O tema do teletrabalho, uma realidade que a pandemia trouxe para uma grande parte dos trabalhadores portugueses, foi analisado, esta sexta-feira, por Francisco Louçã no habitual espaço de comentário na SIC Notícias. Para o economista, "o teletrabalho está a ser apresentado como um conto de fadas" e "há muita gente que está a ficar encantada com este conto, na perceção que pode ter um pouco mais de liberdade".
"Está em casa, pode fazer outras coisas, pode tratar das crianças, pode viver de outra forma", deu como exemplo. Contudo, trata-se, na sua opinião, de "um risco para os trabalhadores e até para a atividade económica".
"Na verdade", prosseguiu o comentador, "há profissões que podem ter teletrabalho", compreendendo que este possa ser usado "quando é preciso reduzir o movimento das pessoas e o contacto". "Na emergência foi uma solução aceitável, como sistema e como regra tem três problemas muito graves".
Louçã apontou "dois para os trabalhadores", sendo que o primeiro é "passarem a estar a trabalhar em casa sujeitos a uma hierarquia e a um horário de trabalho que não conseguem controlar", dando o exemplo de um diretor de uma instituição de Ensino Superior que "convocou os docentes para uma reunião num feriado". "Horário e hierarquia passam a ser diferentes na perceção de quem está a mandar e isso é um risco para a vida das pessoas", considerou ainda.
O segundo problema é, na ótica do economista, "o contrato vir a mudar". Porque vão existir empresas que vão pensar que "não precisam de ter trabalhadores" mas sim "empresários em nome individual que eu contrato, a quem não pago Segurança Social".
"Isso seria a mais radical alteração do sistema de Segurança Social para as próximas décadas porque não seria pago e as pessoas fariam o seu trabalho contratadas à jorna, como fosse", frisou.
Mas há ainda um risco para as empresas: "Qualquer que seja a forma da empresa, a estrutura de produção ou de comunicação, precisa de ter uma massa crítica, colaboração entre as pessoas, dar uma ideia, fazer uma crítica, uma sugestão".
"É preciso ter vivacidade do contacto pessoal. Se uma empresa for um arquipélago de comunicações com um chefe que tem múltiplos raios sobre as pessoas que estão em teletrabalho perde-se completamente a criatividade que é necessária", apontou.
Por fim, Louçã reiterou que o teletrabalho "deve ser uma exceção e não uma regra, porque é um enorme perigo para o futuro das relações contratuais, dos direitos sociais, das relações da vida pessoal, da proteção das pessoas - com mais incidência de risco para as mulheres -, mas deve-se por um travão logo que possível para que a vida económica volte à atividade normal e não passe para um regime de teletrabalho".
Recorde-se que, segundo o INE, um milhão de pessoas esteve em teletrabalho no segundo trimestre sobretudo devido à Covid-19, o equivalente a 23,1% da população empregada, enquanto mais de 600 mil não trabalharam nem no emprego nem em casa.