Na segunda edição do estudo 'Pobreza e Exclusão social em Portugal: uma visão da Cáritas', que é apresentado hoje, a Cáritas faz um retrato da realidade nacional tendo em conta os que vivem em situação de pobreza ou em privação severa, tendo por base os indicadores do Instituto Nacional de Estatística (INE), cujos dados mais recentes foram publicados em dezembro, e do Eurostat.
A Cáritas aponta que "o acesso a uma habitação condigna é um direito constitucional, no entanto persistem em Portugal situações de privação habitacional muito severa".
"Na sua expressão mais absoluta, é imediato constatar o aumento dramático do número de pessoas em situação de sem-abrigo", refere a instituição, com base no levantamento feito através do Inquérito de Caracterização das Pessoas em Situação de Sem-Abrigo, realizado em 2023.
Nesse ano foram registadas 13.100 pessoas a viver nessa condição, depois de terem sido 10.800 em 2022, 9.600 em 2021, 8.200 no ano antes, 7.100 em 2019 e 6.000 em 2018.
"Este aumento terá persistido ao longo do último ano. Estas situações-limite exigem intervenções multidisciplinares, que vão além da falta de habitação", defende a Cáritas.
De acordo com o organismo instituído pela Conferência Episcopal Portuguesa e que é uma organização oficial da Igreja Católica em Portugal, as dificuldades em encontrar ou manter uma habitação afetam "múltiplos segmentos da população" e são explicadas "com o aumento acentuado das rendas e dos preços da habitação".
"O acesso a uma habitação adequada tem-se revelado cada vez mais desafiante. Esta é uma das razões que sustenta a permanência muito maior dos jovens em casa dos pais em Portugal, em comparação com os restantes países europeus", aponta.
Revela, por outro lado, que na rede Cáritas, constituída por 20 Cáritas Diocesanas, "nos últimos anos, têm sido inúmeros os pedidos de ajuda para pagamento de rendas".
"Este é um sinal claro de dificuldade de muitas famílias em assegurar essas prestações", aponta.
Destaca que, em 2023, quase 5% da população vivia em sobrecarga das despesas de habitação, ao mesmo tempo que foi registado "um forte aumento, para 12,9%" da taxa de sobrelotação de habitação.
A taxa de privação severa das condições de habitação aumentou para 6%, depois de ter estado nos 4,1% em 2019, incluindo situações de falta de casa de banho ou sanita com autoclismo, teto que deixa passar água ou humidade nas paredes, entre outros.
A Cáritas alerta que são as crianças e as famílias com rendimentos mais baixos que "registam maior privação severa das condições de habitação" e lembra como, no caso das crianças, isso impede que haja igualdade de oportunidades e influencia "toda a sua vida futura".
O estudo indica que Portugal está "numa posição intermédia em termos da prevalência da pobreza e da privação", mas alerta que isso não deve ser visto com complacência, mas antes ser encarado como um desígnio nacional para alcançar os "resultados já observados em vários países europeus, que se situam mais próximos do horizonte de erradicação da pobreza e da exclusão".
Defende, por outro lado, que "há questões estruturais e de aposta em políticas pré-distributivas e redistributivas que justificam o facto de Portugal ainda se situar longe" da erradicação da pobreza, salientando como, nos últimos anos, os progressos têm sido mais modestos.
"Entre 2015 e 2019, o aumento do emprego foi a base para a queda acentuada das situações de pobreza e privação em Portugal", enquanto "no período mais recente, num quadro de quase pleno emprego no mercado de trabalho, os progressos na luta contra a pobreza têm-se revelado mais ténues".
Segundo a Cáritas, tem havido dimensões onde se tem constatado "um retrocesso", como no caso do número de pessoas sem capacidade para ter uma alimentação adequada ou no número de pessoas sem-abrigo.
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