Esta posição foi expressa hoje pelo ministro do Interior francês, Gerald Darmanin, em Bruxelas.
A tensão entre Paris e Roma sobre o navio Ocean Viking esteve no centro de uma reunião extraordinária dos ministros do Interior da União Europeia (UE), que aconteceu a pedido de Paris.
A crise franco-italiana reavivou o debate sensível sobre a solidariedade entre os países da UE em matéria de migrações, quando continua estagnada a reforma apresentada há dois anos pela Comissão Europeia.
As entradas irregulares nas fronteiras externas da União estão entretanto a aumentar acentuadamente (280.000 nos primeiros dez meses do ano, mais 77% do que em igual período do ano passado).
A reunião foi convocada a pedido de Paris, que aceitou "excecionalmente", em 11 de novembro, o desembarque de 234 migrantes resgatados pelo Ocean Viking, após a recusa do governo italiano, chefiado pela líder de extrema-direita Giorgia Meloni, em acolher este navio humanitário que permaneceu vários dias ao largo da costa italiana.
Em resposta à atitude "inaceitável" de Roma, Gérald Darmanin anunciou a suspensão imediata da planeada receção em França de 3.500 requerentes de asilo desembarcados em Itália.
Uma reação denunciada como "injustificada" por Giorgia Meloni, que lembrou que o seu país acolheu este ano cerca de 90.000 migrantes.
Estas "deslocalizações" foram planeadas no âmbito de um mecanismo temporário de solidariedade europeu acordado em junho, que a própria França iniciou na altura da sua presidência semestral de seis meses do Conselho da UE.
"Se a Itália não aceitar os barcos, não aceitar a lei do mar e (o princípio de) o porto mais seguro, não há nenhuma razão para que os países que garantem as deslocalizações sejam os mesmos que recebem diretamente os barcos ou acolhem os migrantes de África ou da Ásia", disse Darmanin à chegada à reunião em Bruxelas.
Uma dúzia de países comprometeram-se a acolher cerca de 8.000 requerentes de asilo ao longo de um ano, com a França e a Alemanha a aceitarem cada um 3.500. No entanto, até agora, apenas uma centena de deslocalizações ocorreram.
Numa tentativa de reanimar este mecanismo, baseado numa ação voluntária dos Estados, a Comissão apresentou na segunda-feira um plano de ação sobre o Mediterrâneo Central.
"O nosso desejo é, obviamente, assumir este mecanismo, o único que nos permite distribuir as dificuldades por toda a Europa e forçar os países de primeira entrada, como a Itália, a estabelecer as fronteiras de que necessitamos e o registo de todos os estrangeiros que chegam ao espaço europeu. De momento, este não é o caso", sustentou Darmanin.
O plano de ação visa, nomeadamente, reforçar a cooperação com países como a Tunísia, a Líbia e o Egito para evitar partidas e aumentar o regresso de migrantes irregulares, além de "promover discussões no âmbito da Organização Marítima Internacional" (OMI) sobre "orientações para as embarcações que realizam operações de resgate no mar".
A Itália, tal como a Grécia, Malta e Chipre, apontou recentemente o dedo às organizações humanitárias cujos "navios privados atuam em total autonomia", acusando-as de encorajarem a migração.
O ministro do Interior grego, Notis Mitarachi, queixou-se de que a Turquia não está a respeitar um acordo de migração de 2016 que inclui o regresso de migrantes que não têm direito a asilo.
Considerou ainda que o mecanismo de solidariedade voluntária "não é suficiente", apelando a uma solução "obrigatória".
Alguns dos Estados-membros, incluindo a República Checa, que detém atualmente a presidência rotativa da UE, estão focados noutra rota migratória: a dos Balcãs, que causou quase 130.000 entradas irregulares na UE desde o início do ano, segundo a agência Frontex, um aumento de 168%.
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