A Rússia, que no passado apelou à retirada das forças da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) da Europa de Leste, há muito que deseja reorganizar a arquitetura de segurança no continente europeu.
O Kremlin (presidência russa) considera que a ofensiva em grande escala que lançou em fevereiro de 2022 contra a Ucrânia teve como objetivo repelir a ameaça existencial que a Aliança Atlântica representa para si.
O conflito na Ucrânia deverá ser apenas um dos pontos da agenda destas conversações russo-americanas em Riade, das quais os ucranianos e os europeus estão atualmente excluídos.
Eis alguns aspetos a ter em conta sobre este encontro:
Três anos de costas voltadas
Após três anos de congelamento quase total das relações, a reunião entre Washington e Moscovo surge num momento de intensa atividade diplomática: os europeus reúnem-se hoje em Paris para discutir a sua estratégia para a defesa e segurança da Europa; o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, é esperado na terça-feira na Turquia e, na quarta-feira, na Arábia Saudita, e o enviado especial dos Estados Unidos para a Ucrânia e Rússia, Keith Kellogg, está em Bruxelas e desloca-se na terça-feira à Polónia e depois a Kyiv, dois dias mais tarde.
Por parte dos Estados Unidos, o secretário de Estado, Marco Rubio, chegou hoje à Arábia Saudita, sendo acompanhado pelo conselheiro de segurança nacional Mike Waltz e pelo enviado especial para o Médio Oriente, Steve Witkoff.
Do lado russo, Vladimir Putin enviou dois negociadores experientes: o ministro dos Negócios Estrangeiros, Serguei Lavrov, e o conselheiro diplomático do Kremlin, Yuri Ushakov.
A reunião "será principalmente dedicada ao restabelecimento das relações globais russo-norte-americanas", declarou o porta-voz da presidência russa, Dmitri Peskov, numa conferência de imprensa em Moscovo.
Segundo Peskov, a reunião "será também dedicada à preparação de possíveis negociações sobre a resolução [do conflito ucraniano] e à organização de um encontro entre os dois presidentes".
"Relações anormais"
"Putin e Trump concordaram com a necessidade de deixar para trás relações absolutamente anormais. Os presidentes decidiram que o diálogo deve ser retomado", resumiu Lavrov.
Perante o afastamento dos Estados Unidos, Zelensky repetiu hoje que a Ucrânia "não reconhecerá" qualquer acordo alcançado sem ele e lamentou o facto de o seu país não ter sido oficialmente informado das conversações em Riade.
No sábado, Zelensky também apelou aos europeus para que "atuem" para evitar um acordo forjado nas suas costas, encorajando-os a criar "forças armadas da Europa".
Na semana passada, a decisão de Trump de telefonar a Putin e declarar a abertura de negociações para pôr fim à guerra causou mal-estar na Europa e em Kyiv. O passo do líder norte-americano suscitou receios de que a questão da Ucrânia seja abandonada.
As potências europeias, de facto afastadas das conversações entre a Rússia e os Estados Unidos, depois de terem sido severamente criticadas em Munique pelo vice-presidente americano, J.D. Vance, devem agora definir uma resposta conjunta para a segurança do Velho Continente.
Por seu lado, Lavrov afirmou hoje que os líderes europeus não tinham sido convidados para as negociações porque "tencionam continuar a guerra" na Ucrânia.
Questionado no domingo, Marco Rubio disse que "nada" tinha "ainda sido finalizado" e que quando as "verdadeiras negociações" começassem, a Ucrânia deveria "estar envolvida".
O Kremlin já tinha afirmado anteriormente que Kiev participaria nas discussões sobre o seu futuro "de uma forma ou de outra".
A par da Ucrânia, o Médio Oriente também poderá estar na mesa das negociações, numa altura em que russos e norte-americanos são rivais na região e Moscovo viu os seus aliados Bashar al-Assad na Síria e o Irão sofrerem reveses nos últimos meses.
Oleoduto atacado na Rússia
Vladimir Putin exige que a Ucrânia ceda quatro regiões a leste e a sul do seu território, além da península da Crimeia, anexada em 2014, e que renuncie à sua adesão à NATO, condições que são inaceitáveis para Kiev, que ainda tem esperança de recuperar as zonas perdidas.
No entanto, os responsáveis norte-americanos já declararam que as concessões territoriais à Rússia são inevitáveis e que a entrada da Ucrânia na Aliança Atlântica é irrealista.
Na frente russo-norte-americana, resta saber se Moscovo manterá as exigências feitas no final de 2021: o compromisso de que nenhum país da ex-URSS aderirá à NATO e a retirada das tropas e do armamento da Aliança Atlântica dos países que aderiram depois de maio de 1997, incluindo os Estados Bálticos e a Polónia, que fazem fronteira com a Rússia, e a Roménia e a Bulgária, que fazem fronteira com o Mar Negro.
Estas exigências foram rejeitadas pela NATO e pelos Estados Unidos em janeiro de 2022, tendo a Rússia lançado o seu ataque à Ucrânia um mês depois.
Longe de Riade, os combates e os bombardeamentos continuam.
Moscovo reivindicou a responsabilidade pela tomada de Sverdlikovo, uma aldeia na região fronteiriça russa de Kursk, que as forças ucranianas afirmam controlar em 500 quilómetros quadrados, e Figolivka, uma aldeia na região ucraniana de Kharkiv.
A Ucrânia, por seu lado, utilizou 'drones' para danificar uma estação de bombagem de um oleoduto que transporta petróleo do Cazaquistão para o Mar Negro e depois para a Europa através do sul da Rússia, segundo a empresa operadora.
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