Mundo pouco ou nada avançou no combate à corrupção

A maioria dos países do mundo fez "poucos ou nenhuns progressos" no combate à corrupção, com mais de dois terços a registarem resultados negativos, conclui o Índice de Perceção da Corrupção (IPC) 2023, da organização Transparência Internacional, hoje divulgado.

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Lusa
30/01/2024 07:06 ‧ 30/01/2024 por Lusa

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Transparência Internacional

Elaborado desde 1995 pela Transparência Internacional, e atualmente o principal indicador mundial de perceção da corrupção no setor público, o IPC classifica os países numa escala de zero (altamente corrupto) a 100 (muito limpo ao nível da corrupção), sendo que, no ano passado, a média global manteve-se inalterada nos 43 pontos, pelo 12º ano consecutivo, o que revela "graves problemas de corrupção" à escala mundial que os Estados não estão a conseguir contrariar, revela o relatório.

A Transparência Internacional estabelece um vínculo direto entre a falta de progressos no combate à corrupção e "o declínio no funcionamento dos sistemas de justiça", constatado no Índice do Estado de Direito publicado em outubro passado, apontando que "os países com as pontuações mais baixas neste índice estão também a ter pontuações muito baixas no IPC, o que revela uma ligação clara entre o acesso à justiça e a corrupção".

"Tanto os regimes autoritários como os líderes democráticos que minam a justiça contribuem para aumentar a impunidade em relação à corrupção e, nalguns casos, até a incentivam, eliminando as consequências para os infratores", assinala a organização.

Numa tabela que integra 180 países e territórios, a Dinamarca volta a ser, pelo sexto ano consecutivo, o país do mundo com os níveis de corrupção no setor público mais baixos, obtendo uma classificação de 90 pontos, e é seguida de outro país no norte da Europa, a Finlândia (87), e da Nova Zelândia (85).

No extremo oposto da lista, os países do mundo onde a perceção de corrupção é maior, encontram-se a Somália (apenas 11 pontos), a Venezuela, a Síria e o Sudão (todos com 13) e o Iémen (16), notando a Transparência Internacional que todos estes países "são afetados por crises prolongadas, sobretudo conflitos armados".

O relatório sublinha que 23 países atingiram mínimos históricos em 2023, e entre eles tanto se encontram "Estados autoritários", como o Irão (24) e a Rússia (26), como algumas das democracias tidas como das mais robustas à escala global, casos do Reino Unido (71), Suécia (82), Países Baixos (79) e Islândia (72).

Na União Europeia (UE) e Europa ocidental (inclui também Reino Unido, Noruega, Suíça e Islândia), a média global é de 65 pontos sobre 100, mas tal representa um recuo face ao ano anterior, o primeiro numa década.

Apesar de continuar a ser a região com a pontuação mais elevada no IPC, o relatório de 2023 revela que "os esforços anticorrupção estagnaram ou diminuíram em mais de três quartos dos países" da UE e restante Europa ocidental, pois, entre os 31 países avaliados, "apenas seis melhoraram a sua pontuação, enquanto oito diminuíram desde 2012".

A Transparência Internacional observa que "várias democracias de topo, incluindo a Suécia (82 pontos), os Países Baixos (79), a Islândia (72) e o Reino Unido (71), registaram as pontuações mais baixas de sempre", salientando o recuo de seis pontos do Reino Unido nos últimos cinco anos.

Entre os 27 Estados-membros da UE, quatro apresentam resultados abaixo dos 50 pontos, com a Hungria a registar o pior resultado, 42 pontos. Também no 'vermelho' estão Bulgária (45), Roménia (46) e Grécia (49).

Com Portugal a meio da tabela - no 16.º posto da região UE e Europa ocidental e 13.º entre os países do bloco comunitário, em igualdade com a Lituânia (ambos com 61 pontos) -, a lista é então encabeçada pela líder mundial, Dinamarca (90), seguida de Finlândia (87), Noruega (84) e Suécia e Suíça (ambos com 62 pontos).

Relativamente a outras potências mundiais, o panorama não é nada animador: os Estados Unidos alcançam os 69 pontos (24.º lugar na classificação mundial), mas a China queda-se pelos 42 pontos (76.º posto na tabela global) e a Rússia obtém somente 26 pontos, o que a deixa na 141.ª posição entre os 180 países e territórios avaliados.

Relativamente aos Estados Unidos da América (EUA), o relatório nota que "a fragilidade das regras deontológicas do Supremo Tribunal suscitou sérias questões de integridade judicial", mas considera que "o poder judicial federal e estatal dos EUA continua a funcionar, em grande medida, com independência adequada, sem interferência dos poderes executivo e legislativo".

Apontando que "os ataques à independência dos tribunais federal e estadual dos EUA falharam em grande medida", a Transparência Internacional refere que "os processos contra indivíduos com ligações políticas prosseguiram sem interferência efetiva", como o demonstram, por exemplo, os processos judiciais "contra um antigo Presidente dos EUA [Donald Trump] e contra o filho do atual Presidente [Hunter Biden, filho de Joe Biden] estão a avançar através de canais judiciais adequados e independentes".

Já quanto à China, o relatório comenta que a alegada "ação agressiva" de Pequim contra a corrupção, com a punição de "mais de 3,7 milhões de funcionários públicos por corrupção na última década" tem "feito manchetes", mas ressalva que "a forte dependência do país em relação à punição, em vez de controlos institucionais do poder, levanta dúvidas sobre a eficácia a longo prazo deste tipo de medidas anticorrupção".

Em relação à Rússia, a Transparência Internacional considera que "a campanha de longo prazo do regime de [Presidente Vladimir] Putin para dominar a Rússia e os seus recursos tornou a corrupção profundamente enraizada", para mais num contexto de erosão da independência do poder judicial no país.

"O Governo controla de forma esmagadora as instituições públicas, o que lhe permite abusar do seu poder em grande escala sem ter de prestar contas. A erosão da independência do poder judicial na Rússia aumentou a impunidade das práticas corruptas, minando gravemente a confiança do público no sistema judicial. O regime também utiliza este sistema para suprimir a oposição, solidificando assim o seu controlo do poder", destaca a organização.

Em conclusão, o relatório indica que "o resultado é que a elite governante pode seguir ambições destrutivas sem restrições, e a atual guerra da Rússia contra a Ucrânia mostra como são perigosas as consequências da falta de controlo".

Já a Ucrânia, continua a ter um resultado negativo (36 pontos), mas o relatório salienta a subida de três pontos no IPC de 2023 face a 2022 - prosseguindo uma subida que dura há 11 anos -, sublinhando que tal sucede mesmo num cenário em que o país continua em guerra, face à agressão militar russa, o que coloca "imensos desafios à governação e às infraestruturas, aumentando os riscos de corrupção".

Comentando as conclusões do IPC 2023, o presidente da Transparência Internacional, François Valérian, adverte que "a corrupção continuará a prosperar até que os sistemas judiciais possam punir os atos ilícitos e consigam manter os Governos sob controlo".

"Quando a justiça é comprada ou sofre interferências políticas, são as pessoas que sofrem. Os líderes devem investir plenamente e garantir a independência das instituições que defendem a lei e combatem a corrupção. É tempo de acabar com a impunidade da corrupção", frisa.

Leia Também: Portugal desce uma posição no Índice de Perceção da Corrupção

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