Muitos pais resistem a que filhos recebam cuidados paliativos
Muitos pais resistem a que sejam prestados cuidados paliativos pediátricos aos filhos por considerarem que estão a desistir de lutar pela vida, mas especialistas asseguram que estes tratamentos nem sempre significam cuidados de fim de vida.
© Reuters
País Pediatria
"O que sentimos é que nem sempre é fácil para um pai ou para uma mãe encarar a possibilidade do seu filho entrar numa fase de cuidados paliativos", contou à agência Lusa a diretora da Acreditar - Associação de Pais e Amigos de Crianças com Cancro.
Para muitos pais, esta decisão significa que desistiram de "lutar pelo seu filho ou pela sua filha", o que "é tremendo", disse Margarida Cruz, que falava à agência Lusa a propósito do Dia Internacional da Criança com Cancro, que se assinala no domingo.
Para Margarida Cruz, é urgente que pais, profissionais de saúde, hospitais e o Estado debatam esta questão para que seja dado "um enquadramento melhor às crianças e jovens que precisam deste tipo de apoio".
Para o coordenador nacional do Programa das Doenças Oncológicas, Nuno Miranda, esta questão emocional dos pais é "um problema muito complicado".
"É muito difícil para os pais aceitar de alguma maneira uma desistência de medidas curativas para assumir outras prioridades", como as medidas paliativas ou de conforto, disse Nuno Miranda.
Para a pediatra Ana Lacerda, responsável pela unidade de cuidados paliativos pediátricos do IPO de Lisboa, é preciso desmistificar a ideia de que os cuidados paliativos pediátricos são para crianças em fim de vida, porque não são.
É "preciso despertar a sociedade" e até os profissionais de saúde para esta questão, explicando-lhes que estes cuidados devem ser prestados às crianças e às famílias "desde o diagnóstico de uma situação limitante ou ameaçadora da vida", quando "ainda há muito para fazer".
"Não podemos já curar, mas podemos cuidar e podemos cuidar muito melhor se realmente aceitarmos essas necessidades da criança e da família", disse Ana Lacerda.
Os cuidados paliativos pediátricos ainda são escassos em Portugal, localizando-se nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, mas Ana Lacerda acredita que "2015 venha a ser um ano de viragem", para estabelecer serviços e acabar com as desigualdades.
"O balanço do último ano é muito positivo, porque felizmente os decisores políticos acordaram para esta situação que é de grande impacto sobre as famílias", frisou.
Para a diretora da Acreditar, "estas respostas têm que ser criadas de forma adequada".
"É sabido que em Portugal não há praticamente respostas a este nível, como existem noutros países europeus, e obviamente que estas respostas têm que ser criadas de forma adequada", sustentou Margarida Cruz.
Com base em estudos de prevalência realizados noutros países, estima-se que existam em Portugal cerca de 6.000 menores com necessidades paliativas.
"Não podemos esquecer que não curamos todos e não podemos iludir esse facto, embora em oncologia pediátrica cada vez tenhamos maiores taxas de sucesso e de cura e sobrevivências mais longas", disse Nuno Miranda.
Mas esses doentes para os quais não há cura "merecem a mesma dignidade e o mesmo rigor de tratamento quer sejam crianças, quer sejam adultos".
"Há uma mensagem muito importante nisto é que a própria sociedade está a mudar a sua posição", disse Nuno Miranda, explicando que o trabalho das organizações como a 'Make-a-wish'", que cumpre desejos destas crianças, "são estímulos" para os profissionais trabalharem melhor e partilharem com os pais e com a sociedade esta realidade para a qual é preciso "arranjar soluções", frisou Nuno Miranda.
Segundo dados da Direção-Geral de Saúde, nos últimos cincos anos, foram contabilizados cerca de 3.000 casos de cancro pediátrico por ano, sendo os mais frequentes a leucemia, os tumores do sistema nervoso central e os linfomas.
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