam”, explica. Na perspetiva do presidente cessante, um processo de transição energética deverá ter em consideração estas duas vertentes, "nuclear e renováveis". Para Le Pen, o "centro" da política energética francesa deverá passar pelo nuclear.
A educação em França
No que toca à educação, Emmanuel Macron promete aumentos para os professores que ganham menos, nomeadamente cujo salário é inferior a dois mil euros. O presidente cessante quer ainda garantir, caso vença as eleições, que os "alunos estudam matemática até ao fim do secundário" e que têm aulas de "educação física todos os dias".
O impacto da pandemia em contexto educativo foi também trazido à discussão. Os "problemas de saúde mental aumentaram por causa da pandemia e por isso os jovens são uma das minhas prioridades”, garantiu Marine Le Pen, que fala ainda da necessidade de se apostar em programas de estágio e de se proceder a um aumento dos apoios aos trabalhadores-estudantes. “Devem receber uma bolsa de até 200 a 300 euros e poderem ter transportes gratuitos”, aponta a candidata.
No que toca ao período da pandemia, o candidato liberal defende o governo francês, que optou por manter as escolas abertas. “Se não tivéssemos aberto as escolas não podíamos ajudar as crianças, há crianças que não iam ter o que comer", aponta.
Imigração e insegurança
Num momento final do debate presidencial, a candidata da extrema-direita destaca aquele que considera ser uma das "principais preocupações dos franceses": o facto de existir "cada vez mais insegurança" no país. Para combater esse "problema", Marine Le Pen afirma pretender “acabar com a imigração de larga escala”. E propõe, a esse nível, a realização de um referendo “para mudar radicalmente" a política de imigração nacional. “De momento temos um problema. Muita gente chega a França, pede asilo, não o recebe, mas fica cá na mesma!”, argumenta a candidata.
Questões relacionadas com a cultura e com o véu islâmicos foram também trazidas à discussão. “Acredito que o hijab deve ser banido nos locais públicos, porque é um uniforme imposto pelos islamistas a estas mulheres e raparigas”, afirmou Le Pen, garantindo não estar "a lutar contra uma religião", mas sim contra "a ideologia islamista". As "deportações" são, na sua perspetiva, uma das formas de o fazer.
Quanto à questão do véu islâmico, Macron assegura que, caso consiga vencer as eleições de domingo, não avançará com uma proibição ao seu uso. “Estamos a falar de usar um símbolo religioso, o véu. Comigo como Presidente não vamos proibir nenhum símbolo religioso”, diz.
Face à proposta de deportações de cidadãos islâmicos, o presidente cessante diz a Le Pen que a mesma não pode "semear a divisão no país", acusando-a de querer "mandar para fora do país cidadãos franceses". “Estas são pessoas que fugiram do seu país por causa da guerra, temos de ser claros e recebê-los”, acrescentou ainda o liberal.
Eleições estão aí à porta... Quem vai conquistar o Palácio do Eliseu?
Na primeira volta da atual corrida presidencial, Emmanuel Macron obteve 27,85% dos votos, enquanto Marine Le Pen conquistou 23,15% dos eleitores. As sondagens mais recentes divulgadas pelo Politico mostram que 55% dos franceses têm intenções de votar no candidato liberal, ao passo que as estimativas para a rival da extrema-direita ficam ligeiramente abaixo (45%).
Na reta final desta corrida presidencial, os dois candidatos enfrentam a difícil tarefa de convencer os apoiantes de Jean-Luc Mélenchon, da esquerda radical, que conseguiu angariar quase 22% dos votos na primeira volta, conquistando assim o terceiro lugar.
A segunda volta das eleições presidenciais em França está marcada para domingo, dia 24 de abril.
[Notícia atualizada às 22h58]
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