Meco. João Gouveia e Lusófona ilibados de pagar 1,3 milhões a famílias
Supremo Tribunal de Justiça dá conta de que a existência de praxe é um "fator de risco para a segurança e liberdade dos estudantes", mas reconhece que está fora da "jurisdição" das instituições de ensino superior. Em casos como a tragédia do Meco, as universidades "não têm a possibilidade de adotar medidas de intervenção direta e de aí exercer ações de vigilância e controlo".
© Reuters
País Meco
O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) confirmou, na quinta-feira, as decisões de tribunais anteriores que ilibavam a Universidade Lusófona e João Gouveia de pagarem uma indemnização de 1,3 milhões de euros às famílias das vítimas mortais da tragédia no Meco, no âmbito da qual seis estudantes morreram afogados na Praia do Moinho de Baixo.
A informação foi avançada pelo jornal Público esta sexta-feira, e confirmada pelo Notícias ao Minuto junto do STJ, que em comunicado dá conta de que "o pouco" que foi apurado na noite da tragédia, a 14 e 15 de dezembro de 2013, não permite responsabilizar a instituição nem o único sobrevivente, o 'dux' João Gouveia, pelas mortes.
“O acórdão teve presente que os jovens reunidos naquele fim de semana numa casa arrendada em Aiana de Cima pertenciam todos ao órgão de cúpula da Comissão Oficial da Praxe Académica, liderando essa organização praxista, enquanto representantes de cada um dos cursos da Universidade Lusófona”, refere o Supremo Tribunal de Justiça, numa nota citada pelo diário.
Segundo a nota, a decisão foi tomada por maioria, e não por unanimidade.
"Fundamentando a sua decisão, considerou que, da deslocação àquela praia e do que foi possível apurar do que nela ocorreu, apenas resulta que aquele grupo de jovens, numa ação conjunta de grupo, decidiram ir à praia na noite de 14 para 15 de dezembro e sentaram-se numa zona que, embora de areia seca, era suscetível de vir a ser atingida pelas ondas, como se veio a verificar", lê-se na nota.
De acordo com a decisão do Supremo, não ficou provado que o 'dux' João Gouveia tenha desempenhado um papel "influente ou promotor" do ato de exposição ao perigo que levou à morte dos jovens, sendo o seu comportamento "igual" aos dos demais, que acabaram por morrer afogados.
“Também não se provou que a relação existente entre o 'dux' e os restantes jovens fosse uma relação de domínio”, acrescenta.
Supremo considera praxes "fator de risco"
Na nota partilhada com o Notícias ao Minuto, o Supremo fez ainda algumas considerações sobre as praxes, que se tornaram um tema mais 'polémico' desde então, dado o contexto em que a tragédia aconteceu. O STJ sublinha que a existência de praxes pode "constituir uma forma de integração dos novos estudantes na vida académica e de desenvolvimento de sentimentos de camaradagem e solidariedade no seio da universidade", mas, ainda assim, deixa um alerta.
"[A existência de praxe] é um fator de risco para a segurança e liberdade dos estudantes, sendo uma fonte de violações de direitos dos estudantes, aliadas a essas práticas, tais como a violência, a coação física e psicológica, o bullying, o hazing, a criação de situações de perigo ou de discriminação, recaindo sobre as instituições universitárias o dever de adotar medidas e precauções que evitem a violação dos direitos dos estudantes em resultado de atividades praxistas", lê-se na nota.
O Supremo deixa, no entanto, claro, que em relação às ações de praxe que ocorram fora da "jurisdição" das instituições de ensino superior, como neste caso, é reconhecido que as "universidades não têm a possibilidade de adotar medidas de intervenção direta e de aí exercer ações de vigilância e controlo, apenas podendo desenvolver ações preventivas de promoção de uma cultura de respeito, segurança e responsabilidade entre os estudantes, de modo a mitigar os riscos associados às praxes e a fomentar um ambiente universitário que evite más práticas, não existindo, pelo menos à época, um dever jurídico de formalmente regulamentar as atividades de praxe pelas universidades".
O pedido de indemnização
As famílias dos seis jovens reclamavam uma indemnização de 1,3 milhões de euros em ações cíveis contra a Universidade Lusófona e o ex-'dux', mas o acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de julho do ano passado, não deu provimento ao recurso da decisão do Tribunal de Setúbal, que, em outubro de 2021, tinha absolvido João Miguel Gouveia e a academia de eventuais responsabilidades cíveis pela tragédia.
Para trás já tinha ficado o processo-crime relacionado com a morte dos seis jovens, que, depois da instrução, foi arquivado em março de 2015 pelo Tribunal de Setúbal, uma decisão confirmada em janeiro de 2016 pelo Tribunal da Relação de Évora.
Segundo o ex-'dux' da Universidade Lusófona, único sobrevivente da tragédia, os estudantes estariam na praia do Meco quando foram arrastados para o mar por uma onda, mas os familiares das vítimas continuam a acreditar que os seis universitários morreram durante uma praxe académica.
As quatro raparigas e os dois rapazes que morreram na praia do Meco faziam parte de um grupo de sete alunos que, no âmbito das atividades da comissão de praxes da Universidade Lusófona, estava a passar o fim de semana numa casa alugada na localidade de Aiana de Cima, também no concelho de Sesimbra.
[Notícia atualizada às 12h51]
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