O recurso foi distribuído no Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) no passado dia 15 e a defesa de Daniel Litvak contesta as medidas de coação que vão além do Termo de Identidade e Residência (TIR) - que decorre da constituição como arguido neste processo -, ou seja, a proibição de se ausentar de Portugal (com a entrega dos seus dois passaportes), as apresentações às autoridades três vezes por semana e a proibição de contactos com o também arguido João de Almeida Garrett.
Segundo o documento a que a Lusa teve acesso, a defesa do rabino da CIP - que foi detido em 10 de março pela Polícia Judiciária (PJ) -- nega que exista o perigo de fuga, de perturbação do inquérito ou de continuação da atividade criminosa por parte do arguido e refuta ainda a existência de indícios fortes da prática dos crimes imputados: falsificação de documento, tráfico de influência, corrupção ativa, branqueamento de capitais e associação criminosa.
Para a defesa de Daniel Litvak, a cargo do advogado Paulo Saragoça da Matta, a detenção fora de flagrante delito do rabino "foi ilegal", uma vez que foi ordenada pelo Ministério Público (MP) e tal só pode ocorrer quando se cumpram os requisitos de prisão preventiva.
A aplicação da medida de coação mais gravosa depende de indícios fortes e do cumprimento de outro pressuposto, neste caso, o de um crime doloso com pena de prisão superior a três anos, no qual se enquadraria a falsificação de documentos -- o único crime ao qual o Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) reconheceu fortes indícios. Contudo, a falsificação de documentos tem apenas uma moldura penal igual a três anos de prisão.
"O MP não tinha competência para ordenar a detenção do arguido, porque não é, no caso, admissível a prisão preventiva", sustenta o recurso, que critica ainda os procuradores e a juíza de instrução por alegadamente violarem o direito constitucional de religião e de culto durante o período entre a detenção e o primeiro interrogatório judicial de Daniel Litvak, ao não permitirem as três orações diárias previstas na religião judaica.
A defesa do rabino alega ainda a invalidade do interrogatório por não ter sido disponibilizado um intérprete a Daniel Litvak, que tem nacionalidade israelita e argentina, assegurando que o arguido não domina o português. Simultaneamente, denuncia que não foi logo entregue cópia da gravação do despacho proferido e censura a decisão do TCIC de entregar ao Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) a análise do pedido de cópia do despacho.
Enfatizando uma limitação inconstitucional do direito de defesa, o rabino rebate também os elementos do processo de naturalização de Abramovich, ao vincar que só um documento foi elaborado pela CIP. "Apenas um dos documentos poderia, eventualmente, ser relacionado com a atividade desempenhada pelo arguido. (...) Sucede que nem esse documento foi escrito nem assinado pelo arguido", lê-se no recurso sobre o referido parecer, que foi assinado pela vice-presidente da CIP, Isabel Ferreira Lopes.
"Deve o despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que, considerando os elementos de prova e os fundamentos elencados pelo MP na promoção, limite as medidas de coação do arguido ao TIR", refere a defesa, invocando ainda a revogação por ausência de perigo de fuga, a falta de fundamento para perturbação do inquérito e a "incongruência" de se invocar em simultâneo o perigo de fuga e o perigo de continuação da atividade criminosa.
Na resposta ao recurso, o MP refutou as acusações de supostas ilegalidades após a detenção de Daniel Litvak e assegurou que a prática dos crimes imputados ao arguido está fortemente indiciada, reiterando também a existência de perigo de fuga, de continuação da atividade criminosa e de perturbação do inquérito, concluindo que as medidas de coação aplicadas são necessárias, adequadas e proporcionais e que o recurso deve ser indeferido pelo TRL.
A Procuradoria-Geral da República confirmou em 19 de janeiro que a concessão da nacionalidade portuguesa ao empresário russo Roman Abramovich ao abrigo da Lei da Nacionalidade para os judeus sefarditas (judeus originários da Península Ibérica que foram expulsos de Portugal no século XVI) estava a ser alvo de uma investigação do MP.
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