Num comunicado conjunto, a Plataforma Recalibrar a Balança, que envolve a Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade (SPEO), a ADEXO - Associação Portuguesa de Pessoas que Vivem com Obesidade, a Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo (SPEDM), a Sociedade Portuguesa de Diabetologia (SPD) e a Sociedade Portuguesa de Cardiologia (SPC), lembra que tratar a obesidade é "prevenir o desenvolvimento de muitas outras doenças crónicas" e "salvar vidas".
Em declarações à Lusa, no Dia Mundial da Obesidade, que hoje se assinala, José Silva Nunes, presidente da SPEO, lembrou que há 20 anos Portugal foi pioneiro no reconhecimento da obesidade como doença, mas "apenas no papel".
"Há um tratamento discriminatório da obesidade relativamente às outras doenças crónicas, nomeadamente, àquelas não transmissíveis, em que o estilo de vida também pode ter o seu contributo", considerou o responsável, lembrando: "Ninguém questiona se se deve ou não tratar uma pessoa com hipertensão. Não se questiona se se deve ou não tratar uma pessoa com deslipidemia - com alteração dos níveis de gordura no sangue -- ou com diabetes, mas questiona-se se se deve tratar uma pessoa com obesidade" lamentou.
José Silva Nunes deu conta que 20 anos depois "grande parte da sociedade" continua a não reconhecer a obesidade como uma doença" e lamentou que o problema parta do sistema de saúde.
"Muitos profissionais também não reconhecem a obesidade como uma doença", precisou.
O responsável lembrou que a obesidade é fator de risco para muitas outras doenças e disse que, para a diabetes, "é a ligação mais forte", contribuindo para cerca de 80% dos casos.
"Portanto, se nós conseguíssemos erradicar a obesidade, teríamos menos 80% dos casos de diabetes, que é também uma outra pandemia", afirmou.
Recordando que foram "muitos anos" de uma narrativa que consistia em ver a obesidade como um problema de falta de motivação e de força de vontade em que as pessoas tinham obesidade porque tinham um estilo de vida erróneo, sublinhou que hoje se sabe que "há um fundo genético" que condiciona um aumento do risco para desenvolver obesidade que pode chegar aos 70%.
"A pessoa que tem o azar de ter uma 'má genética', no fundo, vai passar a vida toda a lutar contra a sua natureza", acrescentou.
No documento conjunto, a plataforma Recalibrar a Balança apela a uma mudança no sistema de saúde, que comece pela publicação do Processo Assistencial Integrado (PAI) para a Prevenção e Tratamento da Obesidade, que define o percurso da pessoa com esta doença no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
"Sem uma definição de como é que deve ser o seguimento da pessoa com a obesidade, no fundo, cada um faz como acha que deve fazer ou não faz absolutamente nada", afirma.
As organizações pedem igualmente que se criem ferramentas no SNS para incentivar uma adequada gestão das pessoas com obesidade e que seja acautelado o acesso.
"Um acesso atempado, mas também equitativo", referiu Silva Nunes, frisando que "hoje há uma iniquidade social e quem tem dinheiro consegue comprar os fármacos, mas quem não tem não consegue".
O responsável disse que a farmacoterapia é atualmente reconhecida como um "pilar fundamental" do tratamento da obesidade -- a par das mudanças no estilo de vida (exercício e alimentação) e, nos casos elegíveis, da cirurgia.
Para José Silva Nunes, a narrativa de que apenas com dieta e exercício se consegue tratar a pessoa é, hoje em dia, "pura ficção".
"Consegue-se, eventualmente, que durante um curto período de tempo a pessoa consiga reduzir o seu peso, mas depois a natureza fala por si e há um reganho total desse peso perdido", explicou.
O quarto e último fator apontado pela plataforma é a concretização do programa prioritário para o combate e controle da obesidade, que estava previsto no Plano de Emergência e Transformação de Saúde e que "ainda não saiu do papel".
Atualmente, a prevalência da obesidade em Portugal é uma das mais altas da Europa, com quase 29% dos portugueses entre os 25 e os 74 anos a viver com a doença.
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