A decisão divulgada hoje e noticiada pela agência de notícias EFE dá assim razão a uma queixa apresentada em 2018 pelo ex-vicepresidente do Governo regional da Catalunha Oriol Junqueras e outros três antigos elementos do mesmo executivo (Raul Romeva, Josep Rull e Jordi Turull), que alegaram que a suspensão das suas funções públicas antes de uma condenação violou o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos.
O Conselho dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) sublinhou que os queixosos foram suspensos dos seus cargos públicos depois de serem acusados do delito de rebelião (que exige um levantamento violento), apesar de terem instado a população catalã a manter-se pacífica durante o processo que levou à convocação e realização de um referendo considerado ilegal pelas autoridades espanholas e que, além disso, acabaram por ser condenados em 2019 por sedição (contestação coletiva contra a autoridade), um crime sem ligação com a violência.
A suspensão dos quatro políticos catalães, em julho de 2018, teve como fundamento legislação espanhola que permite a suspensão de funcionários públicos quando estão acusados de rebelião.
"As salvaguardas contra as restrições de direitos políticos devem aplicar-se com maior rigor se estas restrições se produzem previamente, e não posteriormente, a uma condenação por um delito", disse Hélène Trigoudja, um dos 18 membros do Conselho dos Direitos Humanos da ONU, com sede em Genebra, na Suíça, na apresentação da decisão sobre este caso, citada pela agência EFE.
A decisão de suspender políticos eleitos "deve basear-se em leis claras e previsíveis que estabeleçam motivos razoáveis e objetivos para a restrição dos direitos políticos e deve aplicar-se sobre a base de uma análise individualizada", acrescentou.
As decisões deste organismo da ONU não vinculam os Estados a uma ação, mas Espanha assinou o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos que os queixosos e as Nações Unidas disseram ter sido violado pelo Estado espanhol.
"O Conselho não é um tribunal, mas leva a cabo funções jurídicas, emitindo decisões e recomendações aos Estados membros que se espera que sejam postas em prática", segundo esclareceu o organismo à agência EFE.
Os quatro políticos catalães foram condenados a penas de prisão em 2019 pelo envolvimento na tentativa de autodeterminação da Catalunha em 2017, que levou à realização de um referendo ilegal sobre a independência desta região espanhola.
Em 2021, foram libertados, com outros cinco líderes independentistas, na sequência da concessão de um indulto pelo Governo espanhol liderado pelo socialista Pedro Sánchez.
Os dois principais partidos independentistas da Catalunha, Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) e Juntos pela Catalunha (JxCat) já se congratularam com a decisão do Conselho dos Direitos Humanos da ONU conhecida hoje, considerando que "reforça a condenação internacional a Espanha pela severa repressão contra o independentismo catalão".
Num comunicado conjunto, os dois partidos, atualmente coligados no Governo regional da Catalunha, consideram que Espanha fica agora "obrigada a cessar as suas políticas repressivas e não pode continuar a utilizar o direito e os procedimentos penais para fazer frente à reivindicação pacífica do direito à autodeterminação".
"O sistema judicial espanhol continua fortemente politizado apesar de muitos apelos internacionais de reforma", defendem ERC e JxCat, que acrescentam estar em causa a violação de "direitos humanos fundamentais, individuais e coletivos" e "a subversão das bases da democracia".
O antigo presidente do Governo da Catalunha e ex-líder do JxCat, Carles Puigdemont, que liderava o executivo regional em 2017, escreveu hoje nas redes sociais que "deram um golpe na democracia" e que a decisão do Conselho dos Direitos Humanos da ONU é "outra bofetada" na "cara do Estado espanhol".
Puigdemont nunca foi julgado dentro do mesmo processo por ter abandonado Espanha e fugido para a Bélgica.
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