No acórdão agora proferido, a que a agência Lusa teve hoje acesso, a juíza Celine Borges absolveu o arguido, de 33 anos e à data dos factos colocado na Esquadra da PSP da Brandoa, do crime de ofensa à integridade física qualificada, por haver versões "inconciliáveis, contraditórias e incongruentes" de testemunhas.
A acusação do MP, elaborada por Hélder Cordeiro, o mesmo procurador que acusou 17 agentes da PSP da Esquadra de Alfragide (oito dos quais condenados), no caso das agressões na Cova da Moura, sustentava que o arguido agrediu o jovem com pontapés no corpo, chapadas e empurrou a cabeça da vítima contra uma parede, mas o tribunal não deu as agressões como provadas.
O Tribunal da Amadora apenas deu como provado que, na madrugada de 26 de março de 2017, o arguido deslocou-se à Rua Almada Negreiros, "na sequência da comunicação de ocorrência de desacatos e consumo de produto estupefaciente na via pública".
Chegado ao local, o agente da PSP avistou um grupo, constituído pelo alegado ofendido e mais três elementos, "que se encontravam a ouvir música em alto som". De seguida, "no exercício das suas funções, decidiu abordar os indivíduos, instando-os a virarem-se de frente para a parede aí existente, com as mãos e pernas afastadas para serem sujeitos a revista".
Após uma troca de palavras, o agente da PSP foi em direção à suposta vítima e é a partir deste momento em que o tribunal não dá a acusação do MP como provada.
A juíza Celine Borges não deu como provados os seguintes factos: que no momento em que o polícia se aproximou do jovem, que se encontrava de costas, "desferiu pontapés no corpo do ofendido, causando-lhe dores", nem que, em ato contínuo, tenha colocado a sua mão direita na cabeça do ofendido, "projetando-a com força, contra a parede".
O tribunal também não deu como provado que o arguido "colocou as mãos no pescoço" da vítima "e puxou-o com força para junto da parede da garagem existente no local", nem que o polícia tenha desferido "chapadas com mão aberta na face do ofendido, que se encontrava de frente para a parede aí existente, com as mãos e pernas afastadas, causando-lhe dores".
Em julgamento, o arguido "negou perentoriamente a prática dos factos" que constam da acusação do MP, esclarecendo, "em discurso espontâneo e fluente, os factos ocorridos naquela noite, segundo a sua vivência", tal como consta do auto de participação, elaborado pelas 05:36, a qual foi "corroborada" por três outros polícias que o acompanhavam.
O acórdão acrescenta que, "por sua vez, em discurso visivelmente nervoso e pouco fluente", a alegada vítima explicou que, num primeiro momento, houve uma troca de palavras entre si e os agentes da PSP, "em que, aliás, admite ter-lhes respondido de forma irónica, após o que foi encostado à parede para ser revistado".
O jovem relatou que, enquanto permanecia de costas, o arguido começou a chutar-lhe as pernas, para as abrir, e a dar-lhe chapadas na cabeça, e que, posteriormente, o agarrou pelo pescoço e puxou-o cerca de dois ou três metros, para lhe fazer perguntas e falarem apenas os dois.
Segundo o acórdão, o jovem deu respostas "segmentadas e frágeis" que não conseguiram dar a "segurança e certeza exigíveis", nem "formar convicção positiva acerca da realidade histórica por si reproduzida (e ainda que não sendo totalmente coincidente com a constante da peça acusatória)".
O Tribunal da Amadora frisa que, dos depoimentos de dois dos elementos que alegam ter presenciado os factos, "perpassam circunstâncias manifestamente inconciliáveis com a versão apresentada pelo ofendido", acrescentando que as dúvidas "se adensaram" com os depoimentos de dois outros jovens, "os únicos cuja presença é identificada na participação" policial e na acusação do MP.
"Resultam depoimentos inconciliáveis, pelo que não se logra atribuir credibilidade a qualquer deles, sequer ao relato apresentado pelo ofendido. Aliás, as incongruências e contradições não correspondem a meros lapsos de memória, que numa testemunha direta devem ser aceites com normalidade (...)", concluiu a juíza Celine Borges.