Israel. Futuro do governo condiciona Acordos de Abraham, dizem analistas
Analistas de relações internacionais afirmaram hoje que a evolução dos Acordos de Abraham está muito condicionada com o futuro da liderança política de Israel e concordaram que o protocolo terá sempre de ter os Estados Unidos como "fiscalizador".
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Mundo Israel
Os especialistas falavam durante um 'webinar' promovido pela organização não-governamental (ONG) Chatham House, ao qual a agência Lusa assistiu.
No debate, subordinado ao tema "Normalização das Relações entre Israel e os Emirados Árabes Unidos (EAU) e os Acordos de Abraham: Esculpindo o Novo Médio Oriente", Dália Dassa Kaye, investigadora sénior do Centro Burkle para as Relações Internacionais da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), destacou a possibilidade de a nova liderança israelita pôr fim a uma maior segurança e estabilidade no Médio Oriente.
Para Kaye, ainda existe muita insegurança no Médio Oriente, mas, no caso da normalização das relações entre Israel e os EAU há, paralelamente, muitos atores regionais que têm muitas dúvidas em relação à política do executivo ultraortodoxo, nacionalista e de extrema-direita israelita, questões que se acentuam se, no 'bolo', se acrescentar as relações com a Palestina e, acima de tudo, com o Irão.
"Há muitos desafios para a estabilidade regional, nomeadamente na defesa e na tecnologia. Mas também tem de se percecionar o comportamento da China na região. Neste contexto, é falsa a ideia de que os Acordos de Abraham poderiam trazer paz ao conflito israelo-palestiniano, sobretudo após a derrota de [o ex-Presidente dos Estados Unidos, Donald] Trump [em 2020], e agora com o Irão", sublinhou Kaye.
O alerta no mesmo sentido foi feito também por Sanam Vakil, diretora-adjunta e investigadora sénior do Programa para o Médio Oriente e norte de África da Chatham House, que considerou que, a continuar com as políticas extremistas, nacionalistas e ultraortodoxas, que implicam a edificação de mais colonatos nos territórios palestinianos ocupados, Telavive põe em perigo os acordos.
"As incógnitas continuam e são muitas e é aqui que têm de entrar os Estados Unidos e o Ocidente, que são fundamentais para garantir a segurança e a estabilidade na região", sublinhou Vakil, que, tal como Neil Quilliam, colega no Programa para o Médio Oriente e norte de África da Chatham House, defendeu que será cada vez mais importante a assinatura de um acordo com os palestinianos.
"A contínua ocupação dos territórios [palestinianos, por parte de Israel] não é uma boa solução e não ajuda nada à estabilização da região", referiu Quillian, com Kaye a reforçar com a ideia de que a questão palestiniana tem sido "marginalizada" e que se a atual liderança de Benjamin Netanyahu mantiver a pressão para acabar com a Palestina, tal constituirá um "teste de 'stress'" para a política internacional.
Para Quillian, a questão palestiniana "é e vai continuar a ser por muitos anos" um tema complicado no Médio Oriente, a par da relação de Telavive com Teerão, tradicionais inimigos na região, "onde há muito mais perguntas do que respostas", pelo que a desejável integração regional de Israel está longe de ser uma questão de tempo.
"Quão duráveis serão os acordos que Israel já assinou [com países árabes -- Egito (1979), Jordânia (1994), bem como Sudão, Bahrein e Marrocos (os três em 2020)]? É tudo ainda uma incógnita", enfatizou, realçando que as relações entre Telavive e Abu Dhabi ainda estão no nível "económico" e, por isso, "muito longe de uma verdadeira aproximação entre os dois povos".
Mais difícil, lembrou Sanam Vakil, é a relação entre Israel e a União Africana (UA), cuja relação "terá de ser aprofundada", uma vez que há "oportunidades e desafios" para uma organização pan-africana ainda "ideologicamente muito dividida", pelo que não se pode prever, a curto ou a médio prazo, a criação de uma "agência regional de segurança" para o Médio Oriente.
"Há uma grande fadiga de conflitos regionais no pós 'Primavera Árabe'. Líbia, Iémen, etc. Há uma fadiga relacional provocada pela pandemia de covid-19. Isso provocou um grande impacto nas relações económicas, o que desencadeou maiores tensões geopolíticas regionais", sintetizou Vakil.
No entanto, defendeu a moderadora do debate, Jane Kinninmont, diretora do Impacto & Política, da Rede de Liderança Europeia (European Leadership Network, ELN), a normalização dos Acordos de Abraham entre Israel e os EAU estão a antecipar uma maior integração de segurança política, económica e regional no Médio Oriente, pois permitiram um envolvimento diplomático de alto nível, oportunidades comerciais, transferências de tecnologia e diálogo sobre segurança regional.
"A normalização abriu caminho para maiores níveis de envolvimento regional, através de uma série de iniciativas. Apesar dos ganhos, as relações entre Israel e os Emirados são assoladas por uma série de desafios políticos, culturais e regionais que exigirão tempo, empenho e atenção diplomática para serem resolvidos", acrescentou Jane Kinninmont.
Sanam Vakil e Neil Quilliam são autores de um estudo, disponível a partir de quarta-feira no portal da Chatham House, que, segundo a organização, faz um "exame abrangente da história, dos impulsionadores e da dinâmica da normalização entre Israel e os EAU e as suas implicações para a segurança regional".
O Governo de coligação de Israel, o mais à direita desde a fundação do Estado judaico em 1948, tem enfrentado nas últimas semanas uma vaga de manifestações sem precedentes devido a uma polémica reforma judicial, entretanto adiada.
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